«Nos seus contactos com a Comissão, Portugal nunca apresentou planos para nacionalizar o Novo Banco».
Margrethe Vestager
Comissária Europeia da Concorrência
«No nosso país, durante anos, a banca foi considerada uma aliada do desenvolvimento e da felicidade. Representante de uma ‘religião do dinheiro’, surgia como uma parceira indispensável não só para o Estado mas sobretudo para as empresas e para os particulares.
No que diz respeito aos particulares, a banca nacional tornou-se a aliada indispensável de toda a gente, em especial dos que tinham menores rendimentos e até menor literacia bancária e financeira.
Nos estudos sobre os novos (e os velhos) poderes, os representantes dos bancos surgiam à frente dos chefes das polícias, dos dignitários da Igreja Católica e de outros agentes de diversos poderes fácticos.
O endeusamento da banca por pessoas de várias idades e condições sociais marcou durante anos a vida nacional.
E não existem dúvidas de que a banca, sobretudo a privada, foi muito importante para o desenvolvimento económico, social e cultural de Portugal e dos portugueses durante décadas.
Foi crucial, até, para trazer uma nova modernidade e permitir um melhor acesso de milhares de portugueses a determinados bens e serviços. Foi muito importante para aquilo a que poderemos chamar a ‘democratização do acesso a serviços bancários’ decisivos para a melhoria das condições de vida (habitação digna, seguros de vida e de saúde, etc.).
A banca em Portugal viveu durante décadas um período de ouro.
Com boa reputação. Com boa credibilidade. Fazendo coisas necessárias e positivas para o país, praticando a responsabilidade social por via dos seus instrumentos fundamentais de mecenato e fundacionais. Substituindo por vezes – e bem – o Estado na cultura ou na preservação do património.
Mas num ápice, nos últimos anos, essa boa reputação desmoronou-se. E à maneira portuguesa, passou-se do oito para o oitenta. A banca e os banqueiros passaram de bestiais a bestas. De reputados a diabolizados. De aliados a adversários. De indispensáveis a dispensabilíssimos. E se é certo e evidente que se cometeram erros e muitos crimes, dando origem a inúmeros problemas, há que dizer que nem todos são responsáveis por igual, nem todos cometeram crimes e nem tudo foi mal feito.
Só que, nos dias de hoje, defender-se a banca, o seu histórico positivo, o seu contributo para o desenvolvimento económico, social e cultural de Portugal, bem como o seu papel na estabilização democrática do nosso país é quase uma loucura.
A diabolização em curso da banca em Portugal é perigosa e arrepiante. Mas mais arrepiante ainda é o silêncio perante as propostas da sua nacionalização (nuns casos residual e noutros total). É caso para perguntar se já alguém se deu ao trabalho de fazer as contas e apresentar a fatura do que Portugal e os portugueses perderam devido à irresponsabilidade das nacionalizações de bancos e empresas em 1974. Para que se acabe de vez com a hipocrisia. Não precisamos nem de um modelo estatista e de propriedade pública, nem de um modelo à mercê dos mercados e dos investidores e acionistas estrangeiros, com base num capitalismo selvagem – que países como a França, a Alemanha e outros não permitem nos seus territórios.
Hoje existe muito medo de se dizerem umas quantas verdades inconvenientes. A banca portuguesa fez muitas coisas bem feitas e durante muitas décadas. Nem todos os bancos e os seus dirigentes e acionistas cometeram crimes. Antes pelo contrário. A nossa banca pública e privada não pode fechar os olhos à economia real. Das empresas e dos particulares. Tem de apoiar a economia nacional e as nossas empresas.
Eu sei que uma minoria instalada, até na minha área política – que está resignada aos ditames do capital estrangeiro protegido do exterior –, vive bem com essa situação. Felizmente são cada vez mais as vozes que também não aceitam tal dependência do exterior.