O BE já cumpriu a sua agenda de costumes, que era uma espécie de marca distintiva. E agora?
O Bloco provou que é capaz de mudar a sociedade, puxando outras forças, pondo temas na agenda, orgulhamo-nos muito disso. Mas há muitas coisas por conseguir nas agendas da igualdade. E é mentira que estas agendas sejam menos importantes em momentos de crise económica, porque quem sofre descriminação sofre a crise duas vezes, porque já parte numa situação de desigualdade. A luta contra a precariedade é central na reconstrução do país.
Já se sentiu descriminada?
Claro que sim. Não há uma mulher em Portugal que possa dizer que nunca se sentiu descriminada.
E já se sentiu descriminada como mulher no Bloco de Esquerda?
Claro que sim. Nenhum espaço é imune às desigualdades da sociedade, embora sejamos muito exigentes connosco. Eu orgulho-me do que conseguimos a mais, mas não vale a pena fazer de conta que se vive em bolhas.
Nas questões da igualdade dos sexos, o BE já foi atacado por querer criminalizar o piropo. Como ficou essa questão?
Nós ganhámos. Neste momento, uma ofensa verbal explícita de cariz sexual no espaço público tem a mesma moldura penal que o exibicionismo, como deve ter. Na última legislatura, aliás, o BE conseguiu ver algumas das suas ‘bandeiras’ aprovadas – como a violência no namoro ter a mesma gravidade que a violência doméstica e passar a crime público, ou a violação ser crime semipúblico.
Com o apoio da maioria de direita.
É verdade. No BE, o que nos interessa é a melhoria da vida das pessoas. Se vou, com isto, defender a atual maioria? Não! Na legislação do trabalho, piorou a vida das mulheres, que ficaram muito mais precárias e com menos trabalho.
O BE pede mais integração para as minorias sexuais, étnicas, etc. Mas a bancada parlamentar do Bloco não reflete essa diversidade.
Temos de fazer melhor.
Olhando para a lista de deputados em lugares elegíveis, não vai fazer melhor. Há uma candidata transexual, mas está num lugar não elegível.
Para ser sincera, acho que se deve fazer melhor. Há ativistas dentro e fora do Bloco de diversas minorias que dariam ótimos deputados. Mas este é um trabalho que se faz com tempo e não concordo que as minorias não estejam representadas nas listas.
A lista de notáveis que saíram do BE para formar outros partidos é extensa. Que efeito tem no partido?
Não há nenhum drama com isso. Em todos os partidos entram e saem pessoas, é a vida.
Sente-se confortável com a quase bicefalia mediática que há entre si e Mariana Mortágua?
Espero que haja até muito mais. Quanto mais protagonistas tiver o BE melhor. A Mariana Mortágua fez um trabalho extraordinário e é reconhecida por isso e no BE apreciamos esse reconhecimento. Depois, acho que há uma certa visão machista da política que faz com que as pessoas achem normal quando há vários homens, mas comecem a estranhar quando veem várias mulheres. Ninguém perguntava isso ao Francisco Louçã ou ao Miguel Portas, ao Luís Fazenda ou ao Fernando Rosas.
A Marina Mortágua é uma possível futura líder do BE?
Há muita gente no BE que pode assumir a liderança, felizmente temos muitos bons quadros.