Não por acaso já é muito ventilada a hipótese de Pedro Passos Coelho ser o próximo candidato presidencial do partido quando se colocar em causa a sucessão de Marcelo Rebelo de Sousa – o que ocorrerá em 2021 ou em 2026. Ora, se o PSD acredita que Passos Coelho será candidato à Presidência da República – significa, por maioria de razão, que já não acredita que o ainda Presidente do partido possa desempenhar novamente as funções de Primeiro-Ministro.
É precisamente neste contexto que surge a entrevista de Nuno Morais Sarmento – a entrevista, neste momento, não é nem analítica, nem politicamente desinteressada. É, isso sim, uma clara afirmação de vontade de disputar a liderança do PSD. Contra quem? Nuno Morais Sarmento afirmou categoricamente que poderá vir a disputar a liderança do partido – nas suas palavras, nada o impede de o fazer – contra alguém que não Passos Coelho. Morais Sarmento, implicitamente, revelou que só será candidato no momento em que Passos Coelho sair de cena. Porquê? Por três razões:
1) Passos Coelho venceu as eleições nas urnas, pese embora, por virtude de uma composição parlamentar maioritária à esquerda da qual resultou um “arranjinho” político insólito, tenha perdido o Governo. Ora, defrontar um Presidente do partido que já desempenhou funções como Primeiro-Ministro e tendo ganho eleições , após uma legislatura marcada por medidas de austeridade – é uma tarefa hercúlea. Demasiada hercúlea, para Nuno Morais Sarmento, Rui Rio ou outro qualquer;
2) Passos Coelho goza de uma respeitabilidade no plano europeu e internacional, como poucas figuras políticas nacionais. Num momento – como o que vivemos – é que as palavras de ordem são “consensos” e “convergência”, colocar em causa o trabalho de um companheiro de partido, ex-Primeiro-Ministro num momento muito delicado da vida nacional, seria contraproducente. Não prejudicaria Passos Coelho, só; não prejudicaria o Governo anterior, só; prejudicaria todo o partido, todo o PSD. E, consequentemente, prejudicaria o novo Presidente do partido;
Nuno Morais defendeu (muitas vezes) as políticas e as opções seguidas por Pedro Passos Coelho, enquanto Primeiro-Ministro. Como poderia agora vir criticar o legado passista, sem cair em contradições absurdas e evidentes? Ou seja: Nuno Morais Sarmento, opondo-se a Passos Coelho, teria uma manifesta dificuldade de discurso.
3) Dito isto – e excluindo a hipótese de disputar a liderança com Passos Coelho -, Nuno Morais Sarmento deixou antever a sua estratégia – e os seus principais adversários. Um facto político da entrevista: pela primeira vez, Morais Sarmento distancia-se de Rui Rio e sinaliza que vai percorrer caminho próprio. Muitos anteviam que Sarmento poderia vir a ser o número dois de Rio – esta entrevista mostra à evidência a implausibilidade de tal cenário. Morais Sarmento corre em posta própria. E até lança a farpa a Rui Rio: Morais Sarmento diz que Rui Rio só poderia vir caso Portugal precisasse de um líder austero, defensor da autoridade e com maior distanciamento em relação aos portugueses. Caso Portugal precisasse de um líder como…Passos Coelho. Isto é: Morais Sarmento colou Rui Rio a Passos Coelho. Rio é um líder do passado, do mesmo passado de Passos Coelho. É um elogio venenoso. Haveria crítica mais letal a Rui Rio do que um elogio com este teor, como lhe fez Nuno Morais Sarmento?
Em segundo lugar, Morais Sarmento afirmou que a liderança do PSD é algo que poderá assumir como dever patriótico – e nunca como concretização de um sonho de infância, como foi e é para Luís Marques Mendes. Com esta frase – aparentemente, sem sentido e ainda menos contexto -, Nuno Morais Sarmento aproveitou para espicaçar Marques Mendes, dizendo que para este último a liderança do partido é um sonho puramente pessoal. Uma ambição de carreira… Conclusão: Nuno Morais Sarmento está convencido que o seu adversário (pelo menos, o seu adversário mais temível) será Luís Marques Mendes.
Em terceiro lugar, Nuno Morais Sarmento aproveitou para excluir da corrida à liderança do PSD os passistas, como Maria Luís Albuquerque e Luís Montenegro. Até se referindo a estes militantes sociais-democratas (o segundo até é actualmente líder da bancada parlamentar) em termos desagradáveis: Morais Sarmento desvaloriza-os, asseverando que só nasceram agora para a política. Que não conhece o seu percurso – leia-se, tiveram um percurso político insignificante quando comparado ao seu. Ao ignorar, ao desvalorizar – Morais Sarmento está naturalmente a condicionar o espaço político dos herdeiros naturais do passismo.
Uma última nota deveras curiosa: quando confrontado com a hipótese de os “jovens turcos” José Eduardo Martins e Pedro Duarte avançarem para a liderança, Nuno Morais Sarmento foi muito cordial e simpático. Estes sim! Têm talento para liderar o partido – declarou subtilmente Sarmento. O que concluir? Fácil: a estratégia de Nuno Morais passa por incluir na sua equipa estas “jovens promessas” para, por um lado, impedir que dividam os militantes sociais-democratas por várias candidaturas; por outro, para que ele (Morais Sarmento) possa emergir como o líder da unidade, do consenso. Enfim, o homem agregador das várias tendências não passistas do PSD – que alia a experiência com a renovação, visando o futuro do partido… No fundo, Morais Sarmento quer ser o Fernando Santos do PSD…
Já não há dúvidas: Nuno Morais Sarmento já deu o pontapé de saída para a sucessão de Passos Coelho no PSD. Como reagirá Passos Coelho? Qual será o impacto concreto desta entrevista, que é mais uma declaração de pré-candidatura, no partido? E qual será estratégia real de Luís Marques Mendes? No meio de tantas dúvidas, uma certeza: este ambiente não é positivo nem para Passos Coelho, nem para o PSD…