Luís Marinho, que foi administrador da RTP e diretor de informação da televisão pública, despediu-se ontem da empresa com uma carta aos colegas de trabalho cheia de críticas contra a administração, direcção de informação e conselho consultivo.
“Não era esta a forma nem era nesta altura que esperava abandonar a empresa a que me dediquei nos últimos 15 anos. Mas, a nova governação inventada pelo ministro Maduro, cumprindo a missão que lhe tinha sido cometida, ao demitir o anterior Conselho de Administração e nomeando o atual, criou todas as condições para abreviar a minha estadia na RTP”.
Marinho escreve que “depois de ser afastado das funções que exercia” recebeu “ao longo dos últimos meses, recados mais ou menos discretos no sentido de se criarem ‘condições extraordinárias’, caso encarasse a hipótese de sair da empresa”. “A vontade do Conselho de Administração acabou por se concretizar, ao aceitar as ‘condições extraordinárias’ que propus”.
Na carta que escreveu aos trabalhadores da RTP, Luís Marinho diz que “do ponto de vista organizativo, a RTP é hoje uma empresa dos anos 80 do século passado, com direcções para todos os gostos, a que se juntam ainda mais directores disfarçados de consultores. Voltámos ao tempo das ‘capelinhas’, num evidente objectivo de ‘dividir para reinar’.
Sobre a televisão, Marinho faz o seu balanço: “No caso concreto do canal 1, se excluirmos a ‘pesada herança’ de anteriores direcções – o ‘famigerado’ futebol e o grande entretenimento com formatos estrangeiros – o que prende a atenção dos públicos? Sim, falo de audiências”.
A conclusão do ex-administrador e ex-diretor é que “a RTP caminha a passos largos para a total irrelevância, em nome de uma suposta qualidade que talvez alguns amigos consigam vislumbrar”. Marinho lembra um artigo de Martin Wolf no Financial Times em que, sobre a BBC, o jornalista afirmava: “O operador de serviço público é propriedade do povo e não de uma elite”. O ex-diretor diz que o recado de Wolf “aplica-se perfeitamente” aos “atuais governantes da RTP”.
“Incapazes de desenvolver a fórmula de outro dirigente da BBC – ‘fazer com que o bom seja popular e o popular seja bom’ – os responsáveis da programação de televisão oscilam entre a produção de séries para minorias, em prime-time, e a de indigentes programas de daytime, de que o exemplo mais recente é o denominado “Praias olímpicas”, escreve Marinho, que diz perceber bem “a razão do afastamento de profissionais experientes e competentes, pela sua incapacidade de cometer semelhantes atentados ao bom gosto e à inteligência dos espectadores”.
Luís Marinho diz sair da RTP com “a consciência tranquila”: “Dediquei-me totalmente à empresa e, perdoem-me a imodéstia, coordenei equipas que estão associadas, quer na rádio, quer na televisão, a um período de grande sucesso. A um período em que o público preferiu claramente a RTP”. Lembra que sempre defendeu a RTP contra quem a atacava. “Alguns deles, curiosamente, são agora pagos para fazer ‘comentários’ na mesma empresa que queriam ver encerrada. No caso deles, trata-se de um incurável problema de coluna vertebral. Já no que respeita a quem os contratou, para não ir mais longe, só posso justificar tal atitude com uma grave crise de amnésia. Todo este desvario é caucionado por um Conselho Geral …. Inexistente”. A.S.L.