Aqui há anos, numa edição em que o jornal Expresso lançou um ‘desafio’ – Queremos saber como os leitores nos vêem –, o colunista que nesse semanário gozava (e ainda goza) de maior destaque escrevia: «Entre a classe política, se bem que todos apelem a que se diga a verdade toda, não há um só – partido ou candidato presidencial – que se atreva a dizê-la. (…) É que a verdade mata: quem contar aos portugueses a verdade inteira do buraco em que estamos metidos, nem para uma Junta de Freguesia consegue ser eleito. E se a classe política tem medo de dizer a verdade, os cidadãos nem querem ouvir falar disso…» (Miguel Sousa Tavares, 15.1.2011).
Ora, a meu ver, estas mesmíssimas frases poderiam bem ter sido escritas esta semana.
Admitamos que o pequeno trecho transcrito retrata fielmente a realidade. Ou seja, os portugueses temem de tal modo a verdade sobre os males que mais afectam o país, que fogem de a conhecer.
Se isto é assim, então sejamos sérios: não são só os políticos que não se atrevem a dizê-la, com medo de não serem eleitos. Por idêntica razão, os jornalistas e comentadores profissionais, cujas informações e livres opiniões são publicadas, também evitam ao máximo dizer ‘toda a verdade’ sobre o estado real do país e suas causas, já que receiam afugentar os leitores/ouvintes/telespectadores e os anunciantes da empresa que lhes paga.
Daí o clima geral de auto-censura, que é fácil de detectar nos nossos media. É este, de resto, a meu ver, o traço mais comum aos media do nosso país: o horror ao ‘politicamente incorreto’. Ao mesmo tempo, os portugueses consomem cada vez mais entretenimento. Deste modo, graças a um esforço conjunto de políticos e órgãos de comunicação – que tentam apenas não desagradar ao cidadão comum –, o ciclo vicioso está criado… e ninguém, a não ser talvez os abominados ‘velhos do Restelo’ (tipo Medina Carreira), fará seja o que for para o quebrar.
É certo que, raramente, este ou aquele órgão de comunicação aparece com peças que fogem ao tom geral desta nossa morna ‘vida habitual’ democrática, pelo excecional atrevimento ou frescura que revelam. Quando tal acontece, as pessoas recebem a novidade com excitação e aparente satisfação, mas, ao mesmo tempo, com um sentimento de estranheza e desconfiança. Perguntam-se: se o jornal/canal consegue fazer trabalho desta qualidade, por que nos dá normalmente coisa tão diferente e tão pior? Obviamente, não aparece ninguém a esclarecer a dúvida…
Desgraçadamente, nem sequer o próprio colunista citado no início, cuja coragem se tornou ‘lendária’, escapa à influência deletéria do nosso meio. Nem ele, nem qualquer outro dos opinion makers mais reputados e cotados do país, parece estar isento dos seus tabus, medos, telhados de vidro – por pouco que isso se note. Basta constatar que há matérias de enorme interesse público às quais eles, semana após semana, nunca se referem…