Dívida. Relatório do grupo de trabalho pronto até ao final do mês

Grupo de trabalho sobre a dívida, que junta governo, PS e BE, está a ultimar um documento final com uma análise detalhada à (in)sustentabilidade da dívida e vários cenários de reestruturação. Mas texto poderá não ter a assinatura do secretário de Estado do Orçamento  

Está por dias o relatório final do grupo de trabalho sobre a dívida, que junta governo, PS e BE. O i sabe que a expectativa é a de que as tão aguardadas conclusões sejam aprovadas até ao final de fevereiro. Mas é possível que o texto final não apareça com as assinaturas de qualquer membro do governo.

A ideia é evitar que o documento seja visto como um guião ou um acordo político que o governo de António Costa se compromete a aceitar e cumprir. Daí que, ao que o i apurou, esteja a ser ponderada a possibilidade de o secretário de Estado Orçamento, João Leão – que faz parte do grupo de trabalho -, não assinar o relatório final.

Na semana passada, os vários membros que compõem o grupo de trabalho criado em março de 2016 apresentaram as suas propostas de conclusões. E neste momento está a ser feita uma análise dessas propostas no sentido de encontrar um texto comum que possa ser apresentado como fruto do trabalho dos grupos parlamentares do PS e do BE.

Há uns meses, chegou a ponderar-se a hipótese de não haver um relatório final comum a todos os membros do grupo de trabalho, mas o i sabe que o objetivo é agora chegar a um texto em que todos os participantes se possam rever.

O documento, que espera que seja extenso, deverá incluir uma análise muito detalhada à sustentabilidade da dívida, para concluir que não é sustentável. A partir daí, serão sugeridos vários cenários de reestruturação, num documento que é descrito por fontes conhecedoras do processo como mais técnico do que político.

A tónica no cariz técnico, assim como a possibilidade de a assinatura do governo ficar de fora, não acontece por acaso: António Costa continua a não querer tomar a iniciativa de discutir a reestruturação da dívida na Europa.

“O governo não tomará a iniciativa de iniciar a discussão de forma isolada”, reforça o deputado do PS Eurico Brilhante Dias, explicando que “a questão só será suscitada se e quando for colocada no contexto europeu”. Nessa altura, “Portugal estará disponível para a discutir”, mas não antes.

A pressão de que a Grécia ainda ontem foi alvo no seio do Eurogrupo, a propósito do encerramento do segundo programa de assistência, é visto no PS como um aviso. “Ninguém quer pôr a questão portuguesa ao nível da grega”, nota Brilhante Dias.

A ajuda do 'patrão'

Isto, apesar de as declarações de António Saraiva, da CIP, serem vistas à esquerda como mais uma prova de que a consciência da necessidade de reestruturar a dívida é cada vez mais transversal.

“Esta dívida tem que ser gerível. O problema é que temos uma enorme e pesada mochila às costas, chamada dívida pública, a par de outra, que é a dívida privada”, disse aquele que é conhecido como ‘o patrão dos patrões’, defendendo que a dívida deve ser “reestruturada” e que esse é um problema que deve ser encarado “corajosamente”.

“É necessário encontrar uma solução para o pesado serviço da dívida”, afirmou Saraiva em entrevista à TSF e ao DN, sem explicar que solução podia ser essa, mas insistindo na ideia de que a forma como a dívida está a ser gerida não é suficiente. O líder da CIP admite que a reestruturação “de alguma maneira tem vindo a ser feita, com o alongamento [dos prazos de pagamento] e de outras formas, por isso não se deve ter medo de dizer que esta pesada mochila nos está a arrastar para baixo”.

Ora, neste ponto, Mariana Mortágua não podia estar mais de acordo. A deputada do BE recorda que Portugal está a pagar oito mil milhões de euros por ano só em juros e que “esse é dinheiro que não é investido em Portugal”.

Mortágua acha, por isso, normal que o líder dos patrões entenda a necessidade de reestruturar a dívida. “Até agora, as perdas têm sido imputadas a entidades como o setor empresarial nacional”, nota a bloquista, defendendo que está na altura de imputar perdas aos credores financeiros. ”Os credores financeiros cobraram taxas de juro mais altas, porque havia risco de incumprimento. É justo que agora lhes sejam imputadas perdas”, argumenta a deputada, que considera estar a ficar cada vez mais evidente que apenas “uma razão puramente ideológica” sustenta a tese da austeridade.

“São cada vez mais os economistas que se apercebem da necessidade da reestruturação da dívida”, diz, defendendo que se trata de uma “solução racional”. Mariana Mortágua acredita, de resto, que “é sempre bom” que vozes como a de António Saraiva defendem a reestruturação da dívida. Mas sabe que, para já, o governo vai insistir em esperar por um consenso europeu que o BE teme que tarde demasiado em chegar.