PWC à beira de ter o monopólio da banca

Se a auditora ganhar o concurso para a Caixa passa a deter grande parte do setor financeiro, sendo responsável ainda pelas contas do próprio regulador. EY e KPMG estão na corrida.

A PwC está prestes a dominar o setor financeiro na área da auditoria. Juntamente com a Ernst & Young (EY) e a KPMG entregou uma proposta para suceder à Deloitte como auditoras da Caixa Geral de Depósitos (CGD). Em cima da mesa está um contrato no valor de 5,5 milhões de euros anuais e o vencedor será conhecido na próxima assembleia-geral do banco público que continua sem data marcada, apurou o SOL. A recomendação é feita pelo comité de auditoria da Caixa que avalia as propostas e recomenda um auditor, cabendo depois ao acionista Estado a decisão final. Ou seja, o Ministério das Finanças.

A Deloitte ficou impedida de entrar no concurso devido à regra da rotatividade que prevê um máximo de oito ou nove anos  – os mandatos com duração par terão como limite máximo oito anos e os mandatos com duração ímpar terão como limite máximo nove anos – de ligação contratual com um auditado, prazo esse que já foi atingido (ver coluna ao lado).

A Caixa ainda pediu uma autorização especial à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) para poder manter a Deloitte até ao final do exercício de 2016 como uma forma de facilitar o processo de escolha da nova administração da Caixa, permitindo que a escolha do novo auditor tivesse já lugar com uma nova administração em funções.

Com a Deloitte fora da corrida sobraram apenas três auditores. No entanto, tudo indica que a EY será afastada do concurso porque está atualmente responsável por fazer uma auditoria forense ao banco público entre 2000-2015 e que irá durar 15 semanas. Essa informação foi revelada pelo próprio ministro das Finanças na comissão de Orçamento e Finanças, na Assembleia da República, no passado mês de abril.

Mário Centeno chegou a afirmar que esta  foi escolhida por não ter estado associada à CGD no período em que a auditoria vai incidir. A análise irá ter três áreas fundamentais: a concessão de créditos, a aquisição e alienação de ativos e as decisões estratégicas de negócios.

 

Dona Disto Tudo

É aqui que começam a surgir os «problemas». Com a Deloitte afastada e provavelmente a EY também, resta a KPMG e a PwC. Esta última praticamente domina o mercado financeiro com a responsabilidade de auditar as contas dos maiores bancos que atuam no mercado nacional, assim como do próprio supervisor. É responsável pelas contas do Banco de Portugal, Santander, Novo Banco, BPI e Bankinter. A este leque pode então juntar-se a Caixa Geral de Depósitos caso seja vencedora do concurso.

Feitas as contas, estamos a falar de um auditor com acesso a informação privilegiada de uma quota de mercado acima de 70% da banca e responsável pelas contas do regulador, ficando apenas de fora o BCP e o Montepio. A isto há que somar ainda possível conflitos de interesses e as recentes danças de cadeiras que o auditor tem sido alvo.

Em causa está a recente nomeação de Luís Costa Ferreira, ex-consultor da PwC, para chefiar a Direção de Supervisão Prudencial do Banco de Portugal e que levou o Bloco de Esquerda a pedir esclarecimento urgente ao órgão liderado por Carlos Costa.

Entre julho de 2013 e outubro de 2014, Costa Ferreira foi diretor do Departamento de Supervisão Prudencial do Banco de Portugal. Em janeiro de 2015 abandona o órgão regulador para assumir as funções de liderança na área de Serviços Financeiros na PwC, regressando agora novamente ao BdP. Por coincidência ou não a PwC audita atualmente o próprio Banco de Portugal, ocupando o lugar deixado vago por Carlos Albuquerque, que seguiu para a administração da Caixa.

«A existência de conflitos de interesse é óbvia e inaceitável. Luís Costa Ferreira passa de regulador a partner de uma empresa que presta consultoria a regulados, voltando depois a ser regulador», alertaram os bloquistas.

Também esta questão levou o CDS a sugerir que o recrutamento de diretores para o Banco de Portugal fosse feito através de concurso público e que fosse a CMVM a entidade responsável por verificar eventuais conflitos de interesses entre o exercício de auditoria a entidades de interesse público e a prestação de serviços de consultadoria. «Não nos parece que faça sentido que alguém possa ser auditor de uma entidade e avalie o crédito mal parado e depois seja consultor de quem quer comprar esse crédito», explicou entretanto o partido.

 

Dúvidas e suspeitas

A alternativa que resta é a KMPG, mas nem assim a solução é pacífica. A explicação é simples: estão abertos processos de averiguação contraordenacional à auditora pelo Banco de Portugal e CMVM devido à supervisão no BES Angola que esteve a seu cargo durante 10 anos. No relatório enviado pelo BdP ao Conselho Nacional de Supervisão de Auditoria (CNSA), são mesmo apontadas indícios de violação das normas de auditoria e ocultação de informação da KPMG Portugal e da KPMG Angola relativamente ao BESA. «Nunca foram transmitidas pela KPMG quaisquer indícios sobre potenciais perdas associadas às irregularidades identificadas na carteira de crédito do BESA», revela o relatório da participação à CNSA. Só no primeiro trimestre de 2014 é que a KPMG reconhece um valor significativo de imparidades.

A KPMG foi também supervisora das contas do Banco Espírito Santo (BES) desde 2002, assim como todo o universo do grupo: a Espírito Santo Financial Group, a Espírito Santo Irmãos, a Espírito Santo Financial.

Já em 2015 foi condenada pela CMVM por violação das normas de auditoria no caso BCP, seis anos após o início do processo. Em causa estava a utilização de veículos offshore para investir em ações do próprio banco. Jorge Jardim Gonçalves e Filipe Pinhal estiveram entre os condenados nesta operação. A auditora foi condenada por uma infração muito grave, mais ainda assim com pena suspensa. A verdade é que só no ano passado é que o BCP mudou de auditor 30 anos depois, trocando a KPMG pela Deloitte.