Para o conseguir, Marcelo apostou em dirigir-se preferencialmente ao eleitorado central. E essa insistência numa estratégia dirigida ao centro resultou em pleno. Marcelo alcançou 52% dos votos expressos e a confiança de 2.410.286 eleitores – e assinale-se que só perdendo mais de 90 mil desses votantes teria corrido o risco de ter que disputar uma 2.ª volta a 14 de fevereiro.
Como se pode observar na estimativa do seu saldo de transferências, se 73% dos seus votos têm naturalmente origem na base eleitoral do PSD/CDS situada no centro-direita, a verdade é que Marcelo revela uma invulgar capacidade de captação de votos no centro-esquerda e mesmo em alguns setores da esquerda radical. O Presidente eleito atrai quase 400 mil eleitores do PS, perto de 100 mil no BE e PCP, o mesmo entre os pequenos partidos e, ainda, mais de 80 mil entre abstencionistas de há três meses.
Foram, no total, mais de 700 mil votos que Marcelo foi buscar fora da base tradicional do seu eleitorado, uma importante e decisiva fatia de 25% da sua votação total. E é aí que residem os alicerces da sua vitória à 1.ª volta na noite de 24 de janeiro.
Abstenção mais à esquerda
A abstenção subiu nestas presidenciais a 51,2%, quase mais 700 mil não votantes do que nas legislativas de outubro. Destes, perto de 200 mil terão sido eleitores do centro-direita que não se reviram na candidatura de Marcelo nem na sua campanha politicamente distanciada do PSD e do CDS.
Mas a parcela essencial desta abstenção, mais de meio milhão dos eleitores que ficaram em casa, terá vindo dos vários setores da esquerda. Em particular do PS, que não apoiando formalmente nenhum candidato, nem Sampaio da Nóvoa nem Maria de Belém, desmobilizou muitos votantes, mais de 380 mil – e o acelerado esvaziamento eleitoral da candidatura de Maria de Belém na reta final da campanha terá contribuído generosamente para este crescente número de abstencionistas.
Mas também o eleitorado comunista, desmotivado por um candidato de terceira linha como Edgar Silva, e o do Bloco, com uma base eleitoral mais diferenciada e volátil, ajudaram significativamente, com mais de 120 mil não votantes, ao acréscimo da abstenção.
Só Sampaio acima de Marcelo
Eleito com 52% dos votos expressos, Marcelo consegue uma percentagem superior à obtida por Cavaco na sua primeira eleição em 2006 (50,6%) e por Mário Soares na 2.ª volta de 1986 (51,2%).
Entre os quatro Presidentes civis, dois do PS e dois do PSD, apenas Jorge Sampaio supera Marcelo na sua eleição de 1996 (53,9%). E, sublinhe-se, não foi fácil para nenhum dos quatro conseguir essa pequena margem acima dos 50% que é sinónimo de vitória.