Demissão de gestores do Estado gera polémica

A mudança na administração do Programa Operacional Competitividade e Inovação (Compete) está a gerar polémica. Vinhas da Silva, o ex-presidente do organismo responsável pelos fundos estruturais do Portugal 2020, já lamentou ter sido informado da decisão do Governo pelos jornais. Agora, o vogal Francisco Sousa Soares acusa o Executivo de fazer um «saneamento político à moda…

Num e-mail enviado aos mais próximos, a que o SOL teve acesso, o gestor conta como evoluiu o processo de saída do Compete. Na semana passada, Vinhas da Silva e Sousa Soares foram afastados e Jaime Andrez foi nomeado como novo presidente. O ex-vogal classifica o processo como «inacreditável».

«Tudo decorreu muito bem nestes 1,5 anos, com muito trabalho, equipas motivadas e com bons resultados… até ao final da semana passada», começa por contar, acrescentando que tudo mudou com um telefonema do ministro da Ciência e do Ensino Superior, Manuel Heitor – que não tem a tutela do programa Compete, que pertence ao Ministério da Economia.

As palavras do governante reproduzidas no e-mail são taxativas: «Incumbiram-me de lhe telefonar para lhe transmitir que estava demitido! Razões não há, até porque fez um trabalho excelente, mas sabe como é: o seu lugar é importante». Francisco Sousa Soares recorda ainda a justificação que lhe foi transmitida: «A Comissão Europeia recomenda que haja rotação de três em três anos». Apesar de ripostar que apenas estava em funções há apenas um ano e meio, «já nada interessava».

Francisco Sousa Soares sublinha ainda que a Resolução do Conselho de Ministros publicada no dia 11 de maio, com a decisão de mudar a gestão do Compete, nunca referia o seu nome. Além disso, essa resolução tinha entrado em vigor antes do telefonema que Manuel Heitor lhe tinha feito. «Quer dizer que fui demitido antes de me terem telefonado!», escreve o gestor afastado.

Sousa Soares diz ter recebido «diversos telefonemas da Comissão Europeia, de ex-governantes e de várias entidades em Portugal (as Confederações Empresariais, diversas Associações Empresariais sectoriais, as CCDR, a Agência de Inovação, a Inspecção Geral de Finanças) mostrando indignação!».

A decisão tomada pelo Governo gerou tanta polémica que o caso pode mesmo chegar aos tribunais. Isto porque o Estatuto do Gestor Público estabelece que, quando a dissolução das equipas de gestão acontece por mera conveniência, pode haver lugar a uma indemnização. Se estiverem há mais de um ano em funções, têm direito a uma compensação.

Mudança partidária ou dinamização dos fundos?

O texto da resolução indica que a principal razão para esta substituição é «garantir que a gestão, acompanhamento e execução deste programa operacional se desenvolve num quadro favorável à prossecução dos objectivos e prioridades vertidas no Acordo de Parceria Portugal 2020, designadamente de estímulo ao crescimento e à criação de emprego, de relançamento da economia e de reforço da capacidade de investimento das empresas portuguesas».

O Governo tem justificado a substituição dos gestores do Programa Compete como uma tentativa de dinamizar a máquina de apoio às empresas. A oposição garante que se trata de uma substituição política por três pessoas próximas do PS.

Apesar de todo o processo ter causado surpresa, há meses que o governo tinha vontade de mudar esta equipa de gestão.

O que Vinhas da Silva não esperava é que soubesse da mudança pelos jornais. O presidente do Compete continuou por isso a comparecer ao serviço. A 12 de maio, o advogado de Vinhas da Silva fez saber que já tinha sido pedida à Presidência do Conselho de Ministros e também ao ministro da Economia, Caldeira Cabral, uma «certidão sobre o hipotético ato de exoneração». Por esta altura, o advogado do ex-presidente fazia ainda saber que o gestor apenas iria abandonar o cargo quando fosse notificado: «Se o fizer antes, podem alegar que há fundamentos para o demitir».

Escolha política

A dança das cadeiras no Compete 2020 não é caso único na administração pública. O fenómeno tende a acompanhar os diferentes ciclos políticos e, com o novo Governo, a regra volta a verificar-se.

Rui Vinhas da Silva liderava aquele que é o maior programa de fundos europeus às empresas desde o final de 2014, altura em que foi escolhido pelo Governo de Pedro Passos Coelho para o lugar.

O antigo primeiro-ministro foi, aliás, um dos primeiros a reagir à substituição e fez questão de questionar publicamente as consequências desta mudança na gestão do Compete 2020. No início da semana, Passos Coelho sublinhou que o Programa Operacional Competitividade e Internacionalização tem vindo a sofrer vicissitudes, nomeadamente no que respeita às equipas de gestão.

«Há uma sistemática substituição: demissão de anteriores responsáveis, nomeação interina de novos responsáveis e não se conhecem bem os fundamentos destas decisões. Quanto mais não fosse, por isso há atrasos que têm vindo a ser introduzidos», começou por criticar, acrescentando que não é normal nomearem outro dirigente «quando o anterior ainda não foi exonerado». E, frisa: «Há qualquer coisa que não joga bem».