Felizmente, há a Grécia!

O estado da nação não muda por causa de um debate parlamentar, nem aqui nem em parte alguma. É por sabermos isso, e também porque pouco se distinguem dos debates quinzenais com o primeiro-ministro que os debates sobre o estado da nação se afiguram tempo perdido. Mas o motivo maior do desinteresse geral e do…

Os discursos extremados só podem conduzir a uma caricatura de debate. E a imagem de Ferro Rodrigues rindo-se a bom rir enquanto Passos Coelho respondia com dez pragas socialistas aos sete pecados capitais de que o PS acusara o Governo é um bom resumo dessa caricatura.

A jornada desta semana sobre o estado da nação poderia condensar-se naquela imagem. Mas, felizmente, há a Grécia, com as misérias da sua economia, o aventureirismo da sua liderança e a coragem dos seus eleitores, pelo que foi ela a dar alguma cor ao debate. 

Ora, a Grécia é um tema fácil para o Governo, por mais que se lhe critique uma arrogância germanófila com o seu quê de ridículo, dada a avaliação severa e paternalista que faz do «conto de crianças» e das peripécias de Tsypras. Na fase em que nos encontramos, qualquer acordo com os credores será uma derrota para Atenas, por mais disfarçada que se apresente. E uma eventual saída do euro, com todos os desastres associados, servirá a Passos e Portas como argumento eleitoral precioso para valorizar, em contraponto, os resultados do seu desempenho no Governo.

Já para o PS, a crise grega tornou-se um quebra-cabeças, tendo em conta que António Costa não pode colar-se ao Syrisa, com o qual muitos socialistas se identificam, sob pena de assustar os eleitores moderados de que precisa para chegar ao poder. Mas também não pode actuar de modo a que o seu discurso sobre a Grécia se confunda com o do Governo, sob pena de gorar toda a expectativa que suscitou à esquerda e que bastante contribuiu para a sua vitória no combate pela liderança socialista. É com este incómodo colete-de-forças que está na campanha. Sabendo que o factor Grécia pesa na formação do juízo dos eleitores e que, a menos que ocorra uma reestruturação da dívida, como pede o FMI, não pesará a favor do PS.

Maria Barroso

Manuel Alegre disse que Maria Barroso foi primeira-dama antes de Mário Soares ter sido Presidente. E podia ter acrescentado, embora não precisasse, que continuou primeira-dama depois de Mário Soares ter deixado de ser Presidente. Mas todas as belas frases sobre a Grande Senhora que acaba de nos deixar estão incompletas, porque a vida cheia de Maria Barroso – ou as diversas vidas que ela comporta – não cabe nas palavras ditas no momento da sua morte, por mais sentidas e verdadeiras.

Maria Barroso foi primeira-dama, no propósito feliz com que Alegre usa a expressão, independentemente de ser mulher de quem era, algo que o país sempre percebeu com clareza. Mais do que as palavras, a extraordinária homenagem que recebeu à despedida foi o testemunho concreto da admiração e do reconhecimento generalizados pelo seu percurso exemplar. Um raro momento de comunhão na tristeza e, ao mesmo, tempo, no orgulho das gerações que a tiveram por contemporânea.

A Embaixada

Os governos em fim de mandato preocupam-se com o futuro dos seus colaboradores e compensam-nos pelos serviços prestados, distribuindo-os por lugares selectos e a contento. Sempre assim foi. Há situações em que a passagem pelos gabinetes ministeriais interrompe e pode prejudicar a progressão na carreira deste ou daquele assessor ou chefe de gabinete. Mas não é o caso dos diplomatas, que são frequentemente promovidos enquanto desempenham essas funções, sendo, por isso, natural que saiam para posições mais importantes do que as que ocupavam anteriormente.

Do que não há memória é de um caso como o que agora veio a público: a Embaixada junto da Unesco, encerrada pelo Governo de Passos Coelho, a pretexto da contenção na despesa, vai ser reaberta pelo Governo de Passos Coelho para dar guarida ao diplomata que exerce as funções de chefe de gabinete do primeiro-ministro Passos Coelho. Há limites, é costume dizer-se. Haverá?