A Comissão Europeia pretende obrigar empresas norte-americanas como o WhatsApp e o Skype a cumprirem disposições de segurança e confidencialidade. As propostas vão ser apresentadas em setembro e pretende-se que estas empresas passem por um controlo mais apertado. No entanto, a tarefa não vai ser fácil e o tema promete dar muita polémica.
Com cada vez mais utilizadores em todo o mundo, estas aplicações têm levantado problemas a vários níveis. Uma das questões mais sérias prende-se com o facto de vir a tornar-se assim mais complicado aceder ao conteúdo das comunicações feitas, no âmbito de uma investigação criminal ou de prevenção do terrorismo.
Ao i, António Ventinhas, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, explica que “o grande problemas destas aplicações é que o acesso à informação é muito difícil, devido aos problemas técnicos para obter a interceção”. E, acrescenta: “Anteriormente, todos os pedidos de interceção eram feitos às operadoras nacionais, mas agora tem de se ter em conta que é mais difícil porque estas aplicações são internacionais. Os pedidos têm, por isso, de ser feitos através de meios mais complexos, que muitas vezes não têm resultado”.
Como já tinha sido salientado a propósito do bloqueio que aconteceu no Brasil (ver texto ao lado), esta dificuldade acrescida nas investigações tem feito com que algumas aplicações sejam procuradas cada vez mais por traficantes de droga, em esquemas de corrupção ou até ao nível de organização de ataques terroristas.
Contactado pelo i, um advogado especializado nesta área explica que se trata de uma situação que não promete ser de rápida resolução: “É um problema sério. Todos sabem que são sistemas que dificultam o acesso à informação. As chamadas e as mensagens são encriptadas. Ou seja, antes era a voz que seguia nas escutas, agora não. A informação é codificada. E, como é óbvio, isto é uma situação muito perigosa”.
Operadoras perdem terreno
Outro problema levantado pelo aumento de utilizadores deste tipo de sistemas é o facto de as operadoras tradicionais estarem a perder terreno.
No início deste ano, mais de metade dos portugueses admitiam fazer chamadas e enviar sms pela internet.
Segundo um estudo da Comissão Europeia, a popularidade dos smartphones veio mudar de vez o dia a dia de milhões de pessoas – sendo que o acesso à internet foi uma das principais transformações originadas pela forte presença dos smartphones no dia a dia dos portugueses, incluindo nos hábitos de envio de mensagens e de chamadas telefónicas. No seguimento desta mudança de paradigma, começaram a somar-se aplicações que possibilitam fazer chamadas e enviar sms online – os conhecidos serviços over-the-top (OTT).
No início de 2015, a percentagem de portugueses que realizaram chamadas de voz ou vídeos pela internet foi de 37%. Mas no final do ano, este número já era muito superior: 49% dos utilizadores de internet realizavam chamadas de voz por este meio.
O estudo da Comissão Europeia mostrava ainda que, considerando só o envio de sms online, estes números disparam: 71% dos utilizadores de internet optavam por esta via.
A verdade é que o aumento da utilização deste tipo de aplicações tem causado uma perda de receitas por parte das operadoras de telecomunicações, que também se queixam de ter regras que não são aplicadas a estas OTT.
Para o advogado ouvido pelo i, “as operadoras tradicionais apostaram muito em serviços, mas ignoraram o que já se sabia: comunicar por voz ia acabar por ser gratuito. Enquanto tinham a rede, controlavam o consumidor, mas agora já não é assim”. Sendo que “as operadoras estão a ser esmagadas porque hoje em dia as chamadas internacionais já não custam o que custavam e é preciso ter em conta que há casos em que a própria qualidade da rede tradicional não justifica que as comunicações sejam feitas desta forma. Para África, por exemplo, não dá para falar pelas linhas tradicionais”.
A verdade é que as operadoras se têm mostrado cada vez mais preocupadas. Um dos problemas mais recentes aconteceu quando a Comissão Europeia anunciou que pretende acabar com as tarifas de roaming. As operadoras nacionais, por exemplo, rapidamente se uniram para alertar sobre o impacto negativo que esta medida pode vir a ter no setor.