Tozé Marreco. ‘Sonho desde criança com a Seleção’

Foi a grande surpresa do último dia do mercado de transferências: o homem-golo da II Liga está de regresso ao futebol português. Em entrevista ao SOL, o avançado de 28 anos revela que rejeitou convites da I Liga para rumar a Chaves e diz que vestir a camisola de Portugal é o maior sonho da…

Já o tentaram ‘enervar’ em campo por causa do apelido?

Não. Só algumas pessoas por pura maldade é que usam isso como argumento. Agora de colegas meus de profissão, nunca em algum momento. Tive várias discussões porque sou muito ‘chato’ em campo, mas isso é normal. Agora um colega que me tenha ofendido por causa do nome não me lembro de nenhum.

Sempre quis ser avançado?

A minha primeira posição foi médio-centro. Depois o Rui Silva, treinador dos juvenis da Académica na altura, foi-me buscar ao Mirandense, onde eu nos iniciados tinha feito trinta e tal golos a jogar como médio ofensivo, e pôs-me logo nos primeiros treinos a jogar a ponta de lança. E assim fiquei desde os 15 anos.

Tem algum ídolo no mundo da bola?

O Falcao. É o estilo de jogador que gosto e com quem me identifico mais. Mas em criança era sempre o Figo, que não tem nada a ver, mas era aquele jogador que sempre adorei ver jogar.

Alguma vez sonhou em seguir os passos do Figo e jogar no Barcelona? Ou chegar a um Real Madrid?

Não, o meu sonho desde criança é sempre a Seleção Nacional. Não tinha a pancada de jogar nem no Real Madrid, no Barcelona, no Benfica ou no FC Porto. Sempre que sonhava era com a Seleção. Sempre achei que é o maior clube do mundo.

Vestir a camisola de Portugal é a sua maior ambição como jogador?

Sim, quer dizer, se há coisa que eu tenho sempre é os pés bem assentes na terra [risos]. Sei o que posso atingir. Ambição pressupõe ainda alguma possibilidade de concretização, o que me parece altamente improvável. Mas foi sempre o sonho maior da minha vida.

Considera que já merecia uma oportunidade de Fernando Santos?

Bom, no ano passado o Rui Fonte foi chamado pelos golos que fez na II Liga… que eu também tinha feito na altura. Mas se há pessoa que tem sido correta, séria e honesta nas oportunidades que tem dado é o Fernando Santos. Jamais vou dizer, onde quer que esteja, que merecia uma oportunidade na Seleção.

O sonho poderá tornar-se realidade num futuro próximo?

Nem sequer penso nisso. Como disse, tenho os pés bem assentes na terra. Sei que é muito complicado um jogador a jogar na II Liga chegar à Seleção. Nem me passa isso pela cabeça.

Quer aproveitar para mandar algum recado ao mister das quinas?

Não [risos ]. Tenho a certeza que ele segue todos os jogos dos jogadores que lhe interessa seguir.

Foi a grande figura da subida do Tondela à I Liga, na última época. Até chegou a ser destacado no jornal espanhol Marca, para ilustrar o feito. Como se sentiu?

É sempre bom vermos o nosso trabalho reconhecido, ainda para mais num jornal como a Marca. Fizemos história ao pôr o Tondela na I Liga. Fui a ‘cara maior’ porque fui eu que fiz os golos, mas houve um trabalho absolutamente incrível de toda a gente. Aquelas semanas a seguir foram de reconhecimento. Souberam bem e aproveitei.

Há dez anos o Tondela militava nos distritais. E três anos depois da inédita subida à II Liga, conquistaram um lugar entre a elite do futebol português. Os festejos foram especiais?

Houve uma grande festa nessa noite em Tondela. Inesquecível. Toda a gente foi para a rua, os jogadores estiveram juntos com as pessoas e foi uma grande noite. A partir dali foi saborear aquele momento que sabíamos que era histórico. Eu pessoalmente desfrutei. Até porque nesse ano [2015] não dei entrevistas a ninguém o ano inteiro, não falei com ninguém. Por isso, nas semanas a seguir à subida foi puro relax.

Podemos dizer que foi o ponto mais alto da sua carreira?

Foi o segundo. Continuo a achar que a chamada aos sub-21 da Seleção, na altura, continua a ser o melhor dia da minha vida.

Em 2015 marcou 25 golos em 52 jogos e foi considerado o melhor jogador da II Liga. Um autêntico homem-golo para o Tondela. É verdade que chegou a ir a pé a Fátima para agradecer?

Sim, foi das primeiras coisas que fiz. E foi a primeira vez que misturei futebol e religião. Tinha feito essa promessa e cumpri-a com o meu irmão logo na semana a seguir, durante as férias. Bem que estava cansado depois de 52 jogos, mas tinha que ser feito [risos].

É um jogador supersticioso?

Supersticioso não diria, mas tenho uma fé. Isso tenho. Mas nada de especial. O ano passado no Tondela ouvia sempre uma música [Prayer in C de Robin Schulz] antes de entrar em campo. Era a única ‘superstição’ que tinha. Ouvia-a tanto, mas tanto tanto. Normalmente era o Rui Nereu que estava a meter música no balneário antes dos jogos. E ele dizia: ‘Tozé, olha a tua música para fazeres golo’.

Tem mais algum ritual?

Há uma proteção que me foi dita e eu faço sempre quando entro em campo.

Apesar da subida histórica do Tondela ao principal escalão do futebol português, no final da época rescindiu contrato e assinou pelo Royal Mouscron-Péruwelz, na Bélgica. O que se passou?

Foi uma opção que tomei de fechar um ciclo. Apareceu uma proposta desportivamente e financeiramente incomparável com as outras e que teria obrigatoriamente que assinar contrato.

Chegou a ter propostas da I Liga?

Houve duas ou três propostas, mas achei que a do Mouscron era superior.

Esta época não tem jogado com regularidade e soma dois golos em 281 minutos. A adaptação ao campeonato belga não correu como estava à espera?

Dois golos em quase 4 jogos não me parece assim tão mal. Houve uma escolha do treinador noutro jogador. Ponto. Eu quando tive a minha oportunidade aproveitei-a. Agora os treinadores têm as suas ideias e temos que as respeitar. Sempre a respeitei. Marcar dois golos não foi nada mau para os poucos minutos que tive.

Foi esse o motivo que o levou a ser emprestado ao Desportivo de Chaves no último dia do mercado de transferências?

Foi o querer voltar a sentir-me útil verdadeiramente, voltar a jogar e o próprio desafio enorme. Acredito e acho que este clube, com esta estrutura e estes adeptos, tem que estar na I Liga. Foi sempre um clube que gostei, que me deu sempre gozo ir lá jogar, porque é um bom estádio e tem sempre muita gente. É importante dizer também que para ir para o Chaves rejeitei outros convites. É uma aposta minha num clube que me passou muita confiança. Agora vamos à luta.

Mas voltou a rejeitar convites da I Liga?

Sim. Se há coisa que aprendi, e com erros anteriores, é que não vale a pena estar na I Liga por estar. E tive também da I Liga da Roménia e de outra I Liga, mas preferi ir para o Chaves. É o meu desafio, naquilo em que acredito.

Tem algum objetivo mínimo de golos até ao final da época?

Não, isso nunca faço. O maior erro que um jogador pode fazer é pôr pressão sobre si próprio. Quero é sentir-me útil, trabalhar e conhecer os meus colegas, que é o mais importante.

Tem fama de homem-golo da II Liga. É caso para dizer que marcar golos é o melhor que sabe fazer?

Sim, é aquilo que me tem ajudado a distinguir a minha carreira. Sempre que tenho a confiança das pessoas e do clube retribuo com muitos golos. Agora, para isso tudo há um trabalho enorme.

As únicas nódoas no currículo acabam por ser as duas experiências que teve na primeira divisão: 2 jogos pelo Beira-Mar em 2012/13 e 7 jogos pela Olhanense em 2013/14. Sem nenhum golo marcado. O que correu mal?

Há uns meses o Costinha fez um ‘mea-culpa’ na RTP, onde é comentador, e diz que eu talvez tenha sido o jogador mais injustiçado naquele ano no Beira-Mar. Eu com certeza que também tenho responsabilidades, mas não fiz um jogo a titular. Podem dizer que um jogador não tem qualidade quando tem oportunidades e não as aproveita, agora eu não fiz um jogo a titular. É absolutamente impossível fazer o que quer que seja.

Aos 28 anos ainda é possível chegar a um dos três grandes?

Não. Tenho os pés bem assentes na terra e sei que isso não vai acontecer.

Mas se pudesse escolher um, por qual optava?

Onde eu quis sempre jogar foi na Seleção. Para mim esse é o ‘grande’.

hugo.alegre@sol.pt