O matadouro da política

Marcelo Rebelo de Sousa, Marisa Matias e Tino de Rans ganharam a noite eleitoral. Deram-me razão no que ando a pregar no deserto há oito anos. O que têm em comum estes três políticos? São grandes comunicadores.

Marcelo fez-se à nossa frente, domingo a domingo. Agiganta-se quando vê uma câmara. Está sempre pronto para o seu close up. Um homem do mundo analógico, profundamente inteligente e culto, reinventou-se como personalidade política e atirou a matar.

Entre Marcelo de 2016 e Marcelo de 2000 há uma galáxia de distância. Olhou para governação e presidência de Cavaco, para a governação de Passos Coelho, e viu onde estavam os pontos fracos: conversa muito racional e pouco afectiva, falta de discurso acentuadamente social, falta de cultura dos valores populares (como os ídolos da música, da tv e do desporto).

Os cultos sabem que ele é culto, os menos cultos acham que ele é um deles. Antes de Marcelo, dizia-se que havia ‘animais políticos’. Depois de Marcelo, há ‘animais mediáticos’.

Marisa Matias (como Catarina Martins e Mariana Mortágua) é uma política do seculo XXI. Pensa e fala em caracteres, frases curtas, para os media e redes sociais. Está já completamente formatada pelo mundo digital. Bom ar e boa conversa, rápida no gatilho. É claro que funciona.

Tino de Rans é autêntico. Caiu no goto dos portugueses como alguns concorrentes dos reality shows que deixaram marca. É português dos sete costados. Nem analógico, nem digital. É o Zé Povinho, de Bordalo Pinheiro, de braços cruzados a dar-lhes o ‘Toma’. Houve identificação.

Esta eleição mostra que qualquer eleição que seja televisionada, com intervenções e debates, é fatal para quem não saiba falar para as câmaras.

Candidatos a Presidente da república e a primeiro-ministro, cabeças de lista às europeias e às legislativas, candidatos às câmaras de Lisboa e Porto vão ser todos vistos a debater nas televisões.

Maria de Belém e Edgar Silva foram trucidados porque são cinzentos, redondos, usam palavras e argumentos que a maioria das pessoas não percebe. Os partidos têm de compreender que, quando mandam estes candidatos concorrer em eleições cobertas pelas televisões, estão a enviá-los para a chacina. É mandá-los para o matadouro.

Este tipo de políticos que não é peixe nem carne, que não é culto nem é popular, que não é assim nem assado, que fez uma longa carreira política amparada pelas amizades das direcções partidárias e que é apanhada na contra-curva de uma qualquer pensão vitalícia, tem os dias contados. Não consegue ganhar uma única eleição onde tenha de dar a cara.

Em futuras eleições, se o PS e o PSD quiserem apresentar candidatos deste género, coloquem-nos no meio de listas onde ninguém dê por eles.

Muita gente ainda está agarrada a um modelo antigo de ser político e de fazer política. Do tempo em que os eleitores não eram telespectadores com um comando nas mãos.

Mas esse tempo fica numa galáxia far, far away…

sofiavrocha@sol.pt