Maduro tenta uma via radical para escapar aos protestos quase diários contra a severa crise económica e a sua ultra-impopular presidência.
O líder venezuelano anunciou de surpresa na segunda-feira que vai alterar a Constituição que o próprio Hugo Chávez elaborou em 1999 para fazer a transição para o modelo bolivariano, estabelecendo, por exemplo, o acesso universal à educação e serviços de saúde, ou criando direitos para as populações indígenas.
Maduro nunca se mostrara crítico da Constituição, não explica o que nela está errado e diz que só metade da assembleia constituinte será eleita nos municípios. A restante será nomeada pelo oficialismo.
Para a oposição não há duvidas. Diz tratar-se de mais uma tentativa de a apagar da paisagem política, adiar as eleições regionais deste ano e as presidenciais do ano seguinte.
Ninguém espera que seja Maduro a vencê-las. O oficliasmo já perdeu em quase toda a linha nas legislativas de há dois anos, quando a oposição venceu uma maioria absoluta na Assembleia Nacional e viu serem impugnadas as eleições dos três deputados indígenas que lhe dariam uma super-maioria.
Desde então, a crise económica e a contestação só se agravaram. Maduro e o Partido Socialista Unido da Venezuela parecem por estes dias tentar todas as estratégias para invalidar a oposição. Há semanas, tiveram de recuar com a decisão do Supremo que praticamente apagava o legislativo.
"Golpe fascista"
“Convoco o poder constituinte original para alcançar a paz de que a república precisa para derrotar este golpe fascista”, disse Maduro na segunda, anunciando uma subida no salário mínimo pela 15ª vez desde que é presidente, agora na ordem dos 60%, necessária para responder à alucinante inflação, que só este ano ascenderá aos 720%, de acordo com cálculos do Fundo Monetário Internacional – o governo considera o valor um segredo de Estado.
O presidente ainda não anunciara os moldes da constintuinte e o líder da aliança de partidos de oposição já mobilizava as ruas.
“Perante a fraude constitucional da assembleia constituinte, anunciada pelo ditador, as pessoas devem ir para a rua e desobedecer a tal loucura”, escreveu Henrique Capriles, que os tribunais querem proibir de ocupar cargos públicos por entenderem que está por detrás dos protestos violentos, repetindo a estratégia utilizada para prender Leopoldo López, 2014 – só em abril morreram 29 pessoas em protestos, para os quais o presidente convocou paramilitares próximos do oficialismo.
Estradas fechadas
Se Maduro procura alcançar a paz nas ruas anulando a oposição, ela, para já, responde com renovados protestos. Esta terça-feira, ao começo do dia na Venezuela, centenas de pessoas manifestavam-se contra a proposta de alteração constitucional bloqueando os acessos a várias ruas e avenidas em Caracas e outras cidades do interior do país, segundo noticiava a agência Efe.
Os protestos respondem aos apelos de “trancazo” lançados na segunda-feira pela Mesa da Unidade Democrática (MUD) em que se reúnem os diferentes partidos da oposição. Freddy Guevara, vice-presidente da Assembleia Nacional, dizia esta terça à agência espanhola que as ações de protesto “superavam” as suas expectativas nas primeiras 24 horas.
O rumo para além do protesto não é evidente. Governo e oposição deixaram de dialogar e os partidos do MUD responderam com desagrado ao apelo de Francisco, este fim de semana, para se retomarem as negociações que ocorriam com ex-líderes sul-americanos e espanhóis até que as forças paramilitares convocadas por Maduro saiam das ruas e sejam libertados políticos opositores.