À partida, nenhum tem – nem de perto nem de longe – a experiência que Cavaco Silva tinha quando se candidatou à Presidência.
Cavaco tinha sido um ano ministro das Finanças, dez anos primeiro-ministro e vencera duas eleições com mais de 50% dos votos.
Ora, o candidato com mais experiência foi ministro durante 5 anos e nunca disputou eleições nacionais.
Bastaria isto para os vários candidatos serem um pouco mais humildes quando falam do Presidente cessante.
À partida, os seus currículos políticos não se comparam com o dele.
Estas eleições presidenciais foram ensombradas por um equívoco, de que Marcelo Rebelo de Sousa foi parcialmente responsável.
Ao explicar que o Presidente é um simples «árbitro», Marcelo espalhou a ideia de que os candidatos não deveriam dar opinião sobre coisa nenhuma.
E ele próprio deu o exemplo, não dizendo nada que o comprometesse.
Ora, o facto de o Presidente não governar, não significa que não tenha opinião sobre as grandes questões do país.
O Presidente da República é um político.
Faz parte do sistema político.
Pode fazer vetos políticos, pode mandar mensagens à Assembleia, reúne semanalmente com o primeiro-ministro, discursa em momentos importantes e representa o país no estrangeiro.
Um Presidente não é eleito para falar do sexo dos anjos…
Aliás, o mesmo Marcelo contradiz-se quando diz que o Presidente deve exercer a sua «influência».
Ou seja, não é só um árbitro mas alguém que tem o poder de influenciar.
E influenciar como?
Influenciar em que sentido?
Para responder a isso, é preciso conhecer as suas opiniões…
Como veem o país? Que ideia têm para o país?
Portugal deve ou não cumprir os compromissos internacionais, designadamente os compromissos militares com a NATO? E os compromissos com a União Europeia, designadamente o cumprimento do défice? E os compromissos com os credores, designadamente o pagamento da dívida? E a relação entre escola pública e privada e os sistemas de avaliação? E entre hospitais públicos e hospitais privados? E entre investimento público e privado? E como vê o investimento estrangeiro? E o equilíbrio da balança comercial, ou seja, o saldo entre exportações e importações?
E qual deve ser a relação de Portugal com o mar, que está na matriz da nossa história, e as relações com os países que falam português?
Um Presidente tem de ter opiniões sobre tudo isto, pois são questões de Estado – e o Presidente é o chefe do Estado.
Há muitos anos, no Expresso, Marcelo Rebelo de Sousa usou uma palavra muito curiosa para definir um político que não se queria definir: «Fulano não diz que ‘não’ nem que ‘sim’ – diz ‘nim’».
Ora, o que Marcelo disse então para o outro vale hoje para ele.
Foi ao cúmulo de dizer que é «a esquerda da direita».
Ou seja, se disserem que ele é de direita, corrige: «Mas sou a esquerda da direita».
Se disserem que ele é de esquerda, contrapõe: «Não, porque estou à direita da esquerda».
No extremo oposto está Sampaio da Nóvoa.
Ele faz questão de dizer constantemente que é muito de esquerda – e até compete com Maria de Belém, para provar que está à esquerda dela.
Ora, isto faz de Sampaio da Nóvoa um candidato de fação, o que também não está certo.
Sampaio da Nóvoa diz que pertence ao «tempo novo» iniciado com esta maioria de esquerda.
Mas então, quando esse ‘tempo novo’ chegar ao fim, o tempo de Sampaio da Nóvoa também acaba…
Se Marcelo peca por defeito, Sampaio da Nóvoa peca por excesso: identifica-se excessivamente com a estratégia de António Costa e com o frentismo de esquerda.
Nesse aspeto, Maria de Belém é a mais equilibrada.
Não renega, como Marcelo, o partido a que pertence, mas mostra-se uma pessoa moderada, capaz de conviver com qualquer Governo.
Não esconde as suas opiniões, como Marcelo, mas mostra capacidade para aceitar as dos outros, ao contrário de Nóvoa.
Não passa a vida a ‘dar graxa’ ao Governo.
Pode não ser a melhor candidata, mas é a que melhor se soube posicionar.
Portugal esteve quatro anos sob um programa de austeridade.
Assinou com a troika um memorando que foi assumido por três partidos, PS, PSD e CDS, correspondentes a cerca de 70% dos eleitores.
Ou seja, o programa teve o apoio da esmagadora maioria dos representantes do povo.
Ora, todos os 10 candidatos renegam hoje a austeridade.
Porquê?
Para não perderem votos.
Dizem mal de Cavaco porquê?
Para não perderem votos.
A cena mais engraçada desta campanha foi quando Ramalho Eanes, apoiante de Sampaio da Nóvoa, disse que este era parecido com Cavaco Silva.
Nóvoa ficou aflito e tratou logo de corrigir: era muito diferente de Cavaco!
Ramalho Eanes foi dos poucos homens livres que passaram por esta campanha presidencial.
Não estava a fazer politiquice – estava a dizer o que pensava.
O próximo Presidente da República vai ter de tomar decisões importantes.
Dele se espera coragem nesses momentos.
Mas como se pode esperar coragem de candidatos que não quiseram dizer o que pensam para não perderem votos?