A distribuição gratuita dos livros veio alterar as regras de mercado e, por isso, os editores querem voltar a sentar-se à mesa com o Governo «num futuro próximo» para negociar os valores dos livros que serão distribuídos gratuitamente aos alunos.
Em entrevista ao SOL, o diretor editorial da Porto Editora, Vasco Teixeira que é também membro da comissão escolar da Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL), avisa que os editores vão defender os «legítimos interesses» e caso não cheguem a acordo com o Governo não excluem a possibilidade de recorrer a «vias judiciais».
O grupo de trabalho foi informado sobre a decisão da distribuição gratuita dos manuais até ao 4.º ano?
Nada. Soubemos pelos media.
Foram apanhados de surpresa?
Apanhados de surpresa não fomos, porque já se percebia o caminho e a forma de lá chegar. Vai correr mal. É mais fácil se o Governo definir o que é reutilizável e o que não é reutilizável. Isso é que é importante para os alunos e para as famílias. Assim, o Governo está a tomar medidas com desconhecimento de causa sem querer ouvir os argumentos de quem tem experiência e de quem sabe. Obviamente depois vai andar a corrigir e a retificar, desnecessariamente.
Qual será o impacto para o setor, com a distribuição gratuita até ao 4.º ano?
As contas que fizemos, aos preços atuais, será de redução do setor a menos de metade. A grande questão é que provavelmente os preços [dos livros] não vão poder ser os atuais. A dimensão do mercado altera completamente e por isso os investimentos não podem ser divididos em seis anos, têm de ser divididos nos anos em que forem as compras e as reposições. O Governo ainda não disse quantos exemplares vai comprar por ano: se 5%, 10%, se 15%, se ao fim de três anos compra novamente todos. Os livros dificilmente aguentarão seis anos. Essas contas estão para ser feitas, num futuro próximo, entre nós e o Governo.
Haverá algum aumento no preço dos livros de fichas para compensar a perda do mercado?
Não. Não é por aí.
Será onde?
Até agora, o Governo discutia com os editores os preços dos manuais numa lógica que eram as famílias que compravam. A discussão dos preços era muito difícil mas, tinha esses pressupostos. E por várias vezes, duas pelo menos, os editores aceitaram congelar os preços sem grande dificuldade. Agora, a partir do momento em que o Estado diz, vou comprar os livros, o mercado já não é o mesmo. Já não estamos a falar das famílias, estamos a falar do Estado, já não estamos a falar da compra anual, estamos a falar de outro nível de compra que ainda não sabemos qual é. Por isso, teremos de fazer contas entre nós e o Estado e ver quais são os preços adequados.
Haverá novas negociações?
Sim, com certeza.
Já falaram sobre isso com o ME? Já há alguma reunião agendada?
Estamos a aguardar. Mas o ME já sabe que vamos ter de conversar sobre os preços. Porque os pressupostos que estão na Convenção foram alterados por opção do Governo.
Ponderam avançar com algum boicote ou protesto para tentar travar este sistema dos empréstimos?
Neste momento, não nos passa pela cabeça qualquer medida a não ser sensibilizar o Governo e defender os nossos legítimos interesses, se necessário nas vias judiciais. O país tem leis que chegue.
Porquê vias judiciais?
Falo em vias judiciais no que toca, por exemplo, aos preços. Caso não haja acordo terá de ser o tribunal a decidir quais serão os preços, ou a Autoridade para a Concorrência ou a Direção Geral Europeia da Concorrência a decidir quais são as regras de concorrência que este mercado terá que ter. Recorreremos às entidades adequadas e necessárias. Mas não nos passa pela cabeça fazer qualquer boicote. Os alunos nem os professores têm culpa de alguma divergência entre os editores e o Governo. Enquanto tivermos dinheiro vamos fazer os livros.
E a revisão dos preços será para entrar em vigor já no próximo ano letivo?
A revisão do preço já deveria ter sido feita este ano para o 1.º ano. O Governo fez um acordo com os editores e quando mudou as regras [distribuiu gratuitamente os livros] os preços deveriam ter sido revistos porque as condições alteraram-se. Devíamo-nos ter sentado de imediato e falar sobre isso. Não há pressa mas obviamente que teremos que encontrar uma solução.
O acordo está em vigor desde março e define o aumento dos manuais. É para manter?
Essa Convenção é por dois anos. Os preços estão congelados este ano e serão atualizados pela taxa de inflação do próximo ano, que será de 0,87% ou seja inferior a 1%. E isso certamente que se vai manter para todos os livros do 5.º ao 12.º ano. Para os do 1.º ciclo que o Governo decidiu alterar as condições de mercado, vamos ter de os rever.
Como foram as negociações da Convenção?
Foram difíceis. Foram muito difíceis. Aliás, essas negociações começaram em maio do ano passado e o anterior Governo não quis fechar a Convenção antes das eleições. Reunimos em janeiro e foram negociações difíceis em quatro, cinco ou seis reuniões. Em março fechámos as negociações com o congelamento e a Convenção é para dois anos.
Qual era a vossa proposta para a revisão dos preços?
(risos) Não vou aqui divulgar as negociações. Não me parece que, nesta fase, seja adequado fazê-lo.
Admitiam reduzir o preço dos manuais?
A proposta que partiu dos editores foi de fazer uma reanálise e um equilíbrio dos preços. O 1.º ciclo teria que subir significativamente e os outros ciclos seriam revistos e algumas disciplinas seriam harmonizadas. Haveria livros a descer e livros a subir. O Governo não quis fazer esse trabalho e o que resultou das negociações foi o congelamento este ano e a atualização com a inflação no próximo ano.