Sampaio da Nóvoa entra na derradeira semana da campanha para Belém de sorriso rasgado. A vida corre bem ao ex-reitor da Universidade de Lisboa que tenta chegar ao mais alto cargo da nação: passou o teste da notoriedade nas ruas, as sondagens colocam-no a subir nas intenções de voto – enquanto Maria de Belém, com quem disputa o eleitorado socialista, se afunda – e de cada vez que um dirigente de peso do PS aparece para dar uma ajuda disparam os ataques ao adversário que conta com com a recomendação de voto da direita.
«Isto está a ficar sério», desabafava um membro da comitiva do candidato, depois de um almoço-comício em Abrantes, na quinta-feira. «A vitória está aí à porta», garantia ontem Nóvoa, na Póvoa de Varzim, ao lado do pai, Alberto, juiz conselheiro jubilado e ex-ministro da República para os Açores.
Desfile de apoios socialistas
O clique deu-se com o debate televisivo com o ex-líder do PSD e foi confirmado na rua durante a semana. «Ele já é general», sentenciou Ramalho Eanes em resposta a Marcelo, que acusou Sampaio da Nóvoa de querer passar de «soldado raso» da vida pública para «general».
O que Nóvoa não tem em experiência político-partidária compensa com apoios. E são muitos. Além do apadrinhamento de Eanes, de MárioSoares e de Jorge Sampaio, os três ex-Presidentes da República, o professor universitário juntou-lhe uma lista de ex-ministros (como Correia de Campos, mandatário nacional) e ministros do PS, que diariamente se juntam à campanha. Augusto Santos Silva, ministro dos Negócios Estrangeiros, esteve ontem em Matosinhos. Vieira da Silva, ministro da Segurança Social, estará hoje em Viana do Castelo. Eisso dá força a Nóvoa para enfrentar a rua com pose de candidato e sem as vestes de reitor honorário.
O apoio mais ou menos formal do PS faz quase tudo na mobilização da moldura humana que aparece atrás do candidato e na aproximação aos eleitores. Sampaio da Nóvoa repete mandatários de Soares nas presidenciais de 1991, como Joaquim Coelho, em Coruche, e já passou por locais onde o ex-Presidente reuniu apoiantes.
Se há coisa que a primeira semana de campanha demonstrou é que o candidato independente está mais político: Nóvoa pode ter fugido aos bancos da escola partidária, mas rapidamente apanhou o jeito para a campanha. Não se transformou num Marcelo Rebelo de Sousa que entra em todo tipo de lojas (até funerárias), mas também não evita a rua (como foi acusada Maria de Belém). Nóvoa está feito um político, com ataques fortíssimos ao seu adversário principal.
Passar uma mensagem: só ele pode derrotar Marcelo
Além de Viana do Castelo, a caravana vai andar hoje por Barcelos, Ponte de Lima, Monção e Valença (onde Nóvoa). Amanhã, antes de rumar para os Açores (se o boletim meteorológico permitir), fará um almoço-comício em Lisboa, no pavilhão do Casal Vistoso, com a participação de Jorge Sampaio e de Teresa Salgueiro, mandatária nacional da candidatura. Estão inscritas 1.600 pessoas e arrisca ter aí o maior comício da sua candidatura.
O discurso servirá para lançar a derradeira fase da campanha. Polarizar os votos à esquerda e tentar passar a mensagem de que só ele, entre os 10 candidatos, é capaz de derrotar o que tem o apoio do PSD e do CDS.
Esta semana sublinhou sempre que pode as suas linhas de força:«Anunciei a minha candidatura sem estar à espera de apoios partidários e sem estar a fazer cálculos com o resultado das legislativas». E partiu para a farpa a Marcelo: «Nunca vimos um candidato dizer às pessoas do partido do qual foi presidente ‘não apareçam, por favor, por favor não se juntem’». «É cálculo político, é o taticismo, e uma forma de fazer política levada ao extremo. É a ingratidão de quem, precisando do voto das pessoas que estiveram sempre ao seu lado, agora as descarta para não estragar um show de uma campanha vazia», acrescentou.
Antes, em Évora, recorreu ao argumento de Passos Coelho, em plena campanha para as legislativas, para criticar o chumbo pré-anunciado de António Costa ao Orçamento do Estado que viesse a ser apresentado pela a coligação de direita, para criticar uma promessa de Marcelo: fazer o possível e o impossível para que o Orçamento deste ano seja viabilizado. «Promete viabilizar um Orçamento que desconhece?» – questionou Nóvoa, que ontem também se referiu ao documento que será apresentado pelo Governo: «Faço um comentário genérico, de confiança de que seja possível organizar um bom Orçamento».
A semana teve os seus incidentes. Ramalho Eanes comparou Nóvoa a Cavaco Silva e o médico Cândido Ferreira levantou dúvidas sobre o seu percurso académico – mas ficou sem resposta. Nóvoa diz que só pensa numa vitória construída a partir do «chão da democracia». Até lá, tenta fintar Marcelo.
Os altos e baixos da campanha de Nóvoa
POSITIVO
Discurso
Sampaio da Nóvoa é acusado de ter um discurso redondo, mas esta semana fez intervenções mais políticas, clarificou que o seu programa é a Constituição e que não tem um programa de Governo porque conhece bem os limites constitucionais do Presidente.
Mobilização
Para quem corre sem o apoio oficial de partidos representados no Parlamento, tem conseguido mobilizar na rua um número suficiente de apoiantes que ajudam no propósito da mobilização. É certo que o PS é fundamental na construção da moldura que aparece atrás do candidato, mas Nóvoa, o académico, deu lugar ao candidato afável.
NEGATIVO
Presente envenenado
Ramalho Eanes apoiou a candidatura de Cavaco Silva a Belém, em 2006, e a sua recandidatura em 2011. É certo que não se podia demarcar desse apoio – até porque há uma espécie de acordo entre Presidentes de não se comentarem uns aos outros –, mas não caiu bem a comparação que estabeleceu entre Cavaco e Sampaio da Nóvoa, em plena ação de campanha deste candidato.
O ex-Presidente percebeu a tempo que cometera uma gafe e tentou corrigi-la falando em tempos diferentes. E Nóvoa ainda acudiu para reforçar as diferenças, assegurando que «em muitos momentos» agirá de maneira diferente de Cavaco Silva.