É verdade que algo mudou à esquerda. Ao fim de 39 anos em que sempre recusou viabilizar Governos minoritários do PS, o partido de Álvaro Cunhal deu uma guinada súbita na sua estratégia e decidiu apoiar o Executivo socialista de António Costa. Foi um pequeno passo para Jerónimo de Sousa, mas um passo de gigante para as imobilistas práticas de décadas da Soeiro Pereira Gomes.
E o que ganhou, entretanto, o PCP com este seu ousado aggiornamento? Conseguiu o retrocesso da concessão a privados dos transportes públicos de Lisboa e Porto (assim preservando alguns bastiões da sua força sindical). E ainda um aumento do salário mínimo para 535 euros (há um ano, o Governo de Passos Coelho já o subira de 485 para 505 euros). E também um acréscimo de 2,5 euros nas pensões mais baixas. Sem esquecer a redução em 50% da CES sobre as reformas (embora o PCP exigisse já a reposição integral).
Só que, num primeiro balanço, isto parece pouco para quem andou a apregoar à esquerda ‘o fim da austeridade’ (ainda permanecerão para a maioria, em 2016, cortes nos salários e pensões), um radical ‘virar de página’ (não há alívio na pesada carga fiscal, em 2016, e até a sobretaxa teima em não desaparecer) ou ‘o raiar de um novo ciclo’ (o caso Banif relembra de imediato os casos do BES e do BPN). É esta a mudança política pela qual Jerónimo e os comunistas dão a cara e o voto?
Numa solene (e insólita) proclamação parlamentar, António Costa garantiu no início do mês a Jerónimo de Sousa: «O que o PCP não está disponível para apoiar é o que nós também não estamos disponíveis para propor». Parece que o resgate do Banif e o Orçamento retificativo não estavam contemplados nesta promessa. Esperemos para ver se o OE para 2016 também não. E como é que o PCP engole (ou não) esse volumoso sapo.