Marisa Matias não a poupou, com uma argumentação populista que um post no Facebook condensa bem. «Para salvar salários ou pensões, não se conseguiu a assinatura de Maria de Belém. Para salvar os privilégios dos políticos, não se fez rogada!». A tirada é do líder parlamentar do Bloco de Esquerda, Pedro Filipe Soares, que compara a recusa da socialista assinar o recurso contra o Orçamento do Estado de 2012 com o empenho em ver devolvida uma pensão que a pode beneficiar, se a quiser pedir. Irá fazê-lo? «Não renuncio a nenhum dos meus direitos». É um sim.
Falando ontem no Fórum da TSF, Maria de Belém esclareceu que não está «arrependida» de assinar o recurso e que não aceita «juízos morais de ninguém». «Não tenho de pedir desculpa por nada do que ganhei», atirou ainda a candidata presidencial visivelmente zangada. Horas mais tarde, reconheceu o óbvio sobre este caso: «Pode ser muito prejudicial para a minha candidatura».
Pelo meio, no tradicional almoço socialista da Trindade, em Lisboa, Manuel Alegre saiu, uma vez mais, em defesa da candidata contra aquilo que acredita ser «a campanha infame e populista que ataca a sua candidatura».
As sondagens refletem o desgaste de Maria de Belém. Começou a campanha taco a taco com Sampaio da Nóvoa. Agora a Eurosondagem coloca-a quase seis pontos percentuais atrás do ex-reitor (19% contra 13,3% na projeção da sondagem para o Expresso e a SIC) – que teve consigo a ‘máquina’ partidária socialista. E a Católica faz disparar todos os alarmes: Belém, que recebe nesta sondagem feita para a RTP uns incríveis 8%, pode mesmo ser ultrapassada por Marisa Matias, que se revelou a principal adversária política durante a campanha.
De luto por Almeida Santos
A campanha de Maria de Belém foi-se apercebendo de que a máquina do PS estava a funcionar em pleno a favor de Sampaio da Nóvoa. Ao longo da última semana, houve várias manifestações de desagrado contra o que aparece como uma falsa neutralidade da direção do PS. Ontem foi Manuel Alegre, que disse que «quando há muitas camionetas» é um sinal da presença da máquina partidária.
Belém não contou com o aparelho, mas teve a ajuda de notáveis do PS. Almeida Santos fez o último discurso da sua vida na Figueira da Foz, para apoiar a candidata. O presidente honorário do PS manifestou confiança em Belém, ainda que suspeitasse que a candidata não seria a vencedora destas eleições. «Lembrem-se disso do que eu vos digo hoje: se não ganhar desta vez – não sei se ganha se não – da próxima ganha ela», afirmou Almeida Santos, num almoço em que surgiu debilitado por uma gripe. Belém respondeu com um elogio polémico, tendo em conta a importância de Mário Soares, chamando a Almeida Santos «o maior socialista português vivo».
Um dia depois, veio o choque da morte do antigo presidente da Assembleia da República, aos 89 anos. A candidata, consternada, suspendeu a campanha até ao funeral do histórico fundador do PS. A paragem da caravana de Belém não foi seguida por todos os candidatos e não impediu a realização do último debates televisivos – que era para ser a dez, na RTP. Maria de Belém faltou e foi a principal prejudicada pela polémica sobre as subvenções dos políticos. O debate foi dominado pelo tema do combate à corrupção e Belém apareceu do lado errado desta luta maniqueísta. Enquanto todos os candidatos se manifestaram contra a subvenção, a candidata ausente ficou-se por um comunicado que não clarificava a sua situação. Belém disse que iria ainda «avaliar as consequências da decisão» do Tribunal Constitucional para o seu caso e «oportunamente» decidiria. Alguns observadores, incluindo figuras próximas da candidata, temeram que este dia triste marcasse também o último ato da candidata, que parecia ter comprometido de vez as hipóteses de suplantar Nóvoa.
Nos dias anteriores, a caravana ensaiou o contacto de rua com o eleitorado e a experiência até não tinha corrido mal a Maria de Belém, que na primeira semana andara afastada de mercados e arruadas. Na feira da Tocha, ficou a convicção de que tinha passado o teste de popularidade, reconhecida e saudada por feirantes e clientes. Dias antes, um elemento da sua direção apostava na prova de força de rua para dar a volta ao texto – «Não há milagres. A receita é falar claro com os eleitores». Maria de Belém, porém esteve em silêncio durante dois dias. E quando voltou a falar já tinha ficado para trás.