Eu participo, você participa, o vizinho propõe e juntos votamos nos projetos que fazem mais sentido, sejam eles novos bancos no jardim ou uma rede ciclável na freguesia. De uma forma muito simplista, este é o princípio do Orçamento Participativo (OP), uma faceta da democracia participativa que põe os cidadãos a votar nos investimentos públicos municipais.
2016 já é o campeão em “ termos de novos Orçamentos Participativos”, sublinha a In Loco, a associação responsável pela coordenação da “Portugal Participa – Rede de Autarquias Participativas”, da qual fazem parte 51 municípios e duas freguesias. No total, há 50 novos OPs “que somados aos 68 que transitam de anos anteriores, totalizam 118 ativos na atualidade”, diz a associação.
Este ano, “os montantes alocados pelas autarquias aos seus processos totalizam aproximadamente 17 milhões de euros, dos quais 304 mil provenientes das iniciativas das freguesias, 1.230.000 destinados às experiências com jovens e o restante aplicado aos Orçamentos Participativos de âmbito municipal”.
Laços de confiança Carlos Carreiras, presidente da Câmara de Cascais e, até ao final do ano, também da rede de autarquias “Portugal Participa”, diz que estes números são “um bom indicador” tanto para regenerar a confiança das pessoas na política como para dar aos cidadãos palco nas decisões coletivas.
“As autarquias têm a noção de que precisam de reforçar laços de confiança com os munícipes, que se têm vindo a degradar na sociedade ocidental. Por outro lado, tem havido esse acréscimo de sugestões por parte dos cidadãos e isso é a prova de que não é verdade quando se diz que os cidadãos estão afastados da política”.
Para Carreiras – que parte domingo para a Nicarágua, onde falará sobre esta temática – usar estas ferramentas é uma forma de “‘redemocratização’ da própria democracia”. “É através da democracia participativa que nós de alguma forma, sem colocar em causa a representativa, a conseguimos rejuvenescer”.
Como exemplo, o autarca dá, obviamente, os números da sua própria ‘casa’. “No caso de Cascais mais uma vez superámos o número de votos, no ano passado tivemos 55 mil e este ano mais de 58 mil”. Cascais tem, efetivamente, um dos OPs mais votados da Europa. “Este ano houve uma participação brutal das pessoas que saíam de casa, iam às assembleias, discutiam os projetos”, resume o presidente da câmara.
A votação dos projetos de Cascais a executar no próximo ano terminou no domingo passado e contou com um total de 58.567. As ideias vencedoras – pelas quais serão distribuídos quatro milhões de euros – são conhecidas hoje à noite no auditório da Casa das Histórias Paula Rego.
OPs desde 2002 Se há poucos anos votar num projeto ou sequer conhecer os OP era para a maioria uma realidade distante, muitos são hoje os que, pelo menos, já ouviram falar deste instrumento que permite aos cidadãos terem uma palavra a dizer. Este ano, pela primeira vez, há um Orçamento Participativo Portugal, um projeto pioneiro a nível mundial e que que vai contar com três milhões de euros do Orçamento de Estado de 2017. Mas por agora ainda são, efetivamente, os OPs locais os que mais peso têm na sociedade.
Há pelo menos 27 anos que o método é usado no Brasil. Por cá, os OPs apareceram em 2002 e, neste momento, Portugal já é um dos países com a maior percentagem de municípios a desenvolver esta estratégia. No total, cerca de metade dos municípios portugueses “já experimentou esta ferramenta de participação cidadã, embora nem todos tenham dado continuidade ao processo”, diz a associação In Loco.
Dois ciclos Cada autarquia decide os calendários, que são separado em dois ciclos. Num primeiro ciclo, os projetos são apresentados e votados e, na segunda fase, executados. E há ideias para todos os gostos (ver ao lado).
“Normalmente, o processo completo dura dois anos”, explicou ao i Vânia Martins, coordenadora da In Loco, e que ajuda a assegurar a continuidade dos trabalhos da “Portugal Participa” entre presidências, já que a renovação da liderança se faz anualmente.
São também os municípios que ditam o orçamento disponível para os projetos. “Há autarquias que investem milhões, como Cascais e Lisboa, outras 300 mil e umas que só conseguem 10 mil euros, varia muito”, diz Vânia Martins.