Em Brasil: Uma Biografia, da antropóloga Lilia M. Schwarcz e da historiadora Heloisa M. Starling, também não se quis «contar uma história do Brasil, mas fazer do Brasil uma história». O objectivo declarado é o de cobrir cinco séculos de existência do país (de 1500 a 1995, ano da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso), evidenciando os avanços e recuos na construção da cidadania nacional. Compor uma história da mestiçagem, enquanto representação colectiva conflituosa ou fonte de fértil diversidade cultural. Explorar e expor «respostas múltiplas e por vezes ambivalentes». Aceitar que o racismo, a desigualdade e a violência são verdadeiros nós nacionais.
A rejeição do protagonismo habitual de certos acontecimentos na ordenação de cronologia, temas e interpretação abriu espaço para o registo de «um tempo híbrido capaz de agenciar diferentes formas de memória». A abordagem de Schwarcz e Starling convida-nos a olhar para o país como quem espreita pela janela de uma casa, descortinando os espaços públicos, comuns e privados, as dinâmicas profundas ou superficiais entre os vários habitantes, quer sejam grandes tipos ou «personagens miúdos, quase anónimos». Expurgado de gorduras academistas, o texto torna-se intimista e mais narrativo, por vezes até teatral. A leitura é útil e prazerosa, revela um Brasil diferente, dramático e irónico. Como na epígrafe final, de Oswald de Andrade: «Quando o português chegou/ Debaixo duma bruta chuva/ Vestiu o índio/ Que pena!/ Fosse uma manhã de sol/ O índio tinha despido/ O português».
Brasil: Uma Biografia
Lilia M. Schwarcz e Heloisa M. Starling
Temas e Debates
656 páginas, 22.20 euros