Têm sido semanas de polémicas, incompatibilidades e acusações de parte a parte. A batalha entre os colégios privados com contrato de associação e o Governo, travada há cerca de um mês, saltou esta semana para um palco diferente. Depois de se digladiarem na Comunicação Social, o Ministério da Educação e as escolas vão agora enfrentar-se em vários Tribunais Administrativos. Em causa está o despacho publicado no início da semana com a lista dos 39 colégios proibidos de abrir novas turmas em início de ciclos (5.º, 7.º e 10.º).
Segundo o despacho, no próximo ano letivo abrirão 273 turmas em colégios financiadas pelo Estado (no ano que está a terminar são 656).
Até ontem à tarde, já tinham sido entregues oito providências cautelares só nos distritos de Aveiro, Leiria e Coimbra, com o objetivo de suspender a decisão do Governo. A par de Braga, esses são os distritos em que o fim do financiamento de novas turmas afetará mais estabelecimentos. Em Coimbra, há nove colégios nesta situação, três em Leiria e quatro em Aveiro.
Violação dos contratose da lei
Os colégios que já partiram para tribunal – e que, segundo o Movimento de Escolas com Ensino Público Contratualizado (MEPEC), serão dezenas nas próximas semanas – defendem que o despacho do Ministério é ilegal e que os contratos que tinham com o Estado não podem juridicamente cessar desta forma.
Ao SOL, o MEPEC explicou que, nas várias providências cautelares, questiona-se essencialmente a habilitação legal do Ministério da Educação para introduzir novas regras, violações do Código de Procedimento Administrativo e do estatuto do ensino particular e cooperativo, além de incompatibilidades dos regimes estabelecidos pelo despacho e os contratos de associação assinados em 2015, durante o Governo PSD-CDS.
O MEPEC diz que «não foram ouvidas as partes interessadas previamente, nem antes nem depois do despacho»: «O despacho do Ministério dz Educação viola a lei, nomeadamente o princípio da igualdade entre os alunos e o direito dos pais de escolherem e orientarem o processo educativo dos filhos». Além disso, alega-se que «o critério geográfico estabelecido pelo Governo não está previsto na lei».
Invoca-se ainda que o Estado está a violar os contratos que celebrou, pois, na opinião das escolas, estipulam que até ao ano letivo de 2017/2018 os colégios poderiam abrir turmas em início de ciclo, com o financiamento correspondente.
Enquanto os tribunais analisam as ações judiciais e não tomam uma decisão, os colégios continuarão a aceitar matrículas: «Quer por via do estatuto privado e cooperativo, quer por via dos contratos em execução, as escolas são obrigadas a garantir o acesso e a frequência e são obrigadas a renovar as matrículas a todos os alunos que as procurem. Este despacho do Ministério não o permite, por isso há uma incompatibilidade entre os regimes».
Sendo as providências cautelares processos de caráter urgente, é possível que os Tribunais se pronunciem já nas próximas semanas.
O parecer do MP…
O ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, já disse «não estar preocupado» com as ações judiciais. E o parecer do Ministério Público (MP), conhecido ontem ao final da tarde, veio reforçar essa tranquilidade.
Em comunicado, o gabinete do ministro anunciou que foi notificado pela Procuradoria-Geral da República de um parecer do Conselho Consultivo do Ministério Público que lhe dá razão: «Os contratos assinados entre os estabelecimentos de ensino particular e cooperativo e o Estado comportam a totalidade dos ciclos iniciados em 2015/2016, não permitindo a abertura de novas turmas de início de ciclo todos os anos».
Ainda segundo o Ministério, «o parecer reafirma que a celebração de contratos de associação tem de ter em conta as ‘necessidades existentes’ de estabelecimentos públicos de ensino como pressuposto legal da celebração dos mesmos».
… e o relatório do Tribunal de Contas em sentido contrário
Para complicar ainda mais o cenário, ontem o Público divulgou o parecer do Tribunal de Contas aos contratos de associação – que lhe foram submetidos para visto prévio, em 2015 – e em que se afirma um entendimento contrário ao do MP e do atual Governo.
Nomeadamente, os juízes do TCafirmam que os acordos em causa, celebrados entre o Estado e as escolas, são para a «contratualização, por três anos, da constituição de turmas nos primeiros anos dos diferentes ciclos de ensino» e que não dependiam da oferta da rede pública.
O diz-que-disse Marcelo
A par dos processos em tribunal, os movimentos de escolas privadas vão continuar com manifestações e apelos à intervenção dos líderes políticos.
Na quinta-feira, o Presidente da República recebeu os representantes do Movimento Defesa da Escola Ponto, que, à saída, mostraram-se animados com a receção. «O Presidente afirmou que tem de se encontrar uma solução para o problema dos colégios» – contaram em comunicado aos jornalistas, afirmando ainda que Marcelo Rebelo de Sousa prometeu levar o debate até António Costa.
Ontem, o gabinete da Presidência fez questão de vir a público deixar bem claro que essas declarações «são, obviamente, da exclusiva responsabilidade dos representantes das escolas e da interpretação que fazem da conversa com o Presidente da República».
O distanciamento provocou uma resposta dos colégios, que reafirmaram o «relato da reunião com o PR». Ainda assim, acabaram por reconhecer que não tinham combinado com o Presidente que iriam emitir um comunicado.