As rendas vão ficar congeladas por mais cinco anos. Uma medida que não está a agradar aos proprietários que acusam o Governo de «matar o mercado de arrendamento» e de estar «a fugir às suas obrigações e a passá-las para os privados».
A fase transitória de proteção dos inquilinos contra o aumento das rendas terminava em 2017, mas o prazo será alargado por mais cinco anos, após um acordo entre o Partido Socialista e o Bloco de Esquerda, onde está prevista a revisão do Novo Regime de Arrendamento Urbano (NRAU), que o Governo anterior tinha alterado. Este regime aplica-se apenas aos inquilinos com mais de 65 anos, com um grau de incapacidade superior a 60% ou com lojas com interesse histórico e cultural.
O deputado do Bloco de Esquerda (BE), Pedro Soares, já veio justificar esta medida. «Atendendo à premência e gravidade de algumas das situações foi reconhecido que é importante desde já, e a curto prazo, prolongar o período transitório de cinco para dez anos previsto no NRAU», anunciou.
Um argumento que não parece convencer o presidente da Associação Lisbonense de Proprietários (ALP). Para Menezes Leitão, «estas perspetivas vão matar o mercado de arrendamento e impedir que o mercado floresça». E as acusações não ficam por aqui. O responsável diz também que se está a querer prejudicar quem tem propriedade porque os senhorios «estão sujeitos a rendas congeladas e simbólicas há décadas» e, por isso, «não recebem rendimentos dos imóveis, que assim se degradam por falta de dinheiro para fazer obras».
Também a Associação Nacional de Proprietários lembra que «há muitos senhorios a pagar mais IMI do que o que recebem de rendas».
Senhorio social
Mas as alterações do Governo não ficam por aqui. Ao mesmo tempo, o Executivo pretende criar o estatuto de senhorio de cariz social. Nesta lógica, seriam atribuídos benefícios aos proprietários que arrendem os seus imóveis por valores limitados às famílias de classe média e baixa e que poderá passar por medidas como benefícios fiscais e seguros de renda.
«O que queremos criar é todo um quadro de incentivos legislativos para que os privados possam aderir a este estatuto de senhorio de cariz social e, em troca disso, pratiquem rendas com valores limite, de forma a poderem ser suportadas pelo tal segmento das famílias de classe média e média baixa», explicou o secretário de Estado Adjunto e do Ambiente, José Mendes.
Mais uma medida que gerou descontentamento junto dos senhorios. Menezes Leitão classifica esta ideia de «absurda» e diz que se trata de uma conceção ideológica do Governo e dos partidos que o apoiam e que «não percebem que este é um negócio entre privados e querem que os senhorios façam o papel da segurança social», salienta.
Já para o presidente da Associação Nacional de Proprietários, António Frias Marques, a solução é seguir o caminho que está previsto na legislação que é a do subsídio de renda. Um modelo que, no entender do mesmo, já é usado por outros países europeus.
De acordo com o responsável, o seguro de renda seria atribuído ao inquilino e o seu valor seria calculado através da diferença entre o que este poderia pagar, em função dos seus rendimentos, e a renda justa.
«Não estamos a falar de rendas especulativas, estamos a falar de uma renda de 6,7% sobre o valor patrimonial do tributário, que é atribuído ao imóvel pelas finanças. São rendas que continuam a ser baixas», explicou.
Uma ideia que não convence a Associação Portuguesa de Promotores e Investidores Imobiliários (APPII), ao considerar que estamos perante «um verdadeiro ataque à propriedade e, mais grave que isso, ao setor imobiliário» e acusa o Executivo de estar a «destruir» mecanismos que foram criados nos últimos anos para dinamizar o arrendamento e a reabilitação urbana.
Balcão de arrendamento
Outra medida em marcha é o fim do Balcão Nacional do Arrendamento (BNA). Uma medida, de resto, que mereceu o consenso entre o Governo, PS e BE. O deputado bloquista Pedro Soares chega mesmo a afirmar que «o mercado de arrendamento não precisa de despejos, precisa é de ser promovido, ter agilidade e flexibilidade suficiente no sentido de poder, por um lado, garantir diretos aos senhorios, mas também aos inquilinos», salientou.
A verdade é que este balcão foi criado, em janeiro de 2013, com a promessa de ser uma «via verde» do despejo. Nos primeiros três anos de funcionamento deram entrada 12.612 pedidos de despejo – 6.715 foram recusados e 4.735 foram emitidos títulos de desocupação.
A ideia era receber os casos considerados mais simples, pois na base da criação deste serviço estaria a necessidade de retirar dos tribunais os casos de tal forma óbvios que não necessitassem de recorrer a um juiz. Para usar este mecanismo, o contrato deveria estar registado nas Finanças e o proprietário teria de ter os seus impostos em dia.
O BNA também era uma opção para os senhorios cujos contratos chegassem ao fim por revogação, oposição à renovação ou caducidade ou que necessitassem do imóvel arrendado para habitação própria ou dos seus descendentes, caso o inquilino se recusasse a sair.
O secretário-geral da APPII, Hugo Santos Ferreira, já veio alertar que o fim deste balcão poderá arrastar os processos, provocando um elevado prejuízo para as cidades portuguesas, que vão ter os prédios a degradarem-se cada vez mais.
«O BNA foi criado para obviar a um dos principais problemas em Portugal: a morosidade da nossa justiça, que tanto prejudica senhorios como inquilinos», referiu. Além destas alterações, estão também em discussão as situações de despejo devido a obras profundas, a definição do conceito de obra profunda, o reencaminhamento dos moradores em iminência de despejo para atendimento de proximidade e a criação do fundo de arrendamento ou seguro de renda para proteger os senhorios contra o risco de incumprimento.