Há três semanas, em entrevista ao SOL, Daniel Oliveira, homem de esquerda, comentador da SIC, Expresso e Canal Q, afirmou com conhecimento de causas que a «a esquerda passou a considerar-se uma mera aliança de minorias».
Nessa altura, a secretária de Estado da Modernização Administrativa, Graça Fonseca, ainda não tinha tido autorização de António Costa para sair do armário publicamente.
Saiu esta semana, em entrevista ao DN, na qual, obviamente com assentimento prévio do primeiro-ministro, a secretária de Estado assume a sua homossexualidade.
Tal declaração foi, aliás, o único propósito da dita entrevista – da qual nada mais resultou nem relevou.
Confesso que não me interessa rigorosamente nada se o ministro dos Negócios Estrangeiros é heterossexual, bissexual ou homossexual. Ou o ministro das Finanças, o da Educação, o da Saúde, o da Defesa, a da Presidência, por aí fora.
Tão pouco me importa saber qual a orientação sexual dos seus ajudantes – sejam secretários de Estado, assessores, adjuntos ou demais funcionários dos ministérios ou direções gerais.
Não me interessa, ponto.
Mas Graça Fonseca não partilha da minha opinião. E acha que é relevante afirmar publicamente a sua homossexualidade.
Porquê? Porque é preciso mudar as mentalidades e para isso não chega mudar a lei, legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo ou a adoção por casais de homossexuais.
Respeito a sua opinião, mas discordo.
Quais mentalidades?
O que quer afinal mudar a senhora secretária de Estado da Modernização Administrativa?
Acaso a Administração Pública, cuja modernização tutela, descrimina os homossexuais? Ou a Administração Local, de onde provem?
Se sim, enquanto responsável pela tutela, cabe-lhe denunciar e agir por forma a que tais descriminações, abusos ou até eventualmente crimes não ocorram.
Se não, o que pretende Graça Fonseca?
Curiosamente, a entrevista saiu quando estalou a polémica nas redes sociais sobre os livros da Porto Editora cor de rosa para ‘meninas’ e azuis para ‘rapazes’.
Discriminação de género dizem. E o Governo, pela voz do ministro Adjunto, Eduardo Cabrita, veio a público aconselhar à retirada de mercado dos ditos.
A Porto Editora assim fez. Sendo que, curiosamente, a editora tem como Presidente do Conselho de Administração… uma senhora.
Já agora, se tantos se importam com os livros discriminatórios pela cor e pelos exercícios, ninguém se importa que o jornal mais lido e mais comprado em Portugal tenha na capa todos os dias e sem falhas um crime, uma notícia de futebol e uma… rapariga seminua ou nua?
Essa é a receita do Correio da Manhã e teria graça se algum governante, como Fonseca ou Cabrita, ousasse recomendar a Paulo Fernandes e seu grupo que deixassem de publicar as capas e artigos sexistas.
Ou que ousassem aconselhar a retirada do mercado de todas as revistas sexistas, que as há aos montes e não são essas, que se saiba, que estão para fechar.
Na verdade, faria tanto sentido como o ministro dar conferência de imprensa para falar nos livros azuis para rapazes e rosa para meninas. Sobretudo numa altura em que o país continua assolado por incêndios, com os números de vítimas mortais, de feridos e de casas destruídas sempre a aumentar.
Não, não somos todos iguais. Não somos iguais no género, na orientação sexual, na raça, na altura, na magreza ou na gordura, na destreza, na visão.
O ‘gordo’, o ‘trinca-espinhas’, o ‘quatr’ olhos’, o coxo, o surdo, o corcunda, o anão, o medricas… sempre foram vítimas.
No século XXI não faz sentido que a educação, a informação, a cultura, a sociedade cultivem a discriminação.
Seja ela qual for, se bem que o gordo ainda continua a ser o mais massacrado apesar de a maioria das vezes não ter culpa nenhuma da sua condição (e vá lá perceber-se porquê, tal a taxa de obesidade registada em Portugal).
No mais, e na verdade, a sociedade convive bem com as suas minorias.
Respeita-as na sua diferença.
O que não vale, e é errado, é pretender que a minoria dite a norma e a maioria tenha de converter-se ou sujeitar-se aos ditames de uma minoria, seja ela qual for. E por mais forte que seja o lóbi da dita.
Sobretudo quando, como diz Daniel Oliveira, a esquerda passou a ser «uma mera aliança de minorias»… que lá vai conseguindo impor-se à maioria.
O direito à diferença tem de valer para todos, incluindo para a maioria.