No meio do fogo, como se safam os animais?

O verão foi de incêndios em todo o país e nem o setembro trouxe tréguas a quem os combate. As histórias de tragédia multiplicam-se, acompanhados, felizmente, por relatos de salvamentos heróicos. Pelo meio,há tempo para um balanço. Além do impacto nas pessoas, de que forma os incêndios atingem os animais?

Os incêndios em Portugal foram tão impressionantes quanto o foram também as respostas solidárias. Às imagens de campos queimados, passadiços destruídos e casas em ruínas, juntavam-se, quase como uma onda viral, fotografias de quartéis de bombeiros cheios de mantimentos e salvamentos dignos de filme de fição. Curiosamente, algumas das imagens que ficaram na memória de quem as partilhou vezes sem fim nas redes sociais envolviam o resgate de animais e até mesmo a onda solidária não deixou de lado o contributo a dar para a preservação de espécies e reconstrução de abrigos.

Mesmo com o verão ainda a duas semanas de acabar, os números já divulgados permitem dizer com segurança que este foi um dos anos mais devastadores no que a incêndios diz respeito. Daí que Luís Montenegro se mostre surpreendido por não estarmos perante uma calamidade maior quanto ao impacto que o fogo teve nos animais. O médico veterinário acredita que Portugal tem atualmente uma “sociedade mais amadurecida” no que diz respeito aos animais.

Foto mostra um grupo de bombeiros de Valbom a assistir um cão durante um incêndio em Gondomar

“Os animais de companhia passaram a ser considerados membros da família e, como tal, fazem parte do resgate prioritário”, explica. Com a experiência da clínica onde trabalha, o profissional garante que se tem vindo a assistir a um interesse sempre crescente por parte dos bombeiros sobre este tipo de salvamento. “Querem saber o que fazer com cada animal e estão preocupados em dar bem estar aos animais, à semelhança do que fazem já com as pessoas”, acrescenta. 

Saber o que fazer 
É do norte que vem o exemplo no tipo de tratamento especial dado a animais nos resgates. Os Bombeiros Voluntários de Matosinhos-Leça são a primeira corporação do país a ter um kit exclusivo para animais, que permite fornecer oxigénio em caso de incêndio ou acidente.

Luís Montenegro considera este tipo de serviço essencial, mas admite que há pequenos gestos que fazem a diferença e devem ser imediatos. “Há que controlar a temperatura e, para isso, levar o animal para um espaço ao ar livre, cobrindo-o com mantas de agua fria”. Além disso, é essencial hidratar com água fresca. 

Depois deste tratamento básico, é aconselhável que seja visto por um profissional. “A informação é simples mas essencial para que saibamos como salvar a vida a um animal”, considera o responsável, que até já reuniu as dicas numa espécie de livro de consulta fácil para quem quer aperfeiçoar a técnica. “Temos tido imensos bombeiros a procurar essa informação, nota-se que cada vez mais o animal é tido como uma prioridade”, conclui.

Cada animal, sua fuga 
Os animais contam com o instituto natural de salvamento, mas nem nem sempre é suficiente, principalmente quando se trata do comportamento de animais domésticos. “Não estão habituados a situações de perigo, vão assustar-se e o mais certo é acabarem encurralados”, refere o veterinário. Neste caso, o melhor mesmo é que o animal seja salvo em simultâneo com a família de acolhimento, cenário cada vez mais comum nas histórias de resgates.

Já quando se fala em animais de criação e numa situação de perigo iminente, o ideal é soltá-los, dando-lhes uma oportunidade de fuga. Neste caso, e à semelhança do que acontece com os animais selvagens, o trabalho a ser feito incide mais no pós-incêndio. “Com a perda de habitat natural, os animais ficam vulneráveis. Nesta fase é essencial providenciar água potável e alimento”, salienta. 

O profissional lembra o caso de Arouca, onde arderam 170 quilómetros quadrados de terreno florestal e agrícola, destruindo 98% da área de pastoreio disponível. Esses estragos afetaram 57 proprietários pecuários, que ficaram sem alimentação natural para 349 cabeças de gado de raça arouquesa e ainda 836 pequenos ruminantes de raça ovina e caprina. Segundo as contas da autarquia, seriam precisos 430 mil euros para alimentar os animais afetados pelo fogo.