É o título de uma comédia italiana de Ettore Scola, estreada em 1976, com Nino Manfredi no principal papel.
A história passa-se em grande parte no interior de uma barraca miserável na periferia de Roma, onde vive uma família de 20 pessoas entre avós, filhos, netos, genros e noras. Quase todos dormem no chão, que à noite se cobre de corpos. Fazem tudo no mesmo espaço: comem, dormem e praticam sexo. Vivem praticamente como animais.
Feios, Porcos e Maus pertence a um género muito cultivado na época pelo cinema italiano, onde a crítica social se fazia através de comédias onde o sórdido e o burlesco se misturavam – levando o espectador a rir mas transmitindo-lhe ao mesmo tempo um sentimento amargo.
Ora, uma notícia recente lembrou-me estranhamente este filme.
Tiago, de 14 anos, natural de Peniche, fugiu do Lar de Infância e Juventude da Santa Casa da Misericórdia de Chaves para se juntar a um amigo de 19 anos, Miguel, que vivia na garagem de uma moradia nesta cidade.
Na área principal da moradia habitava um casal relativamente jovem, que dera guarida a Miguel por razões desconhecidas. E este tornou-se amante da dona da casa, Sónia, de 31 anos. Não sei se o início da relação se deu depois de Miguel já estar a viver lá – ou se a relação vinha de trás e a mulher lhe abriu as portas da garagem para ter o amante junto de si.
Entretanto, o rapaz mais novo, Tiago, tornou-se namorado da filha do casal, de 13 anos. E, deste modo, mãe e filha ficaram com os seus ‘homens’ a viver na garagem da casa. A mãe tinha lá o amante, a filha tinha o namorado. Enfim, ficava tudo em família.
Além de amantes, Miguel e Sónia dedicavam-se a crimes de furto por esticão, nos quais a miúda de 13 anos também participava. Vivendo em grande promiscuidade, todos sabiam das vidas uns dos outros. O quotidiano naquela garagem deve ter assumido aspetos dantescos, com cenas difíceis de imaginar. Até que…
Até que Tiago, tendo-se desentendido com os outros, fez uma coisa normal num miúdo: ameaçou dar com a língua nos dentes. Ameaçou ir denunciar os roubos à Polícia e ir contar ao marido de Sónia a relação proibida que ela mantinha com Miguel. E aí assinou a sua sentença de morte.
Em toda esta história, quem tinha mais a perder era Sónia. Os rapazes não tinham eira nem beira. Por isso, é natural que tenha começado a insistir com o jovem amante para «fazer desaparecer» Tiago. Este era o miúdo chato, embirrento, que podia estragar-lhes a vida se começasse a falar. E Miguel, para se promover perante a amante 12 anos mais velha, terá querido dar-lhe uma prova da sua força, frieza e masculinidade.
Num belo dia de outubro do ano passado, Miguel esperou por Tiago, atirou-se a ele, espancou-o selvaticamente, bateu-lhe repetidamente com uma frigideira na cabeça e finalmente estrangulou-o com um cinto. E quando acabou o ‘serviço’, enviou uma singela mensagem de telemóvel à amante: «Já está».
Mas ainda faltava muita coisa. Faltava fazer desaparecer o corpo – que é a parte mais delicada e difícil em todos os crimes.
Então, Miguel e Sónia, com a ajuda da filha desta (e namorada do rapaz assassinado), transportaram o cadáver para outra vivenda em Chaves, ocasionalmente desabitada, foram comprar gasolina, queimaram o corpo numa banheira e enterraram-no no quintal dessa casa.
O alerta seria dado à Polícia dias depois, a 4 de novembro, após uma cadela ter desenterrado um pé do cadáver.
Mas Miguel e Sónia só seriam presos no início deste ano, tendo sido condenados há poucas semanas a 20 e 25 anos de prisão, respetivamente.
Esta história é um exemplo de como a promiscuidade pode rebaixar os seres humanos, levando-os a descer cada vez mais, até baterem no fundo.
Aqui tudo é mau. A mulher de 31 anos que atraiçoa o marido com um jovem de 19 que vive na própria garagem da casa em que o casal habita. O jovem que foge de uma instituição para ir viver com gente que não conhece. A mulher que envolve a filha de 13 anos, quase uma criança, em roubos com o amante, e que apadrinha o seu namoro com um rapaz de 14 anos que habita com eles em condições promíscuas. E finalmente o assassínio do rapaz, quando se torna incómodo.
A história de Feios Porcos e Maus passava-se numa barraca de um bairro de lata na periferia de uma capital. Esta passa-se numa vivenda com garagem numa pequena cidade do interior. Enquanto o cinema italiano denunciava situações de miséria económica, as situações mais graves hoje em Portugal são de absoluta miséria moral.
No crime de Chaves, a condição humana bateu no fundo. Mais do que a morte do rapaz de 14 anos, o que aqui mais impressiona é a decadência moral que produziu aquele caldo de cultura fétido onde se consumou o crime.