Afinal, António Costa só fala verdade junto de chineses!

1.Como se previa, António Costa iniciou funções governativas com uma narrativa muito bem delineada e estudada ao pormenor. É já uma tradição do nosso sistema político-constitucional (aliás, a única que a atual coligação de extrema-esquerda e o extremo-PS respeitaram, porque lhes convinha) que o Governo que inicia funções coloca os seus colaboradores a pesquisar dossiês,…

 2.Durão Barroso fez o mesmo em relação ao Governo de Guterres, para justificar a sua agenda de medidas restritivas e o “plano anti-tanga”; José Sócrates fez o mesmo em relação ao Governo de Pedro Santana Lopes; António Costa faz, agora, o mesmo em relação ao Passos Coelho. Passos Coelho é um caso diferente: o seu Governo tomou posse num contexto de intervenção externa e de pré-insolvência colectiva, devido à atuação trágico do pior Primeiro –Ministro do Portugal democrático desde Vasco Gonçalves (José Sócrates).

3.Pois bem, António Costa, invocando esta narrativa já repetitiva e nada original, pretende justificar a aplicação de medidas de austeridade (mantendo, no essencial, as políticas do Governo de Passos Coelho/Paulo Portas) com o falhanço e a incompetência do Governo anterior. Isto para criar a ficção política de que o novo Governo só aplica ou mantém medidas duras porque os anteriores responsáveis falharam em toda a linha – e agora, o pobre António Costa (ui, que pena, que sentimos por Costa!) está obrigado a aplicar tais medidas de austeridade, sem alternativa para mudar, de imediato, o rumo. Por outro lado, António Costa ao invocar o insucesso e o falhanço do anterior Governo reforça o seu peso negocial junto do PCP e do BE: não precisa de justificar, explicar ou avançar um plano alternativo para colocar em prática a visão liberal e de centro-direita de Mário Centeno sobre gestão orçamental e política financeira. Basta brandir aos céus o hipotético (inventado?) desastre da política do Governo de centro-direita: “os malévolos, os terríveis laranjinhas deixaram isto tão desarrumado que nós, pobres e ingénuos socialistas, temos de arrumar. Claro que não sabíamos de nada! Não sabíamos que as finanças estavam tão mal!”. Pois, pois, é a conversa da treta do costume….

4.Por outro lado, António Costa tem, assim, o pretexto ideal para fazer chantagem sobre os comunistas e os trotskistas do Bloco: é que quer comunistas, quer bloquistas ficam na contingência de ter de apoiar as medidas do Governo do extremo-PS. Porquê? Por uma razão muito simples: se Jerónimo de Sousa e/ou Catarina Martins tirarem o tapete a Costa devido à aplicação das medidas de austeridade, António Costa acusá-los-á de não respeitarem os compromissos europeus e internacionais do Estado Português, lançando o caos e a desordem política no nosso país. Mais: entregando, muito provavelmente, o poder ao centro-direita. E esse é um ónus que nem PCP, nem BE querem. É um ónus que poderão não aguentar eleitoralmente, ditando o fim ou a rutura do partido. Estamos, ainda, em pleno funcionamento da teoria dos jogos: não sairemos deste jogo enquanto este Governo permanecer no poder…

5.Uma última nota para salientar a infantilidade e a falta de sentido de Estado que António Costa tem revelado nas suas primeiras semanas como Primeiro-Ministro, apesar de não eleito pela maioria dos portugueses. Primeiro, terá mandado (pessoalmente, temos poucas dúvidas que a iniciativa partiu de si) colocar no “Diário de Notícias” a notícia de que o Governo de Passos Coelho e Paulo Portas não deixaram nenhum trabalho preparatório do Orçamento do próximo ano. O que é mentira: o Governo deixou toda a informação disponível que se impunha até ao momento em que cessou funções – e o Orçamento é um conjunto de decisões político-financeiras. Ora, como poderia um Governo cessante deixar o trabalho político fundamental para o Governo seguinte, que tem uma perspetiva ideológico-programática distinta? É uma falácia que António Costa colocou em circulação para justificar o atraso na feitura do Orçamento de Estado.

6.Como foi uma falácia com um objetivo político evidente (atrasar o mais possível a feitura do Orçamento) a notícia de que António Costa só iria apresentar o Orçamento em março, colocada no mesmo jornal. Poucas horas depois, António Costa apressou-se a desmentir a notícia que ele próprio terá plantado. Porquê? Fácil: para alertar e prevenir a opinião pública que a feitura e a apresentação do Orçamento poderão demorar. Agora, tudo o que for apresentado antes de março, já será uma vitória de António Costa: contra a tal notícia, contra todas as expectativas, o Governo do extremo-PS conseguiu apresentar o Orçamento antes de março! Ou seja: coloca-se uma notícia fixando um prazo; desmente-se a notícia e apresenta-se o Orçamento antes dessa data.

6.1.Desta forma, fabrica-se a imagem de um Governo trabalhador, responsável, que até antecipa prazos! É o artista António Costa no seu melhor! António Costa só se sente a jogar estes lances políticos, estas jogadas de xadrez…É a praia dele e é na praia dele que quer jogar…À atenção de Passos Coelho e Paulo Portas: impõe-se desmontar a narrativa socialista! Há que mostrar e explicar aos portugueses estas jogadas e o seu verdadeiro significado!

7.Meu caro leitor, lembra-se que António Costa, na campanha, aos portugueses dizia que Portugal estava um caos, um país desolado, só miséria e uma economia asfixiada – e, perante uma plateia de chineses, Costa já dizia que Portugal estava a seguir o caminho certo, apresentado uma economia a florescer e com uma nova dinâmica? Pois, agora sabemos, dadas as primeiras semanas da sua governação, que António Costa pensa, verdadeiramente, que a análise correta é a segunda. Pena é que António Costa só diga a verdade a uma plateia com chineses…

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