O acordo entre o Governo e o Bloco de Esquerda para aumentar o combate à precariedade no trabalho só visa as empresas privadas e deixa de fora os trabalhadores da Administração Pública, uma vez que não é do âmbito da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) realizar inspeções à Administração Pública.
Este entendimento, concretizado no âmbito do grupo de trabalho entre o BE e o Governo, visa aprofundar uma lei contra a precariedade aprovada em 2013 (lei 63/2013), explica José Soeiro do BE. Esta lei refere que caso a ACT detete uma situação irregular, o trabalhador tem de “notificar o Ministério Público” para não ter de lidar com a situação individualmente e ir sozinho a tribunal “exigir o reconhecimento do seu contrato de trabalho”. “Assume-se que há um interesse público nessa causa que cabe ao próprio Estado fazer reconhecer”, acrescenta o bloquista.
Com este acordo, em vez de estarem contempladas apenas situações de recibos falsos, ficam abrangidas “todas as formas de trabalho não declarado”, alargando-se a falsas bolsas, falsos estágios e trabalho não declarado. Prevê-se ainda um “mecanismo de proteção do trabalhador precário contra o despedimento”, que impede que este seja despedido entre o momento em que a ACT deteta a situação irregular e o fim do processo de tribunal. “Passa agora a ser proibido o empregador poder dispensar o trabalhador entre o momento em que a ACT vai fazer a fiscalização e o momento em que o tribunal reconhece o contrato de trabalho”.
O Bloco de Esquerda, argumentou José Soeiro, tentou alterar o âmbito de atuação da ACT, propondo que a entidade pudesse “atuar também no setor empresarial do Estado e na Administração Pública”. Proposta essa rejeitada pelo PSD, CDS, PCP e PS.
“O que nós sabemos hoje é que o Estado dá o pior exemplo no que diz respeito ao recurso de modalidades precárias de emprego”, afirmou o bloquista.
Soeiro avançou ainda que o Governo se comprometeu a divulgar “um diagnóstico sobre a precariedade da Administração Pública e no setor empresarial do Estado” até ao final do mês. A partir desta análise, acrescenta, criar-se-á uma “estratégia de regularização dos precários do Estado”.
“O que BE tem proposto é muito simples: por cada função permanente que esteja a ser ocupada por um falso recibo verde, falsa bolsa ou trabalho não declarado seja criado um lugar no quadro e que seja aberto um concurso público para o preenchimento desse lugar com um contrato de trabalho”, reforçou.
Pressões de Bruxelas para não contratar
O Bloco de Esquerda refere também que as instituições europeias têm pressionado o Governo para não fazer mais contratações na Administração Pública. O partido liderado por Catarina Martins argumenta, porém, que não se tratam de novos contratos de trabalho, mas sim formalizar um vínculo já existente.
“Há pessoas que ocupam funções permanentes essenciais ao funcionamento dos serviços, mas que não têm o seu vínculo reconhecido. É importante que a norma do Orçamento do Estado que limita a contratação no setor empresarial do Estado e da Administração Pública seja alterada, de modo a permitir pelo menos a contratação das pessoas que já trabalham nos serviços públicos, mas que não são consideradas trabalhadoras do setor empresarial do Estado”.