O chefe de Governo chegou a admitir que poderá ter de apresentar um Orçamento retificativo devido à situação do banco, mas quis acautelar que as perdas não põem em causa a meta dos 3% que permitirá a Portugal sair do Procedimento por Défice Excessivo (PDE).
Na prática, a solução negociada em Bruxelas deve prever que, em caso de perdas adicionais, a intervenção no Banif seja considerada uma despesa extraordinária. Haveria assim um défice com Banif e outro sem Banif. O mais baixo é que contaria para o PDE.
O precedente do Novo Banco
António Costa fez questão de lembrar que esta interpretação contabilística já foi seguida no passado. “É entendimento da Comissão Europeia que as despesas relativas ao fortalecimento do sistema das aplicações financeiras neste quadro não têm sido consideradas relevantes para o procedimento de défice excessivo”, afirmou em Bruxelas, depois de uma série de encontros com líderes europeus.
O primeiro-ministro lembrou ainda que “o aumento muito significativo” do défice de 2014, devido à intervenção no Novo Banco, “não foi tido em conta para a avaliação do cumprimento das regras para efeito do PDE”.
Já em 2013, quando o Banif foi alvo de um resgate, foi seguido este entendimento. Nesse ano houve um défice sem o efeito Banif e outro com esse impacto.
Contactado pelo SOL, o economista Filipe Garcia, da consultora IMF, explica que, no caso de existir agora um prejuízo para o Estado, isso não irá penalizar o défice deste ano: haveria a mesma solução encontrada para o Novo Banco. “Nesse caso, a parcela do Banif não entra para as contas de défice excessivo e apresenta-se como uma questão meramente contabilística”.
Em setembro deste ano, o vice-presidente da Comissão Europeia responsável pelo euro, Valdis Dombrovskis, considerou que o impacto da operação de capitalização do Novo Banco no défice de 2014 era uma questão meramente contabilística e que não iria exigir medidas orçamentais compensatórias. O INE revelou que a capitalização do Novo Banco fez o défice orçamental de 2014 subir para 7,2% do PIB, contra os 4,5% reportados anteriormente.
Filipe Garcia lembra ainda que esse “trabalho de omissão no défice” poderá ser facilitado no caso de ser posto em prática o Fundo de Resolução, uma vez essa medida seria “supervisionada por autoridades europeias e apenas reajustada à realidade portuguesa”.
Espanhóis interessados
Já para os contribuintes, o tratamento será diferente. De acordo com o economista, qualquer que seja o cenário a avançar terá sempre custos para os portugueses. “E isso não vai dar para omitir”.
O próprio primeiro-ministro já admitiu esta semana que o custo para os contribuintes resultante da ‘salvação’ do Banif dependerá da solução final do processo em curso no banco. Sobre os depositantes, António Costa afirmou que “têm todas as razões para estarem plenamente confiantes na integridade dos seus depósitos, independentemente dos seus montantes”. “Quanto ao dinheiro público investido no banco, isso dependerá muito da solução final. Não posso dar a mesma garantia”, afirmou.
Haver ou não perdas adicionais com o Banif depende em muito do processo de venda da participação do Estado, cujo prazo de ofertas terminou ontem ao final do dia. O banco recebeu seis propostas, entre as quais estavam as do Santander e do Popular.
O valor da venda dos 60,5% do Estado será determinante para apurar perdas e, mesmo que haja um encaixe financeiro com a alienação, há uma incógnita adicional: o Estado fica ou não os ativos tóxicos que ficaram de fora do negócio, nem que seja temporariamente?