Estreia-se como candidata e logo como cabeça de lista num dos distritos decisivos. Tem tido muitas noites em branco?
Noites em branco não, porque felizmente durmo bem. Mas sinto a responsabilidade para fazer o melhor possível para passar a mensagem do BE e traduzir o nosso programa em propostas concretas para o distrito. Felizmente o BE tem uma componente de equipa forte e isso faz com que o peso seja distribuído. Sinto-me sobretudo entusiasmada.
O que é um bom resultado em Setúbal?
É tirar o maior número possível de deputados à direita. E traduzir a desilusão com o Governo em votos que venham para a esquerda e não caiam na abstenção. Manter o grupo parlamentar é obviamente um objetivo. No distrito, temos a ambição de voltar a ter um segundo eleito.
O desemprego é um dos maiores problemas no distrito. Como se cria emprego em Setúbal?
Tivemos historicamente um peso grande da indústria que foi desaparecendo. Temos serviços públicos bastante degradados, nomeadamente ao nível de transportes e da saúde. E ao apostar neles também se poderia criar emprego e dinamizar a economia. A indústria precisa de muito investimento que tem de ser público e orientado para poder competir, é o caso da indústria naval. E não pode competir pelos salários baixos, esbarraremos sempre na China, tem de ser pela excelência e pela tecnologia. É o caminho inverso ao que o Governo tem feito no arsenal do Alfeite. Perdeu centenas de postos de trabalhos nos últimos dez anos.
A ministra das Finanças é a cabeça de lista da coligação. Maria Luís tem razões para ter medo de fazer campanha em Setúbal?
Em democracia ninguém deve ter medo de fazer campanha. Outra coisa é se os ministros da coligação não deviam ter vergonha de sair à rua depois do que fizeram ao povo. Mas isso cada um é que sabe se está bem com a sua consciência.
Qual é a medida fundamental para garantir a sustentabilidade do sistema de Segurança Social?
Todos os estudos internacionais dizem que a segurança Social é sustentável pelo menos até 2060. Mas o aumento do desemprego e a política de salários baixos significam um problema grave no futuro. A primeira medida é garantir que há emprego e salários, logo mais contribuições e menos subsídio de desemprego. É preciso que os salários sejam dignos para as pessoas descontarem um valor razoável. E é preciso arranjar formas de financiamento alternativas e por isso propomos uma pequena taxa sobre o valor acrescentado das grandes empresas que têm maiores lucros.
Governo de esquerda: a proposta de Catarina Martins para uma conversa a 5 de Outubro com António Costa é para levar a sério?
Tudo o que Catarina Martins diz e que o BE apresenta é para ser levado a sério. O BE não passa cheques em branco. Quem vencer as eleições terá de explicar ao que vem para além do programa que já apresentou. Não acredito que a direita esteja em condições de vencer, o povo vai castigar o PSD e o CDS pelo que fizeram. O PS vai ter de apresentar no Parlamento as medidas que quer aprovar e todas as que sejam boas para a recuperação de rendimentos contarão com o nosso apoio, as que servirem para perpetuar a austeridade terão a nossa oposição. O BE nunca estará disponível para aceitar qualquer solução que tenha um centímetro de austeridade.
O Presidente da República deve privilegiar o primeiro lugar em número de votos ou o número de deputados eleitos quando convidar um partido a formar governo?
Albarda-se o burro à vontade do dono. O PR vai fazendo interpretações sobre em que condições dará posse ao governo seguinte de acordo com os interesses da sua preferência político-partidária. Há muito tempo que o Presidente tem vindo a tentar condicionar estas eleições e não é aceitável. Sempre existiram governos minoritários em Portugal, isso deve ser desmistificado. O PR está mais preocupado com a estabilidade do pagamento dos juros aos mercados financeiros e da obediência à Merkel do que com a estabilidade dos portugueses.
Acredita nas sondagens? As sondagens diárias vão ter efeito na campanha?
Há sempre para todos os gostos. Podem potencialmente influenciar e é por isso que muitas vezes nos custa acreditar nelas.
Debates: lembra-se de um momento que tenha sido muito importante ou decisivo?
Foi muito importante o momento em que Catarina Martins desmontou a proposta do PS de congelamento das pensões. Permitiu explicar que não se pode ao mesmo tempo prometer o fim da austeridade e querer agradar à Merkel, cumprir o tratado orçamental e pagar a especulação dos mercados financeiros.Também foi importante nos debates com Passos e Portas desmontar a falsa ideia de que o país está melhor.
Festejou a vitória de Alexis Tsipras? O governo do Syriza foi capaz de compromissos e deixou cair o radicalismo: é um exemplo para a esquerda portuguesa?
Festejei. É assustador a forma como a Alemanha e todos os governos da Europa liderados pela Merkel orquestraram um ataque que não foi ao Syrisa e ao Tsipras, foi ao povo grego e à democracia grega. Foi uma chantagem inaceitável sobre um partido que ganhou eleições e foi impedido de pôr em prática o seu programa.
Que opinião tem de Ana Catarina Mendes? Consegue apontar um trunfo e uma fragilidade da sua adversária?
Não conheço, não tenho uma relação pessoal. Temo-nos cruzado na política autárquica em Almada e tenho o maior respeito por ela. A principal fragilidade do PS nestas eleições é não conseguir apresentar uma alternativa real à política de austeridade.
sofia.rainho@sol.pt