O nome escolhido para o evento que reuniu ontem representantes de 70 países do globo, em Paris, era pomposo – Conferência para a Paz no Médio Oriente -, mas revelador de uma missão carregada de ambição em excesso – uma realidade que era, aliás, assumida sem rodeios por parte da comissão organizadora (leia-se François Hollande).
À ambição havia que somar ainda o facto de a última ronda de negociações com vista à obtenção da paz entre Israel e a Palestina ter terminado de forma abrupta, em abril de 2014, após nove longos meses de conversas mediadas pelo secretário de Estado norte-americano, John Kerry – que ontem também marcou presença no certame na capital francesa.
Para além disso, a relação entre a comunidade internacional e os israelitas apresenta, nos dias que correm, um dos níveis mais baixos de cooperação e apoio mútuo de sempre, particularmente após a votação favorável de uma resolução inédita no Conselho de Segurança da ONU, no final de dezembro, que condenou o estabelecimento de colonatos judeus em território palestiniano.
O quadro de forças negativas só fica completo, ainda assim, com a ausência da cimeira dos dois grandes envolvidos no conflito. Os franceses revelaram que a presença de Israel e da Palestina não estava equacionada, mas dificilmente Hollande não gostaria de ter recebido representantes das duas partes no Eliseu. Segundo o “El País”, o plano do presidente de França, ao conceber o encontro, foi mesmo o de reunir em Paris Mahmud Abbas, presidente da Autoridade Palestiniana, e Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro israelita.
Os motivos eram, pois, mais do que suficientes para justificar o clima de ceticismo e pessimismo que teimou em pairar à volta da conferência de paz. Os franceses sabiam-no e abordaram o tema sem rodeios. “Estou perfeitamente consciente das reservas em torno desta conferência e das dúvidas acerca da data em que a mesma ocorre”, confessou o ministro dos Negócios Estrangeiros, Jean-Marc Ayrault, aos restantes delegados, citado pela BBC, para depois defender que a França não quer “impor a paz”, mas ajudar os israelitas e os palestinianos a “decidirem juntos o seu destino comum” – um horizonte que, na visão de Ayrault e do presidente Hollande, que também discursou, só pode passar pela “solução de dois Estados”.
A criação de um Estado palestiniano foi mesmo a principal conclusão (esperada, diga-se) do comunicado divulgado no final da cimeira. No mesmo documento foi igualmente pedido às duas partes para evitarem levar para a frente “medidas unilaterais”.
Ausências demasiado notadas
Os organizadores bem podem dizer que nunca quiseram trazer Israel e Palestina ao encontro, mas a sua ausência numa conferência onde se debate o seu futuro retira credibilidade ao próprio encontro. “É como ir a um casamento onde o noivo e a noiva não vão”, descrevia antes da cimeira Tzipi Hotovely, ministra dos Negócios Estrangeiros de Israel, citada pelo “El País”. Na mesma linha, um porta-voz do governo britânico mostrou-se pouco convencido com a realização de um encontro “destinado a obter avanços no processo de paz entre duas partes que não as envolve”.
A presença de Israel foi rejeitada liminarmente por Netanyahu, que descreveu o evento como “uma conferência manipulada pelos palestinianos” cujo objetivo era a “adoção de posições anti-Israel”. Quanto a Abbas, até elogiou a iniciativa, mas recusou a presença da Palestina em Paris, uma vez que “os israelitas não iam”.