Afinal, os exames não tornaram a escola ‘seletiva’

Mais uma vez, a realidade encarrega-se de desmentir os argumentos que serviram de base às opções do Governo em matéria educativa

Passaram quase despercebidas esta semana as (boas) estatísticas da Educação que dão conta de uma queda, pelo segundo ano consecutivo, do número de alunos que reprovam.

Em 2014/15, chumbaram cerca de 115 mil alunos, contra os 152 mil do ano letivo anterior, fixando a taxa de reprovação em 9,7% (contra 11,8% em 2013/14 e 12,3% em 2012/13). Indo ao pormenor e analisando os números por ano de escolaridade, em particular os de final de ciclo que até agora tinham exames a Português e Matemática, constata-se que a taxa de reprovação do 6.º ano caiu para metade (de 14,6% em 2013/14, para 8,7% e, 2014/15) e o mesmo aconteceu no 4.º ano (de 4,3% para 2,5%). No 9.º ano, os chumbos caíram de 17,8% para 10,8%.

Mais uma vez, portanto, a realidade encarrega-se de desmentir os argumentos que serviram de base às opções do Governo em matéria educativa. E mostra como, em vez de primeiro se estudar e refletir para depois se tomarem medidas, a política educativa é decidida ao sabor da ideologia de cada um e com pouca sustentação científica e académica.

Em janeiro, recorde-se, o Ministério da Educação anunciou uma profunda mudança na avaliação dos alunos do Ensino Básico. Acabou, então, com os exames de Português e Matemática nos 4.º e 6.º anos, introduzindo provas de aferição (testes nacionais apenas para aferir o cumprimento de metas curriculares) nessas e noutras disciplinas dos 2.º, 5.º e 8.º anos.

Explicou, então, o ministro Tiago Brandão Rodrigues que o objetivo do Governo é uma «escola inclusiva» e não uma «escola seletiva», de exames. E isto apesar de já então se saber, por estudos do Conselho Nacional da Educação, que era residual (0,4% a 1,9%) o número de alunos que chumbavam por causa dos exames entretanto abolidos. 
Os especialistas dizem que o número de reprovações ainda tem de cair mais, salientando que a taxa global de reprovação mais baixa que já tivemos, em 2010/11, foi de 7,5% e que uma percentagem muito elevada de alunos com sete anos reprova (10%).

Mais curiosa foi a reação do Governo em relação à diminuição das reprovações: o secretário de Estado da Educação, João Costa, veio dizer que «o que nos interessa é ter um foco muito grande na melhoria das aprendizagens e não na melhoria dos números». Certo. O que ainda ninguém descobriu é uma forma de aferir a assimilação e aplicação de conhecimentos por parte dos alunos, e o consequente êxito ou não das políticas educativas, sem números. Que o digam as grandes empresas: que se saiba, as que têm debaixo de olho os melhores alunos das universidades, não escolhem os que reprovam nem os que têm as médias mais baixas.