O negócio da venda do Novo Banco ao fundo Lone Star foi apresentado como fechado na sexta-feira, mas o assunto parece longe de encerrado. Ontem, o BE levou o tema para um debate no parlamento, o PCP vai voltar a apresentar uma proposta de nacionalização e o PSD continua a questionar o “mau negócio” e as novas condições do empréstimo do Estado aos bancos através do Fundo de Resolução.
O negócio de venda de 75% do banco não agrada nem à esquerda nem à direita e vai continuar na agenda política. BE e PCP consideram que o acordo faz o Estado perder ainda mais dinheiro num banco onde já estão 3,9 mil milhões de euros, sem que em troca tenha qualquer palavra a dizer na sua gestão. O PSD e o CDS estão contra uma venda parcial, têm dúvidas de que não haja mais dinheiro a ser suportado pelos contribuintes e gostavam de ver esclarecido o motivo que levou António Costa a conceder à banca o que os sociais-democratas dizem ser “um perdão de centenas de milhões de euros”, através da concessão de um prazo mais alargado e de outras condições de pagamento do empréstimo concedido ao Fundo de Resolução.
PSD QUESTIONA EMPRÉSTIMO Ontem, o tema aqueceu a reunião da Comissão de Orçamento e Finanças, onde o PSD levou um requerimento para pedir à Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) da Assembleia da República que analise as consequências deste alargamento de prazo que permite aos bancos só pagarem ao Estado os 3,9 mil milhões de euros em 2046. Os sociais-democratas não gostaram de ver a esquerda unir-se para aprovar esse requerimento e juntar-lhe outro – apresentado pelo PCP – para pedir à UTAO que compare essas condições com a alternativa de ter obrigado os bancos a pagar tudo este ano, como estava previsto.
Indignados, os deputados do PSD saíram da sala, deixando a reunião sem quórum. Mas o assunto deverá ser retomado na próxima reunião, quando o PCP entregar o requerimento – agora por escrito – para que a UTAO faça em simultâneo essas duas análises, e não em dois estudos diferentes, como preferia o PSD.
Esquerda contra PSD
Com a venda do Novo Banco a pôr BE e PCP em oposição ao governo, só o ataque às responsabilidades do governo de Passos e Portas na situação do banco conseguiu unir as esquerdas.
O debate até arrancou com palavras duras de Mariana Mortágua contra um negócio que o BE considera fazer de Portugal “a chacota da Europa”. Mas rapidamente a esquerda se uniu para apontar o dedo às responsabilidades da direita na situação em que está o banco.
“Eu defendo o que defendia há dois anos, que foi a nacionalização do Novo Banco”, atirou a bloquista, com uma provocação lançada à bancada social-democrata. “O PSD defende o quê? Qual é a alternativa?”, questionou.
Antes, já Miguel Tiago tinha apontado baterias à direita. “Foi uma resolução mal feita, porque além de envolta em mentiras não segregou os ativos do banco que deveria”, defendeu o deputado do PCP, recordando que “o anterior governo optou por deixar de fora as propriedades e o ativo do Grupo Espírito Santo que poderiam servir para tapar os buracos que foram criados pelo próprio Grupo Espírito Santo.”
Centeno isolado
BE e PCP não estão convencidos de que, a médio prazo, a nacionalização saia mais cara aos contribuintes. Pelo contrário. “Feitas as contas, no pior dos cenários, o Lone Star gasta mil milhões para ficar com um banco limpo e o Estado paga 7,790 milhões para ficar sem banco nenhum”, resumiu Mariana Mortágua.
Debaixo de críticas cerradas, o ministro das Finanças teve de reconhecer que a venda ao Lone Star não foi a solução perfeita. “Foi, porém, a melhor solução de entre o conjunto de alternativas que se apresentaram”, justificou Mário Centeno.
“A solução apresentada para a alienação do Novo Banco é a menos má a partir de um ponto de partida péssimo”, assumiu o deputado do PS Eurico Brilhante Dias, numa frase que resume a argumentação socialista sobre o tema, segundo a qual não havia alternativa a um negócio que não agrada a ninguém.
Operação em dúvida
Pelo meio desta discussão política há ainda dúvidas sobre a conversão dos títulos dos obrigacionistas em obrigações com uma maior subordinação. Esta operação está a fazer os investidores torcerem o nariz e levou ontem a Moody’s a cortar o rating ao Novo Banco. O problema é que esta emissão de dívida, que tem em vista um encaixe de 500 milhões de euros, é essencial para a conclusão do negócio com o Lone Star. A Moody’s considera a “operação problemática”, apesar de a troca “voluntária” de obrigações por títulos perpétuos ser, na prática, imposta aos obrigacionistas, que têm como alternativa a ameaça da liquidação do banco.
Nos próximos meses, e mesmo que a venda se concretize, apesar da pressão política da esquerda e das dúvidas dos obrigacionistas, o Novo Banco pode continuar a dar dores de cabeça ao governo. É que o Fundo de Resolução deve precisar de novas injeções de capital para capitalizar o banco e, para isso, precisará de novos empréstimos do Estado, que só se farão através de dotações aprovadas no parlamento em Orçamento do Estado. Por outras palavras, é preciso que esse dinheiro seja aprovado pelo BE, PCP e PEV, já que o PSD e o CDS deixaram claro que António Costa terá de ir buscar apoio na maioria que o sustenta no parlamento.
O i sabe que à esquerda há quem veja esta aprovação como uma inevitabilidade, uma vez que o seu chumbo poderia ter como consequência o incumprimento dos rácios de capital do Novo Banco e a sua liquidação, com custos elevados em termos de postos de trabalho, depositantes e estabilidade do sistema. Mas o assunto ainda não foi alvo de nenhuma decisão no BE e no PCP, e nada garante que Costa possa dar como certa a aprovação dessa norma orçamental.