2.Quais as linhas de força do discurso de Marcelo? No conteúdo, nada de novo. A estratégia – como confidenciou o seu assessor de imprensa e Rodrigo Moita de Deus já dera a entender em intervenções avulsas que tem feito – é evitar que o candidato perca votos, focando a atenção política em quatro pontos chaves. O objectivo é falar para o país – e não para os partidos. Falar de grandes temas – e não de questões meramente político-partidárias. Quanto menos falar de questões político-partidárias, menor é o risco de desagradar à direita, sem agradar suficientemente à esquerda. Marcelo Rebelo de Sousa quer fixar o seu campo gravitacional no centro – e daí não quer sair. No fundo, é aplicar a segunda Lei de Newton à política – esperemos é que a lei de física política de Marcelo Rebelo de Sousa se verifique até ao dia 24 de janeiro. E que não haja uma atracção gravitacional que o faça tombar – consideramos que Marcelo fez os cálculos e as demonstrações correctas para se impor às leis da física política e vencer à primeira volta.
3.As quatro linhas de forças resumem-se às seguintes:
i) Manutenção dos compromissos internacionais portugueses, que passam, designadamente, pelo aprofundamento das relações luso-americanas; pelo maior envolvimento de Portugal na NATO; pela valorização das Forças Armadas e dos nossos soldados, presentes, futuros e veteranos que serviram a nossa Pátria; defesa intransigente, mas inteligente, da integração de Portugal na União Europeia – discurso que agrada à direita (que, aliás, invocou a NATO para a recomendação do voto em Marcelo) e ao PS moderado;
ii) A necessidade de o próximo Presidente ser um promotor de consensos, de estabilidade política, de ajudar os partidos a chegar a entendimentos mínimos sobre questões de importância máxima para os portugueses, como a saúde, a educação, segurança social, justiça ou mesmo administração interna (com uma palavra especial para a importância e dignidade dos portugueses que integram as forças policiais, que defendem, entre nós, a nossa segurança individual e a nossa liberdade);
iii) O próximo Presidente terá de ser um Presidente de afectos, estabelecendo ligações fortes e directas com os cidadãos portugueses. Com todos os cidadãos portugueses: não há portugueses de primeira e portugueses de segunda. Marcelo quer dar voz aos sem voz, aos mais excluídos, aos problemas daqueles que não têm acesso –ou têm acesso dificultado – aos centros de poder e de comunicação mediática – discurso que agrada a todos, desde o PCP até ao CDS;
iv) Que ele, Marcelo, é o mais apto, mais competente e está em melhores condições de exercer as funções de Presidente da República. E tem a fortíssima convicção de que será eleito à primeira volta – até porque pretende (e está cheio de ânimo e vontade) começar a trabalhar, para ajudar Portugal, o mais depressa possível. E que Portugal precisa de um Presidente activo, de grande actividade, sempre pronto para ouvir e ajudar os portugueses – e não um Presidente (ou Presidenta) cinzento, parado, muito pouco activo. O que é claramente um remoque simpático a Maria de Belém.
4.Estas ideias são boas – mas não são originais, para quem presta atenção ao que tem sido o discurso adoptado por Marcelo Rebelo de Sousa nos últimos tempos. A grande originalidade, revelada no discurso hoje no American Club, foi quanto à forma. Marcelo apresenta-se como institucionalista, como estadista, como verdadeiro actor político – e já não como comentador ou animador televisivo, como qualificam depreciativamente alguns. Para nós, não é novo: sempre escrevemos que Marcelo tem dois lados – um de comentador, de pedagogo, que tenta simplificar matérias complexas para passar a mensagem e informar todos os portugueses; outro, de estadista, de institucionalista, de formalista como já ninguém é. E este segundo lado – mais desconhecido para a generalidade dos portugueses – está a revelar-se e a dominar a campanha presidencial. O que torna ainda mais risíveis as acusações da esquerda, segundo as quais Marcelo é um agitador e um animador! Marcelo, intrinsecamente, é precisamente o contrário. Basta pensar no que foi Marcelo e órgãos de gestão na Faculdade de Direito de Lisboa ou na Fundação Casa Bragança e o que está a ser nesta campanha – é um institucionalista e um formalista.
5.Outro ponto a reter: Marcelo, em jeito de conclusão, subtilmente, afirmou, perante a plateia internacional, que é preciso acreditar em Portugal. Que ele, Marcelo, é, por natureza, um optimista realista e não tem dúvidas que daqui a cinco anos, Portugal estará muitíssimo melhor, com a crise económica e social a ser muito menos pungente. Traduzindo para português (e para bom entendedor): no término do meu mandato, deixarei um país bem melhor do que aquele que herdei. Eis o primeiro –e mais fundamental – compromisso de Marcelo para com os portugueses: tornar a nossa Pátria mais próspera, com mais oportunidades e justiça social. Marcelo tem talento, competência e capacidade para conseguir concretizar tal promessa. Assim Deus e o Povo português (cuja vontade é a voz de Deus!) o ajudem.
6.Para terminar, partilhamos um receio com os nossos leitores: será que este discurso de Marcelo – supra-partes, acima dos partidos, a falar para os portugueses e não para os candidatos – será suficiente para os debates, ainda para mais com os restantes candidatos numa onda de insultos e ataques pessoais a Marcelo? Veremos como Marcelo ajustará o tom da sua mensagem e definirá a sua postura…