Marcelo Superstar

Marcelo recusou-se a dar conforto moral aos milhões de portugueses que votaram na direita.

O PS fez eleger Mário Soares e Jorge Sampaio como Presidentes da República, e o PSD fez eleger Cavaco Silva. Desde 1976, para além daqueles, os partidos políticos apoiaram candidaturas do general Eanes, Manuel Alegre, Francisco Louçã ou Jerónimo de Sousa. Nestas nonas eleições presidenciais depois do 25 de abril, o inesperado aconteceu: o PS e o PSD, que deram a Portugal os três Presidentes dos últimos 30 anos, não apresentaram candidatos oficiais.

Parece ter sido o bastante para termos uma campanha presidencial de Tinos. Se me quiserem considerar uma antidemocrata por achar que há candidatos presidenciais que não o deviam ser, então chamem-me antidemocrata.

Na eleição presidencial de 2006, com todos partidos a apoiarem os seus candidatos, tivemos direito a uma verdadeira campanha eleitoral presidencial: Cavaco Silva, Mário Soares, Manuel Alegre, Francisco Louçã e Jerónimo de Sousa. Um luxo! A champions league das presidenciais. É claro que o facto de Cavaco Silva ter ganho à primeira volta a estes quatro candidatos de peso da esquerda justifica o ódio mortal que esta lhe devota.

A história de Marcelo Rebelo de Sousa é bem conhecida de todos. É simplesmente o maior, o melhor, o mais brilhante, o mais querido comentador da TV portuguesa. Construiu a sua imagem e reputação domingo a domingo. É popular e populista.

Nos anos de chumbo da troika, Marcelo criticou muitíssimo o Governo. Essa independência valeu-lhe o remoque da moção de Passos Coelho no Coliseu, em fevereiro de 2014: não apoiaria para Presidente da República «um cata-vento».

Aqui chegados, temos a primeira perplexidade: nas primeiras eleições presidenciais sem candidatos oficiais do PS ou PSD, vemos Marcelo Rebelo de Sousa, uma das mentes mais brilhantes do país, a debater pouco e mal com candidatos que ou não lhe chegam aos calcanhares ou nem deviam lá estar.

A segunda perplexidade resulta de todos os graves problemas do país estarem ausentes da campanha. Sampaio da Nóvoa diz que é um «tempo novo». Marcelo diz que é porque somos todos amigos e não se passa nada.

A terceira perplexidade é que tudo isto acontece com uma parte da população a achar que devia ser a coligação PSD/CDS a governar porque ganhou as eleições, não se convencendo com o Governo de esquerda que lhe calhou em sorte – sem que tal facto seja sequer mencionado na campanha.

Marcelo Rebelo de Sousa construiu sozinho uma carreira política formidável na TV, não é o candidato oficial do PSD, é apenas recomendado, está a fazer uma campanha eleitoral remediada, tem uma visão de um Portugal modesto, mas unido, e recusa-se a dar conforto moral aos milhões de portugueses que votaram na coligação de direita.

Se Marcelo conseguir mobilizar uns milhões de portugueses para votarem nele nestas condições, então tem de ser considerado um dos mais brilhantes políticos portugueses, com fatais consequências na reorganização do centro-direita.

Se não conseguir, assistiremos a uma cena de crucificação. Cristo não voltará a descer à Terra para Marcelo.

sofiavrocha@sol.pt