“Nunca pensei que fosse imaginável qualquer associação deste ato de compra de casa às minhas funções na Câmara Municipal de Lisboa ou a decisões aí tomadas”. Fernando Medina responde assim ao facto de ter adquirido uma casa que pertencia a uma antiga acionista da Teixeira Duarte e herdeira da família e meses depois a câmara ter feito dois ajustes diretos à construtora no valor de 5,5 milhões de euros. Ontem o i tinha questionado o autarca sobre se via conflito de interesse no facto de ter comprado uma casa a uma pessoa ligada à construtora, tendo a câmara municipal uma relação comercial com a empresa. Medina não respondeu às questões colocadas. Viria a publicar já durante a noite um esclarecimento detalhado na sua página de campanha. Hoje, reforçadas as questões, Medina remeteu para o último ponto desse esclarecimento, onde diz que, até ser contactado pelos jornalistas, não tinha associado as duas questões. “Por ser impróprio, irreal e absurdo”, remata.
No esclarecimento, Medina considera ainda que adquiriu uma casa “como qualquer cidadão” e diz que teve conhecimento por anúncio e negociou exclusivamente através da agencia, tendo pago um valor totalmente em linha com o mercado e os praticados neste imóvel.
O autarca divulga o registo predial e a escritura do duplex na Av. Luís Bívar, aquisição que como o i avançou na edição de hoje está a ser investigada pelo DIAP de Lisboa. Na escritura surgem, como foi avançado nos últimos dias, as assinaturas de Isabel Maria Calainho de Azevedo Teixeira Duarte, de Medina e da mulher. No esclarecimento, embora o autarca ressalve que a compra foi feita através da imobiliária, não nega que tinha conhecimento de que a casa pertencia a uma pessoa da família Teixeira Duarte.
Dois “bons negócios"
Hoje vieram a público novos detalhes sobre a aquisição e sobre as investigações na justiça.
Segundo a “Visão”, antes da queixa anónima sobre a compra do duplex ter motivado um inquérito no DIAP, já havia um inquérito em curso no DIAP de Lisboa relativamente à adjudicação de obras de milhões à Teixeira Duarte. Ao todo, refere a revista, há cinco investigações em curso visando a autarquia.
Já o “Público” publicou hoje uma investigação sobre os “bons negócios” imobiliários de Fernando Medina nos último ano. Segundo o diário, o duplex que Medina comprou por 645 mil euros tinha sido adquirido pela antiga proprietária Isabel Maria Calainho de Azevedo Teixeira Duarte, neta do fundador da construtora, por 843 mil euros. Já a casa onde Medina e a família viviam na Rua do Viriato foi vendida por 490 mil euros, quando o casal o tinha adquirido por 360 mil euros. Portanto, o apartamento de Medina valorizou 36% e a casa que comprou desvalorizou 23%, isto mesmo período, entre 2006 e 2016.
Já o “Observador” revela que há seis anos, os sogros de Medina compraram a casa ao lado do duplex do autarca por 650 mil euros, mais cinco mil euros do que o valor pago Medina e a mulher. Fernando Medina, no seu esclarecimento, adiantou que o facto de os sogros viverem no prédio foi uma das decisões para quererem comprar a casa, tendo sido alertado para a venda por amigos que viram o anúncio numa imobiliária.
Os valores
No esclarecimento publicado ontem à noite online, Fernando Medina considera que a compra foi feita por valores dentro do mercado. O i contactou várias imobiliárias, que recusaram fazer qualquer simulação. Já Sábado e Observador avançaram com algumas avaliações, sob anonimato. Tanto o valor é considerado justo como há quem entenda que a casa poderia ultrapassar um milhão de euros na data em que foi comprada.
Medina diz que o duplex, com 12 anos e uma área bruta privativa de 182 m2, foi adquirido pelo valor de 645 mil euros, a que corresponde um preço por metro quadrado de 3544 euros. Informa mesmo que fez uma proposta 10 mil euros acima do que estava a ser solicitado pela imobiliária que intermediou a venda, uma vez que havia outros interessados no imóvel.
O autarca apresenta um anexo com informação sobre outros imóveis comprados à Teixeira Duarte no mesmo prédio, para referir que o valor se enquadra nos valores por metro quadrados praticados no edifício.
Refere ainda que o valor m2 da aquisição foi 7,5% superior às ofertas de venda e 47,8% superior às escrituras efetuadas na zona das Avenidas Novas e no 2º trimestre de 2016, isto de acordo com os valores publicitados pela Confidencial Imobiliária. De acordo com o documento, no 2º trimestre de 2016, o preço pedido por m2 de um apartamento novo foi em média 4.982 € e de um usado 3.269 €, isto na freguesia das Avenidas Novas. Já o valor escriturado era, no mesmo período, de 3.925/m2 nas frações novas e 2.397/m2 nas usadas.
Tribunal Constitucional
Quando a ter havido uma falha no reporte da compra ao Tribunal Constitucional, o autarca garante estar a cumprir a lei: em agosto de 2016 atualizou a declaração no TC com o contrato promessa celebrado – o sinal de 220 mil euros. “Como a Lei determina, no fim do mandato que exerço, irei apresentar dentro de dias nova atualização da declaração de rendimentos e património ao Tribunal Constitucional”.
O TC ainda não se pronunciou.
Já o Ministério Público, que ontem tinha avançado ao i que o DIAP de Lisboa está a investigar a aquisição do imóvel, havendo relação comercial entre a autarquia e a construtora, deixou hoje claro que não se está a debruçar sobre a declaração ao Tribunal Constitucional, sendo esta da competência do TC, informou fonte oficial.