À esquerda ficou a sensação de que o Governo pode ter tentado ganhar tempo ao adiar a apresentação do relatório, mas para já tanto o BE como o PCP acreditam que o Executivo vai mesmo cumprir os prazos a que se comprometeu: analisar quais são as necessidades permanentes efetivas em cada serviço e definir o modelo de vinculação até março e abrir os concursos para integrar os precários até outubro.
PCP insiste em outubro e BE faz aviso sobre ‘falha grave’
De resto, bloquistas e comunistas vão fazer pressão para que essas datas sejam cumpridas. A deputada do PCP Rita Rato lembrou, aliás, ontem que a última vez que houve um processo de regularização de vínculos laborais no Estado foi há 20 anos e garantiu que o PCP se vai bater para que o processo permita que «em outubro» os trabalhadores já estejam vinculados nos serviços.
As reuniões já marcadas para a próxima semana entre Governo, BE, PCP e PEV vão ajudar a começar a definir os critérios que vão ser usados para estabelecer se um trabalhador com vínculo precário está ou não a cumprir uma necessidade permanente e deve por isso ser integrado nos quadros do Estado.
Há uma coisa com que António Costa pode contar: o BE não vai deixar cair a reivindicação de ver incluídos nesta análise os trabalhadores que prestam serviços através de empresas de outsorcing ou trabalho temporário, mas que na realidade estão a desempenhar funções permanentes.
«Essa análise tem de incluir esses trabalhadores», assegurou ao SOL o deputado do BE, José Soeiro, que já tinha sinalizado como «uma falha grave» deixar de fora desta integração aqueles que, mesmo sendo pagos através de empresas que prestam serviços, estão numa situação de falsos recibos verdes. «Não seria aceitável que o Estado utilizasse o mesmo método de patrões sem escrúpulos», avisou o deputado do BE na reação à divulgação do documento. Apesar do aviso, José Soeiro valorizou um relatório que é «um primeiro passo para uma regularização que é urgente» e sublinhou que se trata da prova de que «a precariedade se instalou no setor público».
Para Soeiro, é particularmente importante o facto de terem sido incluídos no documento os trabalhadores em contratos de emprego e inserção, que na prática «são remunerados com o seu próprio subsídio de desemprego», e que neste relatório «são finalmente reconhecidos como trabalhadores precários do Estado».
Para chegar aos 116 mil precários, o Ministério das Finanças contabilizou os contratos de trabalho a termo resolutivo, os estágios remunerados, os contratos de emprego e inserção, as bolsas de investigação e os contratos de prestação de serviços.
Mais de metade das situações identificadas correspondem a contratos a prazo, sendo a Educação e a Saúde as áreas que empregam mais trabalhadores com vínculos precários. Mas para entender quantos destes 116 mil poderão vir a entrar para os quadros vai agora ser feita uma análise das funções que cumprem em cada um dos serviços do Estado.
Análise até março
«Até ao final do primeiro trimestre, os serviços com recurso a instrumentos de contratação de natureza temporária deverão fazer uma análise detalhada das necessidades futuras de emprego público», lê-se no relatório das Finanças, que admite que «ainda não é possível identificar em concreto qual a dimensão de precariedade existente na Administração Pública e no Setor Empresarial no Estado, na medida em que a sua identificação estará associada à indevida utilização dos instrumentos contratuais utilizados pela Administração Pública e pelo Setor Empresarial do Estado», sendo que «tal avaliação só poderá ser feita com precisão no contexto de cada serviço».
De resto, o ministro do Trabalho, Vieira da Silva, avisou ontem que é preciso olhar com cuidado para os 116 mil trabalhadores identificados no relatório, lembrando que nem todos correspondem a necessidades permanentes dos serviços.
«O relatório tem de ser lido com muito cuidado. Nem todas essas situações correspondem àquilo a que chamamos trabalho precário», afirmou o ministro, admitindo que não está ainda definido se haverá um tribunal arbitral para definir quem poderá entrar para os quadros ou se serão abertos concursos.
Uma coisa é certa: não estão definidos à partidas números de vagas de quadro no Estado. A integração será feita depois de se perceber quem estará ou não a desempenhar funções permanentes na Administração Pública.
À esquerda, admite-se tanto a hipótese de um tribunal arbitral como a da abertura de concursos, sendo que nesse caso se sublinha a importância de valorizar a experiência dos candidatos para garantir que são os que já estão nos serviços e não outros que acedem às vagas.
Certo é que o BE já tem um histórico com António Costa nesta matéria: na Câmara de Lisboa, os bloquistas assinaram com Costa um acordo que permitiu vincular 800 trabalhadores aos quadros da autarquia, com um tribunal arbrital que analisou individualmente cada caso.