Todos os os contribuintes que ainda pagavam sobretaxa de IRS este ano vão ser beneficiados pela retirada gradual deste adicional do imposto sobre os rendimentos criado ainda por Teixeira dos Santos, ministro das Finanças de José Sócrates.
Estes ganhos beneficiam todos os contribuintes com rendimentos superiores a 750 euros. E de acordo com as simulações feitas pelas consultoras a realidade é esta: a partir deste patamar todos os trabalhadores vão sentir na sua carteira os efeitos do fim da sobretaxa.
Mas vamos a contas. Por exemplo um solteiro, com um rendimento mensal de 800 euros vai ganhar no final do ano 7 euros e 84 cêntimos.
No entanto, como a eliminação da sobretaxa vai ser feita de forma faseada até novembro, quem mais ganha também vai beneficiar mais. E a explicação para este facto é simples: é porque também paga mais.
No caso dos contribuintes casados também é preciso fazer contas. Por normal, a tributação conjunta é a mais vantajosa e poderão ser ainda mais beneficiados se tiverem filhos. Por exemplo, um casal, em que cada um dos membros ganha mil euros, vai recuperar no final do ano 38,70 euros. Se ganharem o dobro, os ganhos da retirada da sobretaxa sobem para 329,72 euros porque este casal fazia parte do grupo sujeito a uma taxa mais elevada.
Isto significa que os valores sobem de forma significativa para os rendimentos mais elevados. Já um casal com dois filhos, em que cada um ganhe 2500 euros, vai recuperar no final do ano mais de 400 euros. Se ganharem o dobro, a eliminação da sobretaxa vai trazer mais de 900 euros de rendimento anual.
Impacto nos cofres A descida da sobretaxa de IRS vai custar 200 milhões de euros ao Estado, ainda assim menos do que os 400 milhões de euros que custaria a sua eliminação no início do ano.
No entanto, esta medida poderá ser encarada como a grande promessa falhada do Orçamento do Estado para 2017, uma vez que o fim da sobretaxa logo em janeiro estava consagrada na lei, conforme lembraram insistentemente responsáveis do Bloco de Esquerda e do PCP.
A verdade é que António Costa já tinha deixado o aviso de que o país tinha de fazer escolhas e, entre a pressão para aumentar as pensões e outras medidas do lado dos custos, houve que encontrar almofadas do lado da receita e a eliminação gradual da sobretaxa, com um ritmo diferenciado em função de rendimentos, foi uma das respostas encontradas pelo Executivo para resolver o problema.
Como vai funcionar Nos primeiros nove meses do próximo ano, a sobretaxa será cobrada mas com um desconto nas tabelas de retenção face ao que está em vigor este ano. De fora ficam apenas os rendimentos do primeiro escalão que este ano já não pagaram. Mas é de referir que os escalões do IRS para o próximo ano vão sofrer uma atualização da ordem dos 0,8%.
A partir de 1 de abril, os rendimentos do segundo escalão do IRS — entre 7.091 e 20.261 euros anuais — vão sentir o alívio: deixam de pagar a sobretaxa. Até março continuarão a descontar como este ano, depois deixam de o fazer, o que significa que pagarão, em termos anualizados 0,25% de sobretaxa, contra 1% que pagam este ano.
A partir de julho será a vez dos contribuintes do terceiro escalão — rendimentos entre os 20.261 e os 40.522 euros anuais, a livrarem-se dos descontos para a sobretaxa que ainda vão pagar na primeira metade do ano. A sobretaxa aplicável a este escalão será, no conjunto de 2017, de 0,88% — hoje é de 1,75%.
A 1 de outubro, o quarto escalão — rendimentos entre 40.522 e 80.640 euros anuais — deixa de descontar para a sobretaxa, que lhes será cobrada ao valor de 2,25%, contra os 3% que estão a ser liquidados em 3016.
Só a 1 de dezembro de 2017 é que os contribuintes do escalão mais alto — superior a 80.640 euros — e que trabalham por conta de outrem deixam de descontar para a sobretaxa. Em 2017 pagarão de sobretaxa 3,21%, um valor que compara com os 3,5% atualmente cobrados.
No entanto, a liquidação final da sobretaxa referente ao imposto relativo ao próximo ano, só será feita em 2018, quando for entregue a declaração de rendimentos.
Reações Se do lado do PS houve alguma tranquilidade em relação à implementação desta medida, com João Galamba a lembrar que “o PS sempre disse que a sobretaxa acabaria em dois anos. Foi o compromisso eleitoral que estabelecemos e é o que estamos a fazer”. Do lado dos partidos que apoiam o governo a conversa é diferente. O PCP insistiu na ideia de que este é o orçamento possível tendo em conta as “limitações e constrangimentos” exteriores, nomeadamente as “impostas pela União Europeia”, deixando a garantia de que os comunistas vão continuar a colaborar com o governo “no sentido de procurar aprofundar a resposta positiva que este Orçamento pode conter para os trabalhadores portugueses”. Já o BE diz que não concorda com a solução encontrada para a redução da sobretaxa. O Bloco preferia a “eliminação da sobretaxa em janeiro de 2017” para todos os trabalhadores.
Já para a oposição as críticas não se fizeram esperar, elegendo o fim da sobretaxa como a “grande farsa”.
“Com este Orçamento todos os rendimentos dos portugueses pagos do primeiro ao último dia de 2017 estão sujeitos a sobretaxa. Mas o governo preferiu enganar os portugueses, usando um truque que lhes sai caro: vão parando as retenções na fonte, os adiantamentos de impostos, criando a ilusão nas pessoas que a sobretaxa acabou. Mas a sobretaxa vai continuar a ser aplicada e no ano seguinte as pessoas vão pagá-la de uma só vez”, revelou o deputado social-democrata António Leitão Amaro. Já a líder do CDS, Assunção Cristas, diz que o governo “abriu a caça ao contribuinte, porque todos os impostos ou foram mexidos ou foram agravados ou foram criados novos impostos”.