As contas não são animadoras. Nos primeiros nove meses do ano, a Caixa Geral de Depósitos (CGD) apresentou prejuízos 189,3 milhões de euros. Um resultado melhor do que as perdas de 205 milhões dos primeiros seis meses do ano, mas muito piores se comparadas com os lucros de 3,4 milhões de euros registados no mesmo período de 2015. Ainda assim, os resultados passados não deixam esquecer a famosa comparação do anterior presidente da CGD, José de Matos, ao comparar a instituição financeira a um petroleiro.
Mas os desafios do banco do Estado são bem maiores: pôr em marcha o plano de recapitalização da Caixa que fica acima dos cinco mil milhões de euros. Um montante que, ao longos dos últimos meses, causou estranheza e reações políticas fortes, sobretudo do lado da direita. Os antigos responsáveis do governo PSD-CDS, que já conheciam as necessidades de capital da Caixa, denunciaram um «excesso» no valor e avançaram com uma comissão parlamentar de inquérito ao passado, mas com o objetivo assumido de pressionar o presente.
Mas apesar do descontentamento político, a Comissão Europeia acabou por aprovar um plano que muitos julgavam quase impossível, permitindo um elevado reforço de capitais, apesar do Estado colocar apenas 2.700 milhões de euros em «dinheiro fresco». O maior banco do país passa assim ao maior teste: consegue escapar à sentença de ajuda de Estado.
Isto porque, uma operação de recapitalização que fosse considerada ajuda de Estado obrigaria à aplicação das novas regras de resolução e recapitalização, o que levaria a perdas para credores e consequências potencialmente devastadoras para o sistema financeiro português.
Exigências
Mas Bruxelas não passou um cheque em branco ao aceitar o plano de recapitalização da Caixa e impôs condições. As autoridades portuguesas comprometeram-se a executar um plano de reestruturação que levará à saída de até 2.500 trabalhadores – cerca de 28% do total do número de colaboradores – fecho de dezenas de balcões e venda ou encerramento de atividades internacionais.
A fórmula é simples: trata-se de aplicar a mesma receita que foi usada pela maioria dos bancos portugueses, mas como uma diferença, já vem com algum atraso.
António Domingues chegou a desenhar o plano de reestruturação, mas agora a dúvida se este será seguido pelo senhor que se segue: Paulo Macedo. O plano estratégico, aprovado pouco antes da demissão de Domingues (ver caixa ao lado) prevê cortar na remuneração de quem lá tem poupanças, que em termos médios irá passar de 0,6% para 0,2%. Já quem precisar de crédito vai ter de pagar mais. No conjunto, as duas medidas devem render mais de 400 milhões de euros até 2020.
A verdade é que esta estratégia não é nova. Em novembro, a CGD já tinha revisto em baixa os juros oferecidos nas suas aplicações a prazo e cortou para metade quase todas as taxas dos novos depósitos e das renovações das poupanças.
Ao mesmo tempo, o banco vai aumentar as comissões a pagar pela seguradora Fidelidade. Ou seja, quantos mais seguros forem vendidos aos balcões, mais a companhia terá de pagar. A atualização das comissões vai aplicar-se também a alguns serviços prestados aos clientes do banco. Esta medida, segundo as contas do ainda administrador, deverá gerar um ganho na ordem dos 150 milhões de euros.
Encerramentos e saídas
O plano de negócios da instituição prevê ainda o fecho de 180 agências em quatro anos e a saída de cerca de 2200 trabalhadores, sobretudo através de pré-reformas, mas também por rescisões por mútuo acordo. Ainda assim, para já, é um valor que fica abaixa das primeiras estimativas presentes no plano de reestruturação da Caixa e que apontavam para a saída de 2500 colaboradores e o encerramento de 300 balcões. Com esta reestruturação, o banco do Estado prevê reduzir os custos operacionais e diminuir as despesas com pessoal em 75 milhões de euros.
Mas a este número é preciso ainda acrescentar as 460 saídas ocorridas durante este ano. Já em 2015, o banco tinha fechado o ano com menos 448 trabalhadores e o encerramento de 22 balcões. Aliás, os trabalhadores da Caixa continuam a ter acesso ao Plano Horizonte. Já em fevereiro, a CGD disse que, além dos mais de 300 trabalhadores que saíram em 2015 ao abrigo daquele plano, em 2016 poderiam sair ainda mais 700 no mesmo âmbito. Já quando apresentou os resultados do primeiro trimestre, a Caixa revelou que nos primeiros seis meses do ano o banco gastou 20 milhões de euros com este plano.
Em relação ao encerramento dos balcões, esta posição tem vindo a ser defendida por vários elementos do Governo, ao garantirem que nos locais onde irá registar uma diminuição da presença, o banco público vai procurar convénios com outras instituições. Neste cenário, «os interesses da CGD e dos seus clientes passariam a ser assegurados por um outro balcão através de acordo preferencial», tem sido referido.
Uma ideia que agrada pouco ao Sindicato dos Trabalhadores das Empresas do Grupo CGD (STEC), que alerta para «uma brutal redução da atividade da CGD com as óbvias consequências daí resultantes, na sua dimensão e na sua capacidade de intervenção e de resposta, no setor bancário, na economia nacional e no apoio às populações».
Mas os cortes não ficam por aqui. Outro objetivo passa por reduzir a presença da Caixa no exterior. Daí estar prevista a alienação das operações em Espanha, África do Sul e Brasil, bem como o encerramento dos escritórios de Londres e Nova Iorque. Em contrapartida, a instituição financeira deverá manter a sua estrutura nos países africanos de língua portuguesa.
A CGD deverá fechar as contas de 2016 com prejuízos entre dois e três mil milhões de euros e o valor final só fica abaixo dos três mil milhões se se verificarem efeitos fiscais porque a Caixa vai contabilizar imparidades relacionadas com imóveis para ficar limpa para a injeção de capital de até 2,7 mil milhões de euros.