Depois de invadido em 2003 por uma coligação internacional liderada pelos Estados Unidos que depôs o ditador, hoje é o Iraque que se transformou num campo de batalha de violência sectária e ataques dos extremistas islâmicos.
Os efeitos da invasão do Kuwait, momento descrito como o pior erro do então ditador iraquiano, perduraram ao longo dos anos seguintes e marcaram os dois países.
"Foi uma das piores decisões que Saddam tomou", afirmou o ministro dos Negócios Estrangeiros do Iraque, Hoshyar Zebari, em declarações à agência francesa AFP em agosto de 2010, por ocasião do 20.º aniversário da invasão.
Sanções internacionais, perdas humanas e muitos milhões de dólares canalizados para um fundo de reparações estabelecido pela ONU em 1994 foram alguns dos aspetos da pesada herança iraquiana deste conflito, mediatizado mundialmente como a Primeira Guerra do Golfo.
"Realmente, o Iraque tem sofrido por causa dessa decisão desde então. Durante os últimos sete anos, tenho lutado para recolocar o meu país no lugar onde estava antes de 02 de agosto", disse Hoshyar Zebari, na mesma ocasião.
Em agosto de 1990, o Iraque detinha o quarto maior exército do mundo e mobilizou uma força invasora esmagadora. Em um dia, mais de 100 mil soldados iraquianos apoiados por tanques, helicópteros e camiões atravessaram a fronteira e tomaram a Cidade do Kuwait.
Bagdad justificou a invasão do emirado do Golfo Pérsico, alegando roubo de petróleo num campo petrolífero fronteiriço e razões territoriais históricas.
As forças iraquianas estabeleceram um governo provisório e Saddam Hussein ameaçou transformar o Kuwait num “cemitério” caso qualquer outro país desafiasse, pela força, a conquista de Bagdad.
A invasão e a anexação do Kuwait provocaram forte condenação internacional.
Numa sessão de emergência, o Conselho de Segurança das Nações Unidas pede a retirada “imediata e incondicional” das forças iraquianas e impõe sanções contra o Iraque.
A ainda primeira-ministra britânica, a “Dama de ferro” Margaret Thatcher, afirma que a invasão é “absolutamente inaceitável”, enquanto o Presidente norte-americano, o republicano George H. W. Bush, qualifica o ataque como “um ato de agressão sem defesa”.
Em novembro de 1990, e após esforços diplomáticos, as Nações Unidas abrem o caminho para o confronto, autorizando o recurso à força para retirar as forças iraquianas do emirado.
Na mesma altura, é dado um ultimato a Saddam Hussein: tem de sair do Kuwait até 15 de janeiro de 1991.
Durante os três meses seguintes, forças aliadas são destacadas para a região no âmbito da Operação Escudo do Deserto (Desert Shield). A União Soviética, principal fornecedor de armas do Iraque, declara que não vai participar na ação militar, mas suspende a entrega de todos os equipamentos militares.
Dias antes de terminar o ultimato, a 12 de janeiro, o Congresso norte-americano autoriza o uso da força militar contra o Iraque. Na noite de 16 de janeiro, é lançada a Operação Tempestade no Deserto.
Nas horas seguintes, as forças de uma coligação de 34 países (lideradas pelos EUA e Reino Unido) enviam centenas de aviões para bombardear posições no Iraque, naquele que seria o ataque aéreo mais longo na história da guerra aérea.
As bombas atingem alvos militares e estratégicos, incluindo refinarias petrolíferas e o aeroporto de Bagdad.
Na capital iraquiana, Saddam Hussein mantém uma posição desafiadora e afirma que “a mãe de todas as batalhas tinha começado”. Em reação às manobras internacionais, Bagdad lança mísseis Scud contra Israel e a Arábia Saudita.
Após mais de um mês de intensos ataques aéreos, os aliados lançam a ofensiva terrestre a 24 de fevereiro.
Os combates prosseguem até aos últimos dias de fevereiro, altura em que o Iraque, já com uma capacidade militar fortemente enfraquecida, concorda com um cessar-fogo.
Só em 1994, o Iraque reconhece oficialmente a independência do Kuwait e as novas fronteiras estabelecidas pela ONU.
Apesar da era Saddam Hussein ter passado à História – o ditador seria capturado por soldados norte-americanos em dezembro de 2003 e condenado e executado pela justiça iraquiana em dezembro de 2006 -, o impacto da invasão que durou seis meses permaneceu ao longo dos anos na cabeça dos kuwaitianos, bem como teve repercussões económicas para o emirado petrolífero
“O Kuwait ficou, naturalmente, traumatizado com a invasão de 1990”, afirmou Joost Hiltermann, do International Crisis Group, organização internacional que monitoriza conflitos armados em todo o mundo, em declarações ao canal norte-americano CNN em janeiro de 2011.
“Ainda tem de superar o medo de que o Iraque quererá mostrar que o Kuwait é a província 19.ª, em vez de um estado vizinho independente”, disse então o analista.
Antes da retirada, as forças iraquianas incendiaram mais de 700 poços petrolíferos no emirado, provocando uma catástrofe ambiental e económica. O fogo demorou oito meses a ser extinto. Mais de mil milhões de barris foram destruídos.
Atualmente, os dois países enfrentam uma ameaça comum: o extremismo islâmico.
Em junho passado, um atentado reivindicado pelo grupo autoproclamado Estado Islâmico (EI) contra uma mesquita xiita na capital do Kuwait, no final da oração do meio-dia de sexta-feira (dia sagrado para os muçulmanos), fez 27 vítimas mortais e feriu mais de 200 pessoas.
Esta semana, o Ministério do Interior do Kuwait anunciou o desmantelamento de uma célula do grupo ‘jihadista’.
O Iraque, que se tornou num campo de batalha entre as várias forças sectárias do país após o derrube do regime de Saddam Hussein liderado pelos EUA em 2003, é atualmente um dos principais palcos da ofensiva ‘jihadista’.
Desde junho de 2014, o Iraque enfrenta uma guerra contra o EI, que tem conquistado amplas zonas do território e proclamou um califado no país e na vizinha Síria.
Lusa / SOL