O acampamento foi desmantelado no final da semana passada e as cerca de cem pessoas que lá viviam foram realojadas provisoriamente em hotéis pelas autoridades francesas. Durante um mês, eram cerca de trinta as tendas, montadas ao longo de dois passeios, que serviam de abrigo a várias famílias sírias, envoltas pelos carros que passavam, bem perto do "Boulevard Périphérique" de Paris. Havia muitas crianças, bebés e mães ainda a amamentar, adolescentes a quererem ser fotografados e a balbuciar algumas palavras em francês ou a dizer "Welcome to Syria" aos jornalistas.
Njma Alrajaeb, sentada em cima de um cobertor estendido do lado de fora da tenda, fixava os grandes olhos verdes nas pessoas que visitavam o acampamento. A jovem de 18 anos apenas fala árabe mas não hesitou em contar a sua história à Lusa, graças à ajuda de Yahya Khedar, o dentista que fala um francês fluente.
"Cheguei há um mês. A única coisa que quero é um teto e que as minhas filhas possam ir à escola em França", explicou, apontando para uma menina de dois anos e para a bebé de seis meses que nasceu em Melilla, o enclave espanhol em Marrocos por onde passou a caminho de Paris.
Njma Alrajaeb chegou há um mês à capital francesa com o marido e as filhas, depois de uma longa viagem que começou em Homs em 2012, tendo passado pelo Egito, Marrocos e Espanha, antes de chegar a França, "o país que toda a gente diz que é o melhor para os refugiados".
Sentada ao pé de Njma estava outra jovem de 19 anos a amamentar o bebé de quatro meses. Zikra Asadin também deu à luz na viagem que a levou até França, desta vez em Málaga, em Espanha, há apenas quatro meses.
"Chegámos há três meses a França. Na Síria pensava que a França ia ajudar-nos mas nunca me passou pela cabeça que ia viver na rua como os ciganos. Isto não é vida. Não sei o que vamos fazer", contou a jovem vestida com um xador negro que lhe deixa apenas o rosto destapado.
O marido de Zikra, Jalal, tem 23 anos, era informático em Homs e está disposto a fazer qualquer tipo de trabalho em Paris, mas as oportunidades escasseiam, "sobretudo para os migrantes acabados de chegar e sem papéis".
Yahya Khedar está em França há ano e meio e cansou-se de esperar porque até agora não encontrou trabalho, nem obteve o estatuto de refugiado, nem conseguiu pôr os filhos na escola. "Como é que posso viver aqui?", lançou o dentista de Homs, acrescentando que há vinte dias foi a Bruxelas para fazer um pedido de asilo lá.
Antes de chegar a Paris, Yahya Khedar fez uma longa viagem desde que abandonou a sua casa, no bairro de Baba Amr, em Homs, devido ao medo de "todos aqueles que, a cada cinco minutos, batiam à porta, armados, para pedir dinheiro, quando começou a revolta contra o presidente Bashar al-Assad", em 2011.
Com a esposa e os cinco filhos, Yahya trocou Homs por Damasco e por Sayyidah Zaynab, na Síria. Depois passaram cinco meses em Beirute, no Líbano, tentaram o Cairo, no Egito – "mas os sírios eram alvo de pilhagens" – seguiram para Bengasi e Tripoli na Líbia, e foram parar à Argélia onde Yahya arranjou alguns pacientes e conseguiu exercer a sua profissão momentaneamente graças ao material que transporta sempre consigo.
"Depois fomos para Tânger, em Marrocos. Entrámos em Mellila, onde ficámos quatro meses num sítio que parecia uma prisão e daí passámos para Espanha. Como não havia trabalho devido à crise seguimos para França", continuou.
Achim Al Anasan, de 43 anos, também deixou a sua casa em Homs, há dois anos, porque de cada vez que a esposa ia à rua tinha medo que ela não regressasse, devido "à polícia de Bachar al-Assad que metia toda a gente na prisão".
"Eu, a minha mulher e o meu filho de seis anos fizemos a viagem pela Turquia, Grécia e Itália. Estamos há um mês em Paris e já pedi o estatuto de refugiado mas estou à espera de resposta", descreveu, com ar sonhador, o antigo comerciante.
Lusa/SOL