Maria de Belém à espera da onda

Na primeira ação de rua de Maria de Belém, ao sexto dia de campanha, encontrou uma feira quase vazia. A simbologia da passagem pela Nazaré foi salva pela visita ao farol, de frente para o famoso ‘canhão’ de ondas gigantes que deu ao surfista Garrett McNamara um recorde mundial. A socialista parte para a segunda…

O núcleo político de Belém aposta em mais rua, onde a candidata «se sente confortável e muito à vontade com as pessoas», diz um companheiro de partido. Até agora Belém «não arriscou nada», diz outro socialista, duvidando do acerto da estratégia.

Belém é a candidata da Saúde e do Estado Social, e o percurso da caravana vincou-o. Começou num lar (houve também um centro de terceira idade) e seguiu por hospitais (três) e misericórdias (duas). A ex-ministra da Saúde e ex-ministra da Igualdade atacou depois o mundo das empresas. À passagem pela famosa louça de casa de banho da Fábrica Valadares somaram-se outras seis unidades de produção.

As visitas dentro de portas dispensam a ‘máquina partidária’ e a organização da campanha (com a marca da empresa de comunicação de Cunha Vaz) compensa bem o resto. A máquina está com Sampaio da Nóvoa, para lamento dos ‘belenzistas’. Mas a socialista chamou a si os nomes mais sonantes do PS guterrista para ampliar a sua mensagem chave: é ela a única com pergaminhos no partido a concorrer a Presidente da República. Jorge Coelho, o verdadeiro ‘homem do aparelho’, brilhou em Viseu, revelando-se ironicamente «deprimido» com o fim dos comentários televisivos dominicais de Marcelo. Para PR, acrescentou, Marcelo não é mais do que um «mister simpatia».

Ontem foi o histórico Manuel Alegre a entrar em ação. O candidato presidencial de 2006 (não apoiado pelo PS) e de 2011 já tinha empolgado o primeiro jantar de pré campanha, em Lisboa. «É bom que os socialistas não esqueçam os erros do passado», avisou.

Houve guterrismo, alegrismo e também soarismo, joão soarismo. O único ministro de António Costa que apoia Belém apareceu no primeiro dia, em Alpiarça, e disse que a mãe, Maria Barroso, se fosse viva também estaria a apoiá-la. Ao jornal i, acrescentou que o fez num momento de emoção – «Não quero que o apoio da minha mãe seja argumento de campanha».

João Soares lembrou também o nome do anterior secretário-geral, que apoiou. «Não sou dos que apagam a história do partido. Seguro foi um belíssimo secretário-geral do PS», justificou o agora ministro da Cultura. João Soares é uma exceção. Maria de Belém, acusada de ser uma candidata de fação, tem feito questão de se demarcar de qualquer resquício segurista: «Não falei com ele para me candidatar», disse, acrescentando que também não tencionava convidá-lo para vir à campanha.

Mas há segurismo na caravana. Miguel Laranjeiro, o ex-deputado que António Costa dispensou das listas, faz a ligação com a estrutura socialista ligada ao anterior secretário-geral do PS. Um iminente dirigente do PS interpelava-o no domingo como «o nosso diretor de campanha». No conselho de notáveis que acompanha a candidata, há ainda Vera Jardim e Alberto Martins, figuras que estiveram com Seguro. E Francisco Assis, que deve aparecer na próxima semana, para já usa a sua crónica do Público para defender Belém dos ataques de Nóvoa.

A queda para terceiro lugar

Outra questão estratégica fundamental para a reta final da campanha será saber como se recoloca Maria de Belém no papel de ‘challenger’ de Marcelo. A perceção de que Nóvoa passou a ser o principal adversário do candidato da direita foi-se consolidando desde os debates televisivos em que o ex-reitor se saiu bem. A sondagem do Expresso, deixando Maria de Belém em terceiro lugar (com uma queda de 1,8% face à sondagem anterior) e Marcelo mais próximo da vitória à primeira volta, também dá o alerta para o ‘forcing’ necessário nos últimos dias.

«O tempo vai mudar» diz um elemento do núcleo político da candidata. A referência é meteorológica –  a chuva arruinou na quarta-feira o primeiro ensaio de rua, depois de um chá na Periquita de Sintra. Politicamente, aposta-se na continuidade dos ataques a Marcelo (que a candidata disse que não faria). Nesta primeira semana o ‘malhar no Marcelo’ animou um comício para 100 pessoas em Almeirim e um (maior) jantar comício em Viseu.

Belém vai apostar no registo jantar comício, mais fácil de compor para as televisões, e sem muitas camionetas, mas com a ajuda das estruturas autárquicas. Lisboa, Porto e Coimbra (onde termina a campanha) são os locais escolhidos para mostrar força. Esperando até lá a tal vaga de fundo que até agora não teve.

O positivo e o negativo da campanha de Maria de Belém

POSITIVO

Pesos pesados

Jorge Coelho e Manuel Alegre, mas também João Soares, dão o respaldo mediático e passam a mensagem de que o PS histórico está com Belém. Algo fundamental para contrariar a perceção de perda para Sampaio da Nóvoa. E ainda que fiquem de fora Guterres (não quis vir) e Seguro (não foi convidado).

Candidata melhor

Começou crispada e defensiva nos debates televisivos e foi depois ‘gozada’ por querer convidar chefes de Estado para jantar em lares de idosos. Na última semana voltou a transmitir a habitual imagem de experiência e simpatia. Não tem chegado para fazer a diferença, mas desfez as dúvidas iniciais.

NEGATIVO

Subida de Nóvoa

Na imagem da primeira semana, Nóvoa passou para a frente. Tem melhor máquina de campanha, com a ajuda do PS, tem mais dirigentes socialistas, tem melhor imagem e melhores sondagens. Uma perceção que afeta o ânimo da ‘entourage’ de Belém.

Romaria deprimente

Idosos e doentes. A insistência de visitar lares e hospitais mostra o lado solidário da candidata mas é deprimente nas televisões. Na ausência de rua, Maria de Belém passou também por fábricas, com muitas mulheres à volta. Para a semana pede-se rua. E alegria.