Balsemão é o único publisher português resistente do século XX – com o devido respeito por Belmiro de Azevedo, mecenas do Público, e por Paulo Fernandes (Cofina), Joaquim Oliveira (Controlinveste/Global Media), Mário Arga e Lima (Virca, d’A Bola) e Jacques Rodrigues (Impala), empresários de Comunicação Social que nunca foram jornalistas.
Numa dura mas muito interessante entrevista ao SOL da semana passada, brilhantemente conduzida por Vítor Rainho, Joaquim Vieira – autor de biografia não autorizada, ou não oficial, de Francisco Pinto Balsemão, agora editada pela Planeta – passa em revista os 80 anos de quem ele próprio diz ser «mais jornalista do que político». É verdade!
Fundador do Expresso na reta final do Estado Novo, Balsemão foi dos maiores contribuintes para a liberdade de imprensa, para a liberdade de expressão (e de opinião) e, logo, para o jornalismo em Portugal.
É, nesse capítulo, figura ímpar na Comunicação Social portuguesa.
Estou particularmente à vontade para o afirmar, porque trabalhei no Expresso ainda no tempo em que o ‘Patrão’ reunia no seu escritório e falava pessoal e individualmente com cada jornalista que entrava para os quadros da empresa.
Na altura, meados dos anos 90, o Expresso estava no edifício onde residira no princípio desse século o republicano e maçon Afonso Costa, na esquina da Duque de Palmela com a Braancamp.
O quadro de jornalistas engrossara e os colaboradores eram às dúzias. Mas o jornal em si era feito por uma dedicada e profissional minoria, com gosto pela arte de informar, pelo jornalismo de autor, que ditava a agenda mediática, política, económica e cultural, pela escrita cuidada e sintética (o formato broadsheet não permitia um caderno principal com mais de 32 páginas e a publicidade, à época, ocupava mais de 40% do espaço – quase página sim página não, com as ímpares preferencialmente tomadas pelos anunciantes bons pagantes).
Saí quando o Expresso já estava em Laveiras, Paço de Arcos, no edifício São Francisco de Sales, onde a Impresa juntou a Sojornal (do Expresso) com a Edimpresa (das revistas) e para onde agora irá também a SIC (pelos vistos já sem as revistas – que o anúncio da respetiva alienação, ou encerramento, foi entretanto feito internamente).
Para fundar o SOL – com José António Saraiva, José António Lima, Vítor Rainho, Ana Paula Azevedo e uma vasta equipa, que ocupou os cinco andares do prédio que faz esquina entre a Rua de São Nicolau e a do Crucifixo, à Boa hora, no Chiado.
Nessa altura, Balsemão reagiu como leão. Fez o que podia, e o que não devia, para matar o projeto concorrente do seu Expresso. Pressionou fornecedores essenciais (do papel aos sistemas informáticos, passando pelas agências e centrais de publicidade) e os grandes anunciantes e decisores.
O Expresso passou a oferecer dvd’s e livros e sacos de praia e o que mais pudesse… valeu tudo para marginalizar o concorrente, colando-lhe rótulo de tabloide e sensacionalista, que o SOL nunca foi.
Balsemão conseguiu triunfar, mas não aniquilar. Mesmo quando logrou fechar as portas, e as janelas, de possíveis investidores no SOL. Porque Balsemão era, e é, respeitado pelos decisores, pelos políticos, pelos gestores… pelos jornalistas.
Por isso, considero-me insuspeito para afirmar que Balsemão é um Homem grande, apesar dos seus muitos defeitos.
A crise da Comunicação Social num mercado demasiado pequeno para permitir sustentabilidade aos grandes e engordados grupos de media, com megaestruturas invariavelmente mais onerosas do que capazes de gerar receitas suficientes para se autofinanciarem, coloca numa situação particularmente difícil quem nunca quis abrir mão do controlo dos seus meios.
Como Francisco Pinto Balsemão.
Porém, a Impresa não sobreviverá se Balsemão teimar em manter o controlo.
E veremos como e se sobreviverá quando ele o perder. Porque Balsemão é o único publisher português que resistiu à passagem do século e do milénio.
E, apesar de todos os seus defeitos, tem enormes virtudes.