Era uma daquelas tardes de calor insuportável que roubam as forças a qualquer um. Mas faltava-me ainda arranjar mais um viajante com histórias para contar e à porta de Santa Apolónia não se via ninguém com ar de turista.
De repente vi uma família, um casal e dois filhos que estavam corados demais – não era bem cor de lagosta, mas quase – para quem está habituado ao sol português. Dirijo-me até eles e pergunto se têm alguns minutos para falar comigo. A mulher, de ar mais antipático, disse- -me logo que não dava porque estavam à espera do transfer para o hotel; o marido, mais simpático, disse-me que eram dos Países Baixos, que podíamos conversar um bocadinho, na condição de que quando chegasse o carro que os viria buscar nos despedíssemos logo. Aceitei. Parecia mal voltar atrás.
Vinham do Porto e, depois de uns dias em Lisboa, seguiam para o Algarve. E eu ia continuar com as questões quando a mulher disse: “O nosso carro chegou.” Não tive tempo para tirar a fotografia da praxe, para dizer a verdade não tive tempo sequer para dizer adeus, dirigiram- -se para o sítio onde estava o motorista. Atirei um “thank you”, mas já nem devem ter ouvido, porque não se viraram.
O calor continuava a apertar e a minha confiança para abordar estranhos ficou um pouco abalada depois do episódio com os holandeses. Estava pronta para desistir quando avistei o Conor.
Tinha aspeto de ser simpático mas de quem não está habituado a estas temperaturas. Viam-se algumas gotas de suor a escorrer pela cara e, quando levou as costas da mão à testa para a limpar, reparei que tinha um mapa. Boa! Afinal, faço mais uma tentativa, pensei.
Nem lhe perguntei se falava inglês, apresentei-me logo e expliquei-lhe o que estava ali a fazer. Sorriu, mostrando o aparelho nos dentes, e disse que se chamava Conor e que tinha 23 anos. Vinha do Canadá, onde trabalha numa grande empresa de construção. Estava cá sozinho de férias e tinha acabado de vir de Ibiza, onde tinha passado três dias “de festa constante”. Agora ia passar uns dias na capital antes de seguir para o Algarve e depois para Marrocos. No quarto de hora que estivemos à conversa não poupou elogios aos portugueses. “Vocês são espetaculares”, disse-me vezes sem conta. E eu não pude deixar de me sentir orgulhosa.
Perguntei-lhe o que ia fazer e explicou–me que ia visitar o Castelo de São Jorge e que depois ia ter com umas pessoas que tinha conhecido no hostel para beber umas super bocks – poucas, porque Ibiza foi “intenso” –, para festejar o seu aniversário. Fazia anos naquele dia. Dei-lhe os parabéns e disse-lhe que, se gostava de cerveja, devia provar as nossas artesanais, e o Beato, ali tão perto de Santa Apolónia, era o sítio ideal, com a Dois Corvos e a recém-inaugurada Musa. Agradeceu a sugestão e disse que ia tentar passar por lá. Despedimo-nos e ele seguiu caminho para o castelo. Happy birthday, Conor. Cheers!