Analisar a execução orçamental até julho é algo semelhante a encarar um copo com água pela metade. O diagnóstico sobre se está meio cheio ou meio vazio depende mais de quem olha e, no caso das contas públicas, há argumentos para os dois lados.
A Direção-Geral do Orçamento revelou ontem que o défice da administração pública ficou em 4980,6 milhões de euros até julho.
Os mais otimistas, que pensam que o copo está meio cheio, sublinham que é um valor inferior em 542,8 milhões de euros ao registado em igual período de 2015, sustentado pela melhoria no mercado de trabalho – que traz mais contribuições para a Segurança Social e menos subsídios de desemprego – e pela subida dos impostos indiretos decidida no Orçamento do Estado – a tributação do tabaco, dos combustíveis e dos automóveis foi usada para compensar a reversão de cortes nos rendimentos do anterior governo.
Entre os otimistas está, claro, o Ministério das Finanças: “A melhoria do défice mantém a evolução favorável observada desde o início do ano, excedendo mesmo o valor previsto no Orçamento do Estado de 2016”, indica um comunicado.
Os pessimistas do copo meio vazio alertam que, na realidade, o défice aumentou de forma acentuada face a junho, com a receita a subir menos do que antevia o mesmo Orçamento do Estado para 2016 – e abaixo do que se verificava no mês anterior.
Entre os pessimistas está, claro, a oposição. Duarte Pacheco, do PSD, acusa a esquerda de estar numa “falsa euforia” e a mascarar a “estagnação” económica: “Como a receita está abaixo do previsto, o governo só tem uma forma de esconder o seu mau desempenho: é fazer com que a despesa pareça ser menor. Não se faz investimento e não se paga.”
Incerteza O problema é que ambos os lados têm argumentos. O saldo orçamental é a diferença entre receitas e despesas e há muitos sinais contrários. De uma forma simples, a despesa está a ajudar a reduzir o défice, a receita está a prejudicá-lo.
Na despesa, as melhorias no mercado de trabalho estão a ter um papel essencial. A receita contributiva aumentou 4,3%, principalmente pelo crescimento das contribuições e quotizações para a Segurança Social, “refletindo a evolução favorável do mercado de trabalho”.
Já a evolução contida da despesa resultou de menos subsídios à formação profissional e menos encargos com aquisições de bens e serviços, bem como com prestações de desemprego. A contenção nestas rubricas compensaram o acréscimo de encargos com juros da dívida do Estado e com as reversões dos cortes salariais.
O desemprego caiu para 10,8% no segundo trimestre e, pela primeira vez em sete anos, os desempregados inscritos nos centros de emprego baixaram a fasquia dos 500 mil. E com esta tendência, as poupanças com o subsídio de desemprego são assinaláveis.
O OE2016 previa que as despesas com prestações de desemprego descessem 8,6%, mas o ritmo de queda é de quase 15%. Nos primeiros sete meses do ano, o Estado gastou menos 160 milhões do que no ano anterior.
Assim, diz a DGO, os excedentes da Segurança Social são um dos fatores que mais estão a contribuir para a melhoria do saldo orçamental, além dos excedentes da administração regional e local. A administração central propriamente dita teve um contributo reduzido na diminuição do défice.
Meta revista Os principais sinais de preocupação estão, de facto, do lado dos impostos – a estagnação da atividade económica nos últimos trimestres tem impacto negativo na quantidade de impostos conseguida com as trocas entre agentes económicos. A receita fiscal até julho cresceu apenas 1,9%, abaixo do que estipulava o OE2016 (3,1%).
Apesar de tudo, o OE2016 foi feito tendo por objetivo atingir um défice de 2,2%, quando Bruxelas já flexibilizou essa meta. Em julho, quando decidiu não aplicar sanções a Portugal por défice excessivo, o Conselho de Ministros das Finanças da UE (ECOFIN) propôs que a redução do défice orçamental fosse para 2,5% do produto interno bruto (PIB) em 2016.