Em dez anos, Lisboa mudou completamente, ao ponto de quase nos sentirmos estranhos na nossa cidade. Não é que seja contra a mudança, bem pelo contrário, mas há sítios emblemáticos que se tornaram quase impossíveis de visitar.
Os turistas, incentivados por programas estrangeiros de gastronomia ou de revistas de viagens, fazem-se com tanta vontade a restaurantes, museus e cafés que os enchem por completo, tornando a vida dos locais um pequeno “inferno”.
Quem antigamente ia, por exemplo, à Cervejaria Ramiro, sabia que se chegasse às 20 horas conseguia uma mesa tranquilamente. Agora, as filas que se vão estendendo pela Avenida Almirante Reis começam por volta das 18 horas. Digamos que a cidade, à semelhança do Porto, se tornou um enorme postal ilustrado onde os habitantes locais não passam de estátuas. Repito, nada contra. Mas é óbvio que quem detesta filas ficou com a vida mais complicada – os turistas têm todo o tempo do mundo para perder enquanto esperam por entrar.
É certo que a maioria dos portugueses é adepta de multidões e adora perder tempo nas férias, escolhendo os mesmos locais no mesmo período. Já para não falar nos enormes centros comerciais que estão, muitas vezes, cheios, facto que não incomoda os utentes.
Para os lisboetas mais sensíveis às filas, também as obras ajudam à festa. Para chegar ao trabalho ou a qualquer outro lugar é preciso uma paciência de Job. Apesar disso, excetuando as obras, Lisboa e Porto estão com muito mais vida e os forasteiros dão outra riqueza às cidades.
Hoje há discotecas onde os turistas procuram viver a noite como se o dia não nascesse e se comportam como se fossem estrelas cadentes. Há museus cheios, há bairros que ganharam vida, já que estavam verdadeiramente adormecidos. Tudo isso gera riqueza e dá trabalho a muita gente.
O lado negro disto tudo é que os locais estão a ficar com a vida muito mais cara, já que a habitação disparou – até por causa do arrendamento para os turistas – e um simples café já pode custar dois euros na Baixa. É a vida. Antes isso a ser um deserto habitado apenas pelos lusitanos. Que, como é sabido, não se sabem governar nem gostam de ser governados.