Em ‘Maddie: a verdade da mentira’, editado em julho de 2008, Amaral defende que a criança morreu acidentalmente no apartamento do empreendimento Ocean Club, na Praia da Luz (Lagos), na noite em que desapareceu, em 3 de maio de 2007, e que os pais esconderam o corpo e difundiram, para iludir os factos, a tese de rapto. O Tribunal Cível considerou que o livro provocou graves danos no bom nome e reputação de Kate e Gerry McCann, que, apesar de constituídos arguidos no inquérito viram as suspeitas sobre si serem arquivadas.
Em acórdão do passado dia 14, os juízes da Relação de Lisboa Ferreira de Almeida, Catarina Manso e Alexandrina Branquinho decidiram absolver Gonçalo Amaral e revogaram a decisão da primeira instância.
‘Legítimo exercício do direito de opinião’
No acórdão, os juízes começam por considerar que o livro não passa de “legítimo exercício do direito de opinião”, sendo o seu conteúdo muito claro: “A tese de que a menor faleceu acidentalmente e esse facto foi ocultado pelos pais», que consta no relatório final da PJ e que determinou a sua constituição como arguidos. E acrescenta que foram os próprios pais, pelas entrevistas na altura, “quem voluntariamente limitou os seus direitos à reserva e à intimidade da vida privada”.
A Relação destrói, por outro lado, a tese do Tribunal Cível que invocou como um dos motivos para condenar Gonçalo Amaral a violação do dever de reserva a que esteve vinculado enquanto funcionário de investigação criminal. “Mal se compreenderia que um funcionário, além do mais aposentado, mantivesse os aludidos deveres de sigilo e reserva, ficando limitado no exercício do seu direito à opinião relativamente à interpretação de factos já tornados públicos pela autoridade judiciária e amplamente debatidos (aliás, em grande medida, por iniciativa dos próprios intervenientes) na comunicação social, nacional e estrangeira”, dizem os juízes desembargadores.
O ex-inspetor da PJ, que tinha sido condenado a pagar aos McCann 500 mil euros, o que levou ao arresto de parte do seu vencimento, pode agora reclamar o fim do arresto e ainda pedir uma indemnização ao casal. Contactado pelo SOL, Gonçalo Amaral não quis fazer declarações.
A decisão da Relação revoga igualmente as condenações dos outros réus no processo: a Guerra e Paz, editora do livro, a Valentim de Carvalho e a TVI, que elaboraram um documentário e depois um DVD baseado em ‘Maddie: a verdade da mentira’. O Tribunal Cível tinha proibido que o livro e os DVD pudessem ser vendidos ou reeditados, além de os réus terem de entregar os exemplares que ainda pudessem restar em depósitos ou armazéns. Dos 180 mil exemplares de tiragem, 170 mil foram vendidos e sete mil apreendidos pelos McCann.