A perspetiva ideológica contamina as análises do Conselho de Finanças Públicas? BE e PCP acham que sim. PSD e CDS veem nessa crítica uma forma de pôr em causa a independência do órgão liderado por Teodora Cardoso. A discussão não é nova, mas marcou ontem a audição de Teodora, que foi à Comissão de Orçamento e Finanças apresentar o relatório sobre o cenário macroeconómico do Programa de Estabilidade.
Mariana Mortágua recusou mesmo fazer perguntas por considerar que o que o Conselho de Finanças Públicas (CFP) faz é “avaliar políticas públicas com base numa ideia ideológica” e que este é um órgão que não acrescenta nada ao trabalho desempenhado pela Unidade de Apoio Técnico Orçamental (UTAO), que a deputada do BE elogia.
“Não vejo nenhuma razão para a visão política do CFP ter prioridade sobre a visão de outras instituições”, defendeu Mortágua, que acredita que “explicitar a natureza política do CFP não é atacar a sua independência, é esclarecer a sua natureza”.
A visão é partilhada pelo comunista Paulo Sá, que lembrou que “a criação deste conselho foi uma imposição da troika” e que acha que este órgão “produz orientações que não são ideologicamente neutras”, pelo que não há motivo para serem levadas em conta pelo parlamento.
“Sobre qualificativos, não me vou pronunciar”, limitou-se a reagir Teodora Cardoso, recordando que, em vários países europeus, as unidades técnicas de apoio aos parlamentos coexistem com conselhos de finanças públicas. “Podemos dizer que a legislação europeia não nos interessa, mas a verdade é que a legislação europeia se nos aplica e que as opiniões são opiniões”, retorquiu a economista perante as críticas da esquerda.
“A independência das instituições é fundamental em democracia e quem não sabe viver com elas tem de aprender”, reagiu o social-democrata Duarte Pacheco. “Para o CDS, o CFP é, de facto, um órgão independente”, reforçou a centrista Cecília Meireles.
No PS optou-se por não questionar diretamente a validade das análises do Conselho, mas por pôr em causa o facto de Teodora Cardoso preferir citar projeções de instituições internacionais como o FMI em detrimento das previsões de entidades como o ISEG e a Católica, que dispõem de dados mais recentes para os seus estudos.
De resto, os socialistas preferiram destacar o facto de Teodora Cardoso ter considerado “plausíveis e prudentes” as projeções do governo.
CFP vê riscos em 2018
“Quando nós referimos que as previsões são plausíveis e, até certo ponto, prudentes, referimo-nos a 2017”, corrigiu rapidamente Teodora Cardoso, que elogia os objetivos de défice e dívida desenhados por Mário Centeno no Programa de Estabilidade (PE), mas considera o documento demasiado vago em relação às políticas que o governo pretende seguir para os atingir.
“Relativamente a políticas, o PE tem alguns aspetos que precisam de ser claramente desenvolvidos”, vincou Teodora Cardoso, que destaca a falta de uma política fiscal que sirva para apoiar a economia, e não simplesmente para gerar receitas a fim de fazer face às despesas do Estado.
“Portugal não tem dado um bom exemplo em matéria de política fiscal em relação ao crescimento”, sublinha a economista, que gostava de ter no Programa de Estabilidade ideias mais claras sobre o alívio da carga fiscal, sobre a forma como o governo pretende reduzir o número de funcionários públicos ou sobre os instrumentos de gestão que permitirão à administração pública associar ao descongelamento de carreiras – que considerou fundamental – uma forma de conseguir que os trabalhadores do Estado sejam mais “gestores e menos burocratas”.
É com base naquilo que o programa não diz no que toca à definição de políticas concretas que Teodora Cardoso aponta para “riscos a partir de 2018”, mesmo que as previsões para 2017 sejam “plausíveis”.