O franco-tunisino que avançou com um camião sobre a multidão que celebrava o dia nacional da França na Promenade des Anglais, em Nice, não só tinha estudado a área pelo menos duas vezes em dias anteriores, como um quarto de hora antes do ataque enviou um SMS a um cúmplice a pedir-lhe mais armas. Já não restam dúvidas de que Mohamed Lahouaiej-Bouhlel, além de um eventual desequilíbrio mental, teve toda a intenção de provocar o terror, e entretanto o auto-proclamado Estado Islâmico já veio dizer que ele era um dos seus “soldados”.
Entretanto, o irmão do terrorista disse à Reuters que horas antes do ataque este tinha ligado para casa e enviou uma fotografia a rir-se a partir da cidade francesa. “Ele disse que estava em Nice com os seus amigos europeus para celebrar o feriado nacional”, disse Jabeur Lahouaiej-Bouhlel. Na fotografia, “parecia bastante feliz e alegre, estava com um grande sorriso”.
A investida com o camião provocou a morte a 84 pessoas, e durante uma visita ontem a Nice a ministra da Saúde, Marisol Touraine, informou que 18 pessoas, incluindo uma criança, permaneciam em estado crítico, com um total de 85 feridos ainda hospitalizados na sequência do atentado.
“Traz mais armas; traz 5 a C” foi a mensagem que o autor do atentado enviou às 22h27 (locais), e segundo fontes da investigação confirmaram ao “El País” o C. refere-se a Choukri, um amigo de Lahouaiej-Bouhlel que se encontra detido desde a manhã de sábado. O telemóvel de onde saiu esta e outras mensagens relacionadas com armas foi encontrado na cabine do camião depois dos agentes de segurança terem abatido a tiro o terrorista, que morreu sobre o banco do passageiro depois de ter tentado disparar vários tiros sem acertar qualquer deles.
Choukri é alegadamente um dos amigos mais próximos do homem de 31 anos que vivia há quatro em Nice. Os dois faziam parte de um grupo que se reunia para cometer pequenos delitos. Além de Choukri, outros quatro membros desse grupo terão sido detidos por uma unidade especial anti-terrorista. Foi um deles que informou a polícia de nas últimas semanas Lahouaiej-Bouhlel se tinha radicalizado.
Entretanto, as autoridades francesas detiveram ontem mais dois suspeitos – um homem e uma mulher que seriam também próximos do terrorista.
Das centenas de testemunhas ouvidas várias confirmaram que o homem se deslocou ao local na véspera e antevéspera conduzindo o mesmo camião com que viria a colher as dezenas de pessoas, durante dois quilómetros, às vezes aos ziguezagues, que assistiam ao fogo-de-artifício para celebrar o dia de França. Outro traço que emergiu do perfil do terrorista é que além do súbito fervor religioso que o acometeu, o homem tinha já dado sinais de algumdesequilíbrio mental.
Lahouaiej-Bouhlel fumava e bebia, comia porco, não se sabe que tenha alguma vez posto sequer os pés dentro de uma mesquita, e no entanto ter-se-á radicalizado de um dia para o outro. A irmã, a partir da Tunísia, disse à Reuters que já tinha um longo historial de problemas psicológicos, com os primeiros episódios a recuarem a 2005, quando deixou o país e rumou a França.
Para o primeiro-ministro francês. Manuel Valls, está na hora de o país se habituar à ideia de que os atentados terroristas irão continuar a ocorrer. “O terrorismo faz parte das nossas vidas”, disse ao “Journal du Dimanche”, e é preciso estar-se consciente de que “outras vidas serão ceifadas”.