Mas, além de administrador, o rosto da família Espírito Santo no Brasil foi também director do BES durante anos. Após o colapso da instituição, o seu contrato de trabalho foi transferido para o Novo Banco, até que, no mês passado, a gestão de Stock da Cunha cortou por completo o vínculo laboral com Abecassis, demitindo-o do cargo de director, apurou o SOL.
Abecassis contesta o despedimento e, por isso, decidiu avançar com um processo em tribunal contra o Novo Banco. Segundo a informação disponibilizada no portal Citius, no dia 17 de Agosto deu entrada na Primeira Secretaria do Trabalho na Instância Central de Lisboa uma “acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento” de Ricardo Abecassis Espírito Santo Silva contra o Novo Banco.
O SOL sabe que o antigo membro do Conselho Superior do Grupo Espírito Santo e ex-administrador da holding Espírito Santo International (ESI) quer, numa primeira fase, impugnar o despedimento. Posteriormente, o objectivo é ser ressarcido financeiramente pelo Novo Banco, por valores em atraso. Apesar de não ter chegado a exercer qualquer actividade enquanto director no Novo Banco, Ricardo Abecassis reclama os vencimentos correspondentes ao período de quase um ano – Agosto de 2014 a Julho de 2015. O membro da família Espírito Santo não recebeu qualquer indemnização do Novo Banco.
Ricardo Abecassis considera que “a acção de impugnação é um assunto pessoal” e, por isso, não quer fazer qualquer comentário ao SOL. O primo em segundo grau de Salgado e Ricciardi é um dos antigos gestores do BES acusados de gestão ruinosa e prestação de informações falsas no processo de contra-ordenação do Banco de Portugal.
O Novo Banco não respondeu às questões do SOL até ao fecho da edição.
A viver no Brasil desde 1997, Ricardo Abecassis tem passado despercebido no último ano – foi até dispensado da comissão parlamentar de inquérito ao caso BES.
Carta rogatória para o Brasil
Mas, do outro lado do Atlântico, o antigo banqueiro está a dar algum trabalho às autoridades judiciais. Isto porque a Justiça portuguesa pediu recentemente a cooperação do Brasil para intimar Abecassis.
De acordo com as informações apuradas pelo SOL, a Corte Especial – órgão máximo do Superior Tribunal de Justiça brasileiro – recebeu no final de Maio uma carta rogatória das autoridades portuguesas para que Abecassis seja notificado de um processo movido por um conjunto de investidores lesados no aumento de capital do BES.
“A carta rogatória foi extraída de um processo cível. Trata-se de um pedido de citação de Ricardo Abecassis Espírito Santo Silva para uma acção de condenação com processo comum declarativo que pretende, em síntese, o ressarcimento pela venda de acções do BES feita com fundamento em informações enganosas” – confirmou ao SOL fonte oficial do Ministério Público Federal do Brasil.
A acção judicial em causa foi movida em Janeiro de 2015, em Portugal, por um conjunto de investidores. Os alvos são o BES, o BESI, ex-membros do conselho de administração e da comissão de auditoria do BES e os auditores externos do banco. Os autores do processo, representados pela sociedade de advogados Rui Pena, Arnaut & Associados, participaram no aumento de capital do BES em Maio de 2014, motivados pela “informação errónea e equívoca quanto à situação económico-financeira do BES” disponibilizada no prospecto da operação.
No total, reclamam cerca de 106 milhões de euros, referentes a alegados prejuízos sofridos com a compra de acções do BES.
Cerca de nove meses após ter dado entrada no tribunal, este processo aguarda a conclusão da citação dos réus. Ricardo Abecassis é um dos visados que ainda está a ser intimado a apresentar a defesa nesta acção. Isto porque todas as tentativas de contacto das autoridades brasileiras falharam até ao momento.
O Supremo Tribunal de Justiça tentou contactar o primo de Salgado por via postal em Junho, mas a correspondência foi devolvida. O ex-banqueiro tem morada fiscal em São Paulo. “Não encontrado o interessado, remetam-se os autos ao Ministério Público Federal para que, se possível, sejam fornecidos outros endereços para a sua localização”, lê-se nos documentos processuais associados à carta rogatória. Abecassis diz não ter conhecimento sobre a citação no Brasil.
Relação tensa entre ‘Ricardos’
Abecassis pertence a um dos ramos da família, liderado por José Manuel Espírito Santo, que tinha cerca de 18,5% da holding que reunia a posição accionista da família no BES. Chegou a dizer que queria ocupar o lugar do primo na presidência do banco e este, na última apresentação de resultados, em Fevereiro de 2014, respondeu-lhe com ironia: “O Dr. Ricardo Abecassis é um excelente banqueiro, mas no Brasil estamos em período de férias, entre o Natal e o Carnaval, e ele anda um bocadinho distraído (…) Aproveito para lhe enviar um beijinho”. Tornaram-se depois públicas as hostilidades entre os dois ‘Ricardos’. As gravações das reuniões do Conselho Superior mostraram que o primo do Brasil queixou-se do desgaste sofrido pelo grupo com os casos em que Salgado surgiu envolvido, como a prenda de 14 milhões de euros do construtor José Guilherme.